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Gatilhos do Tempo: a história dos Chrono Triggers


Iluuga

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Capítulo 11

 

- Papai, ele está acordando.

 

- Finalmente – disse um senhor com roupas de sábio e longas barbas brancas.

 

Glenn reconheceu o lugar onde estava. Era a enfermaria da Torre de Al De Baran. Reconheceu também Baltasar e a moça loira que o havia ajudado. Foi-se embora a pequena ilusão de que estava sonhando. Estava mesmo no passado. Que loucura tudo aquilo! Lembrando-se aos poucos de tudo o que havia acontecido, fez menção de levantar-se da cama.

 

- Acalme-se, rapaz. Não adianta desesperar-se agora.

 

O paciente passou a mão na cabeça e percebeu um curativo.

 

- Já deve estar quase bom. Não havia sacerdotes ou noviços de serviço por aqui hoje. Agradeça minha filha, que preparou uma poção salvadora.

 

- Vai ficar uma cicatriz – disse a moça, uma adolescente que aparentava ter a mesma idade do espadachim.

 

Glenn enfim se tocou que ambos haviam cuidado dele.

 

- Obrigado por terem me ajudado. Mas agora preciso ir. Preciso...

 

Baltasar não deixou ele completar a frase.

 

- ...salvar Cyrus e o seu amigo bruxo?

 

- Er... Sim! Como sabe?

 

- Há três dias, minha filha Linda encontrou você semi-morto, caído próximo à kafra de Al De Baran. Antes de desmaiar, ela ouviu você mencionar o nome de Cyrus e de Tenerife.

 

- Entendi que estavam em perigo – completou ela.

 

- Você também disse – continuou o sábio – algo sobre a mina de carvão. Ela trouxe você para cá e contou-me tudo. Imediatamente enviei uma equipe de busca para lá.

 

- Fiquei desacordado por três dias?

 

- Exatamente. Chegando lá, a equipe encontrou moradores da cidade retirando, dos escombros de uma casa que havia desabado nas imediações, o próprio Cyrus.

 

Glenn baixou a cabeça. A menina logo percebeu seu desalento.

 

- Não, Glenn, encontraram-no vivo! – exclamou ela.

 

- Mas, como?

 

- É claro que o estado de saúde dele não era dos melhores... – Baltasar coçou a barba – Na verdade, ele foi salvo pelo escudo. Provavelmente, no instante em que o teto desabou, cobriu-se com ele, que protegeu-o.

 

- Ele vai ficar bem? Onde ele está agora?

 

- Está sob observação. Como disse, o estado de saúde dele requer alguns cuidados. Está descansando, noutra enfermaria.

 

- E Tenerife? O encontraram?

 

Linda deu a notícia.

 

- Não encontramos mais ninguém, Glenn. Sentimos muito.

 

- Como não? Nada? Nada...mesmo?

 

- Nada, Glenn – interveio Baltasar – Nem ao menos um corpo.

 

O espadachim teve receio em falar algo sobre Lagus. Como disse Cyrus, não poderia envolver as pessoas do passado nessa história toda. Alterações indesejadas e sem controle no tempo poderiam ocorrer.

 

O sábio pareceu advinhar o que se passava na mente do garoto.

 

- Não sei o que faziam lá, nem quero saber. Conheço Cyrus há muito tempo para saber que era algo muito importante e que exigia discrição, já que ele não comentou nada comigo e nem me disse quem eram vocês quando estiveram no meu laboratório.

 

Olhando nos olhos do espadachim, disse:

 

- Em nome da amizade que tenho com Cyrus, ofereço-lhe o apoio que precisar, qualquer que seja a sua decisão.

 

Glenn não sabia o que fazer. Pensou em sair para procurar o Lagus do passado e completar sua missão. Mas, será que o Lagus do futuro havia morrido? Afinal, não acharam o corpo dele. Poderia estar à espreita, apenas aguardando um próximo movimento para acabar com o espadachim. E Tenerife? O que teria acontecido com ele?

 

Foi quando um funcionário da Torre entrou na enfermaria.

 

- Senhor Baltasar! Cyrus acordou!

 

- Ótimo. Estamos indo – disse o sábio.

 

E dirigindo-se ao garoto:

 

- Vamos, rapaz. Poderá ver Cyrus agora.

 

* * *

 

A sós com o templário, Glenn ouviu-o dizer.

 

- Eu falhei, Glenn. Lagus fugiu.

 

- Como assim? Será que ele se teletransportou também? – indagou o jovem.

 

- Não, isso não. Não haveria tempo para que ele utilizasse a asa de borboleta. Tenho certeza de que peguei o maldito de surpresa, diferentemente de você, que já estava preparado pra fugir. E mesmo que ele fosse um sacerdote ou monge, também não haveria como utilizar a magia de teleporte, pois não havia espaço suficiente para criar um portal.

 

O espadachim tentava entender onde Cyrus queria chegar.

 

- O medalhão... Empreste-me o medalhão que dei a você no futuro.

 

Glenn obedeceu. Cyrus retirou um pequeno objeto metálico acoplado dentro dele.

 

- Sim... Tem o mesmo formato, a mesma aparência. Lagus tinha uma desses em uma das mãos. Está claro que nosso amigo voltou para o seu presente.

 

- Mas, como? Não havia próximo nenhum portal como aquele que me trouxe pra cá.

 

- Como, eu não sei. Talvez esse objeto tenha outros segredos que não conhecemos.

 

Disse isso e girou-o entre os dedos, analisando-o. Era feito de metal. Com cerca de 1 cm de diâmetro, lembrava uma pilha de relógio.

 

- Será que Tenerife foi com ele?

 

- É provável.

 

- Mas porque ele o levaria?

 

- Outra pergunta sem resposta.

 

Cyrus tentou levantar-se.

 

- Vamos, Glenn. Ajude-me a levantar.

 

- Fique deitado, você não está em condições de...

 

Não adiantou falar. Glenn teve que acudir antes que ele desabasse no chão. Saíram do quarto sem que as enfermeiras vissem e caminharam com dificuldade até o local onde Cyrus havia encontrado o espadachim pela primeira vez.

 

- Ali está o portal. Aproxime-se dele, Glenn.

 

O garoto ajudou Cyrus a sentar-se numa cadeira e andou em direção ao portal, portando o objeto metálico na mão. Quando estava a dois passos do seu destino, algo aconteceu. O portal passou a emitir um estranho zumbido, enquanto a pequena esfera do tempo brilhava intensamente.

 

Cyrus sorriu, como quem comprova uma importante teoria.

 

- O mesmo brilho.

 

- O que quer dizer?

 

- Agora tenho certeza. Lagus portava uma máquina do tempo e a utilizou para fugir.

 

- Então, não há necessidade de nenhum portal...

 

- Na verdade, esta máquina que está com você precisa sim, Glenn. Mas a que está sob a posse de Lagus não. Suponho ser uma versão melhorada. Claro e óbvio, isso explica como ele conseguiu vir do seu presente para tentar nos matar e como ninguém aqui no laboratório notou algo diferente como o que aconteceu na sua chegada.

 

- Mas, se ele tinha tanto medo que a gente mexesse no passado dele, porque não ficou por aqui para nos matar?

 

- Talvez tenha pensado que eu não fosse sobreviver. Na verdade, nem eu pensei, apesar de ter conseguido proteger-me com o escudo no último segundo. Quanto a você, meu caro, talvez ele tenha subestimado o seu poder.

 

- Como assim?

 

- Ele pode ter achado que sem eu aqui para te guiar, você seria inofensivo.

 

Glenn mordeu-se por dentro. “Veremos quem é inofensivo”...

 

- E agora? – disse o espadachim.

 

Com dificuldades para falar, o guerreiro ferido fez uma demorada pausa.

 

- Glenn, talvez não goste do que vou lhe dizer, mas.... creio que chegou a hora de terminar a sua participação nessa aventura. Você já se arriscou demais.

 

- Como? Não estou entendendo o que quer dizer, Cyrus...

 

- Volte para o futuro e tente retomar sua vida. Deixe as coisas aqui comigo. De posse da informação que me trouxe, poderei ir atrás do jovem Lagus e impedir que ele se fortaleça com a sua magia.

 

- Mas, mas... E se o Lagus do futuro surgir novamente?

 

- Morrerei lutando, se for preciso.

 

- Deixe que eu fique para lutar ao seu lado.

 

- Não, Glenn. Seu lugar não é aqui. A sua missão já foi cumprida. O conselho que dou é: fortaleça-se o máximo que puder e jamais se dê por vencido. Mesmo que a situação seja totalmente desfavorável, não desista, lute pelo seu futuro. E faça amigos. Os amigos são sua maior força.

 

Sem palavras para retrucar o pedido do seu mestre, Glenn acenou discretamente com a mão e atirou-se no portal.

 

Não percebeu, no entanto, que um vulto, ágil e certeiro, também entrou no portal, antes que ele se fechasse.

 

* * *

 

Ayla, Akero, Angel e Bruninha colocaram-se em posição de luta. Arrefeceram um pouco os ânimos quando viram que do portal havia surgido uma moça. Apesar de usar um modelo antigo, a bela loira trajava-se como os alquimistas.

 

- Vocês são amigos do Glenn? – perguntou.

 

- Mais um procurando o Glenn... Que cara popular! – comentou Bruninha.

 

- Popular e safadeenho. Deve ser alguma admiradora...Quem diria, o Glenn, tão quietinho... – sussurrou Akero no ouvido da monja.

 

Angel olhou sério para o caçador. Notou que a moça acabou ouvindo, pois ruborizou-se.

 

- Isso não é hora pra brincadeiras.

 

O caçador deu de ombros.

 

- Também estamos procurando ele – Ayla respondeu.

 

- Estranho, porque será que cheguei antes?

 

- Você esteve com o Glenn? – a gatuna quis saber.

 

- Sim. Há poucos minutos.

 

- Ufa, então ele está vivo! – Akero comemorou.

 

- Sim, está. Estou mesmo no futuro?

 

- O quê?

 

Um barulho estranho vindo do portal fez com que todos se virassem para trás novamente. Uma estranha figura, encapuzada, surgiu na frente deles.

 

- Ayla! Akero! Que bom ver vocês! Quem são esses? – perguntou o estranho, tirando o capuz.

 

- GLENN! !! – disseram todos.

 

- He, he. Que foi? Parece que até que viram uma assombração.

 

- Ficamos preocupados, onde esteve? – perguntou Ayla.

 

- É uma longa história...

 

- Cadê o Tenerife? – quis saber outro.

 

- Bem, ele...

 

- E quem é essa moça?

 

- Moça?

 

A alquimista colocou-se em seu campo de visão.

 

- Linda? Oh, não! O que você está fazendo aqui? Não me diga que...

 

Antes que viesse a resposta, Ayla interrompeu a conversa.

 

- Tem mais alguém aqui! Glenn, cuidado!

 

De repente, surgiu um arruaceiro, atrás do espadachim, em pleno movimento de ataque. Não havia como evitar, era um golpe surpresa. Uma adaga atingiria em cheio o coração do garoto.

 

Entretanto, naquela mesma fração de segundo, perceberam o som de uma flecha zunindo no ar, que passou por todos e cravou-se na mão do assassino.

 

Ayla virou o rosto na direção de onde veio a flecha salvadora. Distante alguns metros de onde a gatuna estava, havia uma caçadora, arco em punho, sorrindo.

 

- Sayoko! É você!

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 Capítulo 12

 

- Ai, ai, maldição!!! - gritou o arruaceiro que, após sofrer o golpe, saltou agilmente para trás, distanciando-se do grupo de amigos. Com outro movimento rápido, retirou a flecha cravada na mão. Apesar de permanecer calado, era visível o esforço que fazia para controlar a dor.

 

Em seguida, rasgou um pedaço de pano da sua vestimenta e enrolou no ferimento. Empunhando novamente a adaga, ajeitou caprichosamente os cabelos loiros que caíam sobre o rosto.

 

- Com essa eu não contava - disse, por fim - De onde saiu essa caçadora?

 

A essa altura, Sayoko, com outra flecha já engatilhada na direção do inimigo, já havia se posicionado à frente dos seus amigos.

 

- O que está acontecendo aqui, pessoal? Cadê o Tenerife? - perguntou a líder do clã Angueroules.

 

- Acho que o único que pode responder isso é o Glenn - comentou Akero.

 

Ainda assustado, o espadachim nem prestou atenção no que o companheiro havia acabado de falar. Tentava entender toda a situação. Lagus deveria estar por trás disso.

 

Ayla deu um passo à frente.

 

- Sayoko, por favor, não atire ainda. Akero, mais tarde o Glenn contará pra gente o que aconteceu. Por agora, precisamos arrancar desse sujeito algumas informações.

 

A gatuna virou-se para o arruaceiro.

 

- Diga, Bouty, está a serviço de quem?

 

Todos ficaram surpresos.

 

- Ayla, você conhece esse cara? - disse Angel.

 

Sem responder a monja, a gatuna continuou a interpelar o inimigo.

 

- Vamos, diga! Quem te contratou para matar o Glenn?

 

Com um sorriso desafiador, o arruaceiro parecia divertir-se com a situação.

 

- Mais respeito comigo, dona Ayla. Não te dei essas intimidades. Meu nome é Hunter, Bouty Hunter. E outra coisa: não devo satisfações a perdedores como vocês.

 

- Sempre engraçadinho... Pensei que estivesse morto.

 

- E você está sempre me subestimando. Não só não estou morto como estou bem mais forte do que antes. E quanto a você? Olhe pra isso, ainda é uma gatuna. Onde costuma treinar? Na Poringlândia? Ah, ah, ah!

 

- Você é que me espanta. Como conseguiu mudar de classe tão rápido?

 

- Inteligência para se aliar às pessoas certas, e não à "noobs", como você faz. Enquanto você é ainda uma gatunazinha, eu já estou quase conseguindo minha "aura azul".

 

"Aura azul?", perguntou-se Glenn que, atento, não perdia uma palavra da conversa. Lembrou-se de que uma vez Cyrus mencionou alguma coisa a respeito. Os guerreiros que atingiam o máximo nível de poder eram contemplados pelos deuses com uma aura azul, que brilhava ao redor dos seus corpos e os distinguiam dos outros numa batalha. Entretanto, achava que aquilo era uma lenda.

 

Ayla irritou-se.

 

- Seu idiota! - disse - Não fale besteiras. Vamos! Defenda-se! Vou mostrar a você o que uma gatunazinha pode fazer.

 

Sayoko a conteve.

 

- Calma, Ayla. Não seja afoita. Ainda não sabemos o suficiente sobre as reais intenções dele.

 

- Não, Sayoko. Eu conheço essa peça. Pensei que poderia, mas já vi que não vai ser fácil arrancar alguma coisa desse maluco.

 

O arruaceiro riu.

 

- Ah, ah, ah! Está bem, vem pro pau. Mexa essas suas canelas finas, sua loura da farmácia. Vou te mostrar que estou muitos níveis acima de você.

 

Adaga em punho, Ayla correu pra cima do arruaceiro. Estocadas fortes e rápidas foram desferidas, porém, sem efeito. Bouty se esquivava de praticamente todas e, as que acertavam, não pareciam causar dados relevantes.

 

- Uahuahuahuahuahuah! - riu o adversário – Até que sua velocidade de ataque é razoável para uma noobzinha! É até um bom exercício pra mim. Bom, agora acho que é minha vez de contra-atacar. Remover arma!

 

Com um movimento muito rápido e preciso, golpeou a mão de Ayla, fazendo com que ela deixasse cair a arma que carregava.

 

- E agora? Se quiser pode tentar me dar uns soquinhos.

 

- Ora, seu... - bufou a loira.

 

E partiu pra cima do arruaceiro de novo. Sem sucesso, como antes.

 

- Nossa! Ele é muito ágil, sem chance de acertar um golpe nele - disse Glenn.

 

- Vou ajudar – movimentou-se Bruninha, preparando-se para conjurar uma magia para aumentar a agilidade da amiga.

 

- Espere – interrompeu Sayoko – Deixe-a. É a honra dela como lutadora que está em jogo. Ajudar agora seria humilhante pra ela.

 

A sacerdotisa obedeceu e voltou a assistir a luta desigual. Surpreendeu-se, pois o arruaceiro havia desaparecido.

 

- Cadê ele?

 

- Está camuflado, se movimentando escondido – disse a caçadora que parecia ser a única que conseguia enxergar o inimigo.

 

Confusa, Ayla tentava adivinhar de onde viria o próximo golpe. Ficou apenas na tentativa.

 

- Apunhalar!

 

Um baque surdo de metal afundando na carne foi ouvido. A adaga de Bouty penetrou fundo nas costelas da gatuna, que deu um grito de dor e caiu de joelhos.

 

O arruaceiro postou-se em pé diante da adversária, pronto para atacar novamente. Entretanto, guardou a arma na cintura e desfez a posição de ataque.

 

- Sou muito bonzinho e não acertei nenhum ponto vital. Logo sua amiga sacerdotisa vai poder te curar. Mas vai ficar uma cicatriz, para você lembrar sempre que um dia foi derrotada por Bouty Hunter, o grande, ah, ah!

 

- Não agüento mais, Sayoko, não tenho sangue de barata! Galera, vamos pra cima dele! - gritou Bruninha.

Sayoko fez que sim com a cabeça e também partiu pra cima do arruaceiro. Mas pararam no meio no caminho ao perceberem que dois outros guerreiros haviam se posicionado ao lado de Bouty.

 

- E aí, pai, tá precisando de ajuda aí? - disse um cavaleiro, que segurava uma grande espada com as duas mãos.

 

- Lutou bem como sempre, pai! - falou um monge. Em volta dele, girando devagar, havia quatro esferas de energia.

 

“Pai? Não parecem ter idade para ser filhos dele...”, estranhou Glenn.

 

- Não preciso de ajuda, Synk. Está tudo sob controle, Evann. Mas foi bom terem vindo, assim puderam aprender um pouco vendo o papai lutar.

 

Akero, Bruninha, Angel, Glenn, Linda e Sayoko permaneceram estáticos por um momento, assistindo a conversa daquele estranho trio.

 

- Bem, são sete contra três... Acho que, mesmo em desvantagem, daríamos conta deles, não fosse pela caçadora... Por isso, acho que é hora de uma retirada estratégica.

 

- Não vai terminar o serviço, pai? - perguntou Synk.

 

- Terminamos depois. Não tenho pressa. Pra falar a verdade, nem sei porque o chefão quer tanto o fim desse espadachim noobzinho... Mas, ordens são ordens. Vamos!

 

Bouty e seus “filhos” deram meia-volta e sumiram pelos corredores da Torre do Relógio.

 

Rapidamente, Bruninha concentrou-se em Ayla e, utilizando sua magia, curou o ferimento.

 

- Você está bem, Ayla? - perguntou Sayoko.

 

Ainda agachada, a gatuna apenas fez um leve movimento com a cabeça.

 

Satisfeita com a resposta, a caçadora virou-se para o restante do grupo:

 

- Agora, vamos sair daqui. Não é um dos lugares mais agradáveis do mundo. Depois, por favor, se me puderem me colocar a par de tudo o que está acontecendo, ficaria muito grata.

 

Bruninha abriu um portal, que os levaria direto para Al De Baran.

 

* * *

 

Todos se reuniram em uma tranqüila praça, por onde passavam poucos transeuntes. Quem não conseguiu se acomodar no banco se sentou no chão mesmo. Atentos, ouviram Glenn contar a sua aventura. A pedido de Sayoko, deixaram as perguntas para o final.

 

- Que história incrível! Glenn, tem certeza que não fumou nada ou não te deram chá de cogumelo pra beber? - perguntou primeiro o mercador Cacos, que havia se juntado ao grupo.

 

- É mesmo difícil de acreditar, Cacos, mas a prova está aí na sua frente – disse Angel.

 

Ao lado de Glenn, a alquimista Linda levantou a cabeça quando percebeu que era sobre ela que falavam. Resolveu ficar quieta.

 

- Na verdade, essa história toda explica muitas coisas...

 

- Como assim, Sayoko? – quis saber Angel.

 

- Bem, agora sabemos por que o nosso rei Tristan III age tão estranhamente. O fato é que ele hoje é apenas um fantoche de alguém.

 

- Lagus – disse Akero.

 

- Exatamente. O lado bom é que agora sabemos a causa de tanta bagunça nesse nosso mundo.

 

- E o lado ruim?

 

- Bem, Akero, o ruim é que temos diante de nós um inimigo extremamente poderoso que, além disso, ainda tem a capacidade de viajar no tempo.

 

- Nós também podemos, Sayoko, esqueceu?

 

- Sim, mas, pelo que sabemos, nossa “máquina” do tempo é limitada aos portais aleatórios da Torre do Relógio, enquanto Lagus pode criar um portal de qualquer lugar.

 

Cacos se meteu na conversa.

 

- De qualquer forma, acho que é questão de tempo para que o Bouty e a turma dele apareçam pra matar o Glenn.

 

- Sim. Agora que Lagus sabe que nosso amigo voltou para o presente, vai querer de todo o jeito se apossar da outra máquina. Não vai querer arriscar que voltemos ao passado e tentemos alterar as coisas de novo - ponderou a caçadora.

 

- E não seria uma boa idéia voltar e tentar achar o Lagus antes que ele se tornasse tão poderoso? – falou Glenn, observado por Linda, que, esperta, notou que ele olhou rapidamente pra ela antes de fazer a pergunta.

 

- É muito arriscado, Glenn. Com certeza o Bouty colocou alguém de tocaia na Torre para atacar algum de nós que tente fazer isso - disse Angel.

 

Sayoko coçou a cabeça.

 

- De qualquer forma, não podemos ficar aqui parados esperando as coisas acontecerem...

 

Todos ficaram em silêncio, pensando em qual seria o próximo passo. Minutos se passaram e a líder do Angueroules quebrou o gelo.

 

- Apesar de não ser possível agora, o Glenn tem razão em querer voltar. Acho que esta é a nossa única chance de derrotar Lagus. Por isso, sugiro que tentemos descobrir algo sobre o inventor da máquina do tempo. Ele era aliado de Cyrus, deve querer nos ajudar.

 

- Lagus deve manter esse cara a sete chaves... - imaginou Akero.

 

- Não custa nada investigar. Vamos nos dividir em equipes, para não dar muito na vista. Angel, Ayla, Bruninha, Cacos e Akero deverão se dispersar por Rune Midgard, para tentar obter informações e distrair os capangas do Bouty. Glenn, Linda e eu ficaremos aqui investigando e, se preciso, iremos à Prontera.

 

Todos pareceram gostar da solução.

 

- Ayla, você está tão calada! Tem alguma idéia diferente? – disse Bruninha.

 

A gatuna estava estirada no chão, olhando as estrelas. Já era noite em Al De Baran.

 

- Façam o que quiserem. Preciso me ausentar durante um tempo.

 

Disse isso e levantou-se. Arrumou seus poucos pertences e saiu andando rumo à saída da cidade, sem olhar pra trás.

 

- Não vai fazer nada Sayoko? - questionou Bruninha.

 

- Deixe-a ir. Sei aonde vai. Não se preocupe, ela voltará.

 

Cacos levantou a mão.

 

- Eu peço para ficar fora dessa também, Sayoko. Tenho um compromisso na guilda dos alquimistas.

 

- Sem problemas. Esperamos você de volta mais forte ainda, Cacos. Boa sorte.

 

Em seguida, Sayoko nomeou Angel líder do outro grupo e dispensou os demais companheiros. Todos foram dormir, menos a caçadora e a monja, que permaneceram sob o luar.

 

- Chefa.

 

- Sim, Angel.

 

- Você não quer deixar transparecer, mas sei que está preocupada com Tenerife.

 

Sayoko suspirou.

 

- Você observa bem. É verdade. Fiquei muito tempo fora e esperava encontrá-lo são e salvo pra beber umas biritas na estalagem de Prontera... Sinto falta daquele doido.

 

- Todos nós sentimos, chefa, todos sentimos...

 

E deixaram-se ficar ao relento, tentando imaginar o que o futuro reservava para todos.

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Nossa, essa história me faz roer as unhas de tão interessante. Demorei pra postar, mas estou aki marcando presença, sei que tem muita gente lendo e adorando tmb.

Nossa, estou louca pra saber se a alkimista Linda e o Glenn vão ficar juntos. Adorei aparecer na história, rs.

Vc tem um enorme talento, parabéns Glenn.

Bjos

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Capítulo 13

 

Angel acordou cedo e logo despertou Bruninha e Akero. Trocou algumas palavras com Sayoko e colocou o grupo em marcha, não sem antes passar em várias lojinhas de mercadores e comentar com vários deles, como quem não quer nada, que estavam deixando a cidade naquele mesmo dia.

 

Sayoko, Glenn e Linda, pelo contrário, procuraram ser vistos o menos possível. Discrição era a palavra de ordem. Enquanto a caçadora percorria os becos de Al De Baran em busca de informações confiáveis, os dois viajantes do tempo se acomodaram em um quarto de estalagem, à espera de novidades.

 

- Glenn, você quer que eu volte logo para o passado? - quis saber Linda, após se virem sozinhos.

 

O espadachim pareceu pouco à vontade com a pergunta.

 

- Por quê?

 

- Só uma impressão.

 

- Se é sobre o que eu disse na reunião, eu acho que você não deveria ter vindo e se envolvido em tudo isso. É perigoso. E seu pai deve estar preocupado.

 

- E você?

 

- Eu o quê?

 

- Se preocupa comigo.

 

- Isso foi uma pergunta?

 

- Não.

 

O garoto sorriu. Linda ficou satisfeita com a reação. Após uns instantes de silêncio, mudou de assunto:

 

- Eu sei quem construiu a máquina do tempo.

 

- Sabe? Como?

 

- Foi meu pai. Era um antigo sonho dele...

 

- Tem lógica. Porque não disse à Sayoko?

 

- Um sentimento estranho. Tenho medo de que ele não esteja mais vivo neste tempo.

 

- Tomara que esteja. É a nossa única chance de ter um futuro.

 

Nova pausa.

 

- Por que você entrou naquele portal? - indagou Glenn.

 

A alquimista não esperava a pergunta. Hesitou. O próprio espadachim respondeu.

 

- Porque você se preocupa comigo.

 

- Não foi uma pergunta.

 

- Não.

 

Desta vez foi a menina quem sorriu.

 

* * *

 

O dia estava terminando e Sayoko estava desanimada. Havia falado com muitas pessoas, antigos companheiros de aventuras, aqueles em que podia confiar. Ninguém sabia por onde andavam os cientistas que outrora trabalhavam na Torre do Relógio. Provavelmente se dispersaram para outras regiões quando o rei mandou fechar a antiga Divisão de Ciência e Tecnologia, certamente influenciado por Lagus.

 

Sentada num lugar isolado à beira de um canal, passou a jogar pedrinhas na água turva, que corria lentamente. Pluft. Começou a pensar que a solução seria ir à Prontera procurar pistas, mesmo sabendo que a cidade era muito mais vigiada que Al De Baran.

 

Pluft. Será que Tenerife estava vivo? Pluft. Seu sexto sentido dizia que não. Afinal, vaso ruim não quebra fácil. Pluft. Não devia ter deixado aqueles dois adolescentes sozinhos num quarto de hotel... Ploft.

 

Ploft? Uma outra pedra não jogada pela caçadora afundou na água. Num pulo, sacou seu arco e apontou uma flecha na direção de um vulto que se aproximava.

 

- Calma aí, tia. Não atira.

 

Sayoko acalmou-se. Era apenas uma criança. Uma pequena bruxa, sardentinha, grandes olhos e com cara de sapeca.

 

- Você deve ser Sayoko.

 

- Sim, está falando com ela.

 

- Tenho um recado pra você. Alguém que você deseja muito encontrar também deseja encontrar você.

 

A caçadora desconfiou.

 

- Quem é essa pessoa?

 

- Você vai saber quando chegar a hora.

 

- Porque tanto mistério?

 

- É necessário. Questão de segurança.

 

- Porque confiaria em você?

 

- E porque não confiaria? Só petisca quem arrisca.

 

- Está bem. Leve-me a essa pessoa. Onde ela está?

 

- Está em Juno. Vá buscar seus amigos e me encontre na saída norte da cidade em 30 minutos.

 

A bruxinha sabia sobre Glenn e Linda. Quem era ela?

 

- Vá. Rápido.

 

- Já estou indo. Mas, antes, me diga o seu nome.

 

- Pode me chamar de Naninha Flor.

 

* * *

 

Não foi preciso nem meia hora. Vinte minutos depois o trio estava reunido esperando a misteriosa bruxinha.

 

Ela não demorou a aparecer. Simpática, cumprimentou Glenn e Linda com um sorrisinho malicioso e voltou-se para a caçadora.

 

- Tia, sei que viajar à noite é mais perigoso, mas temos que evitar que nos vejam. Tem muito malvado por aí que adoraria contar pros capangas do Lagus que um certo espadachim de cabelo verde resolveu ir para Juno.

 

Glenn sentiu uma pontinha de orgulho próprio. Tinha ficado famoso.

 

Sayoko concordou com a bruxinha e dispôs-se em seguir na frente, alertando sobre possíveis perigos que poderiam surgir.

 

E perigos não faltaram no caminho. Foram atacados por muitos monstros, mesmo que procurassem evitar a todo o custo o combate. Embora Sayoko desse conta de todos eles, tinha que se preocupar com os outros, que eram mais vulneráveis.

O relevo acidentado e o clima seco e frio também não ajudavam. Ventava muito naquela região. Misturada a pouca vegetação havia plantas carnívoras, extremamente perigosas para viajantes incautos.

 

Após quase três dias de caminhada, enxergaram a cidade de Juno. Sob uma colina, ela se erguia imponente. Fundada por antigos sábios, guardava inúmeros segredos entre os prédios seculares, sobretudo na Universidade de Juno, como o conhecimento perdido da era da magia do mundo antigo.

 

Diziam que os mesmos sábios que criaram Juno construíram também a Torre do Relógio em Al De Baran. Por isso a Torre havia sido durante muito tempo a sede da Divisão de Ciência e Tecnologia de Rune Midgard. Havia uma estreita ligação deste órgão do reino com o Instituto de Biologia e Engenharia de Juno.

 

Juno era também a capital política da República de Schwartzvald. Historicamente, esse vizinho de Rune Midgard adotava uma posição política discreta em relação ao que acontecia dentro da nação com a qual fazia fronteira ao sul. Seus cidadãos eram incentivados à busca pelo conhecimento em detrimento da comunicação com o resto do mundo.

 

Talvez por isso, a vida em Juno era, em geral, melhor que em Rune Midgard, embora os desastres naturais e invasões de monstros também fustigassem a cidade. Mesmo com dificuldades, os governantes faziam o possível para assistir os mais desvalidos.

 

Porém, nos últimos anos, havia crescido a preocupação com a leva de migrantes vindos do país vizinho, que chegavam todos os dias em busca de melhores condições de vida e sobrecarregavam os serviços públicos.

 

Os habitantes de Juno não poderiam imaginar onde estava o foco das perturbações que assolavam o mundo. Utilizando o rei Tristan III como um fantoche e agindo sem aparecer, Lagus evitava atritos com a República de Schwartzvald.

 

Nem por isso o vilão deixava de monitorar o que acontecia em Juno. Espiões ficavam de olho e relatavam ao seu mestre o menor acontecimento fora do usual. Por isso Naninha Flor guiava nossos heróis com tanto cuidado.

 

Conforme avançavam pela noite escura e se aproximavam do portão principal da cidade, começaram a ouvir um barulho que aumentava pouco a pouco. Parecia que uma grande batalha se desenrolava.

 

Apertaram o passo pra saber o que se passava. Sayoko adiantou-se e subiu numa árvore pra ver do alto.

 

- Por Odin!

 

- Que foi tia Say? – perguntou Naninha.

 

- De onde surgiram tantos monstros?

 

Equipada com seus binóculos, Sayoko conseguia ver longe. Uma esquadra de raydrics, espadachins e arqueiros, e khalitzburgs tentavam invadir a cidade, enquanto um pequeno grupo de guerreiros tentava impedi-los. Eram fantasmas de antigos guerreiros que davam vida a armaduras vazias.

 

- Estranho... Naninha, é comum esses tipos de monstros andarem por aqui?

 

- Raydrics? Não, tia Say, são comuns nas cavalarias de Glast Helm. Também estou surpresa.

 

- Vamos lá, gente, vamos ajudar! – disse a caçadora. Descendo da árvore num pulo, deu um longo assobio. Enquanto equipava mais flechas no alforje, um falcão desceu dos céus e aninhou-se em seu ombro.

 

- De onde veio isso? – surpreendeu-se Glenn.

 

- Esteve nos seguindo o tempo todo. Não tinha reparado?

 

O espadachim coçou a cabeça. Olhou para as duas meninas e percebeu que só ele não tinha visto a ave.

 

- Ora, não fico olhando pro céu o tempo todo...

 

Então, meio sem jeito, desembainhou a espada.

 

- Vamos logo! – gritou, correndo em direção à batalha.

 

Os outros se entreolharam e o seguiram, sem conter o riso.

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Capítulo 14

 

Ayla deixou Al De Baran com os nervos à flor da pele. Perder a batalha para o Bouty e ser humilhada na frente de todos os seus amigos não era uma coisa fácil de absorver. Por isso nem quis saber de comprar teleporte ou portal. Para esfriar a cabeça, desceu a pé para Prontera, onde comprou mantimentos. De lá, adentrou o deserto de Morroc.

 

O objetivo era chegar à guilda dos mercenários. Havia se decidido a tornar-se um deles o mais breve possível. Estava pronta para qualquer desafio.

 

Sabia o caminho, pois já havia o feito algumas vezes, na ânsia de mudar para uma classe mais poderosa antes que houvesse aprendido tudo que podia como gatuna. Todas às vezes, no entanto, quando chegava próximo aos portões, lembrava de um conselho dado por um antigo colega de treinamento.

 

- Vai por mim, perna fina. Antes de mudar de classe, procure aprender tudo o que puder como gatuna. Isso faz a diferença entre um guerreiro medíocre e um grande guerreiro.

 

Sim, Bouty havia dito isso, algum tempo depois que deixaram de ser aprendizes. O destino quis que fizessem o teste para gatunos juntos, de onde surgiu uma grande amizade. Ayla, uma menina sonhadora do interior, queria ser forte para ajudar o mundo. Bouty era um pobre menino da cidade que, ambicioso, via nas guerras a única chance para ser alguém na vida.

 

Mas, desta vez, era chegada a hora. Ayla caminhou até o portão e entrou sem cerimônia. Logo foi parada por dois mercenários nada amistosos.

 

- Alto lá. O que deseja aqui, piveta?

 

- Vim fazer o teste para mercenária.

 

- Ah, ah, ah. Mais um sem noção querendo entrar pra guilda, Pete.

 

- Esse povinho não tem jeito mesmo. Acham que qualquer ralé pode tornar-se um de nós. Wedge, vamos botar essa individua pra correr.

 

Ayla sacou sua adaga e se agachou, enquanto os dois vinham pra cima dela. Os guardas não haviam percebido que, com o pé, havia juntado um montinho de areia no chão. Antes que o primeiro deles chegasse muito próximo, chutou o montinho na direção dele.

 

- Ah, meus olhos! A infeliz jogou areia nos meus olhos! Não vejo nada!

 

O outro mercenário interrompeu a corrida por um instante, sem saber se acudia o amigo ou se atacava a gatuna. Optou pela segunda opção, partindo furiosamente sobre o seu objetivo.

 

Ayla conseguiu desviar da maioria dos golpes, que eram muito rápidos. Os que atingiram causaram alguns cortes sem gravidade. Contra-atacou de igual para igual, conseguindo acertar também algumas estocadas com a sua adaga.

 

- Muito bom! – disse o mercenário, limpando com a parte externa do braço um filete de sangue que escorria do seu rosto – Agora vamos esquentar a brincadeira. Envenenar arma!

 

Quando a garota percebeu, o adversário já vinha em sua direção com a adaga em punho. Da lâmina escorriam gotas de veneno, de cor púrpura, que emitiam um cheiro nauseabundo. Mas, determinada, Ayla pareceu não se importar: abaixava-se, saltava, movimentava-se com incrível rapidez, de forma que o mercenário não a atingia.

 

De tão concentrada, não notou o outro mercenário, já recuperado, deslocando-se furtivamente pela parede próxima. Revelando-se, apareceu atrás da gatuna e segurou-a firme.

 

- E agora, mocinha! Está perdida. Vamos, Wedge, acabe com essa piveta logo de uma vez.

 

Sem conseguir soltar-se, Ayla fechou os olhos e esperou o pior. Foi quando ouviu uma voz diferente e impositiva.

 

- Largue-a, agora!

Os dois mercenários, petrificados, soltaram a prisioneira.

 

- Sr. Ferraz!

 

- Já chega. Podem se retirar. Ela passou no teste.

 

- Mas, senhor, ela foi derrotada!

 

- Dois contra um? Vocês tiveram que se unir para conseguir derrotar uma simples gatuna. Caiam fora! É o suficiente.

 

Exausta, a gatuna enfim levantou os olhos para ver quem havia lhe salvado. Era um mercenário de estatura baixa, pele morena castigada pelo sol, cabelos brancos. O rosto tinha uma expressão firme e madura.

 

- Levante-se e siga-me! – ordenou.

 

Ayla quis agradecer, falar alguma coisa, mas o velho mercenário não deu nenhuma brecha. Percorreram alguns corredores, que se estendiam dentro da guilda como um labirinto. Imaginou que aquilo deveria ser uma forma de confundir os visitantes indesejados.

 

Passaram ao largo de um amplo salão, onde Ayla viu grupos de gatunos treinando. Sentiu certo arrepio na espinha, ao notar a brutalidade com a qual os professores tratavam os alunos. Ainda seguindo Ferraz, entrou em outro corredor escuro. Havia portas de lado a lado. Subitamente, ele parou frente a uma delas.

 

- Escute atentamente, pois não repetirei essas palavras. A partir de agora serei seu mestre. Eu decido se fica ou se não fica, se vive ou se não vive, quando treina e quando descansa, quando come e quando não come. Sua vida aqui será um inferno e você vai me odiar em poucos dias. Mas, não pense que ligarei pra isso. Se quiser ser uma mercenária, terá que sobreviver a tudo. Acomode-se por enquanto nesta cela e aguarde alguém te chamar para o início dos treinamentos.

 

Dito isso, o mercenário deu meia volta. Antes de ir, em definitivo, ainda disse:

 

- E não espere encontrar amigos por aqui. Não é um lugar para se confiar em alguém.

 

Uma vez sozinha, a gatuna respirou fundo. Seriam tempos difíceis aqueles.

 

* * *

 

Enquanto corriam em direção à peleja, Sayoko dava as instruções.

 

- Vamos formar um círculo em torno da Naninha e ir avançando aos poucos, até nos encontrarmos com o grupo que está protegendo as portas da cidade. Naninha ataca com suas magias. Glenn, você deve protegê-la, não deixe que nada a atinja. Linda, ajude o Glenn e fique preparada, pois vamos precisar de suas poções se o bicho pegar. Vou tentar manter livre o espaço em torno da nossa bruxinha.

 

E assim foram abrindo espaço por entre a multidão de raydrics e khalitzburgs. Com sua magia, Naninha criava de instantes em instantes uma tempestade de neve na imediação dos monstros que sofriam danos ou eram temporariamente congelados. Sayoko parecia uma metralhadora giratória: com incrível velocidade e com o auxílio do seu falcão, despachava inúmeros inimigos.

 

Mas, conforme se aproximavam dos portões da cidade, a quantidade de monstros em torno deles aumentava consideravelmente. Em certo ponto, Linda avisou:

 

- É melhor chegarmos logo, porque minhas poções azuis estão no fim. Não vou conseguir recuperar a energia espiritual de vocês!

 

As palavras da alquimista, embora necessárias, serviram para desconcentrar os guerreiros, e três raydrics escaparam do bloqueio de flechas e magias. Dois deles foram ao rumo da bruxinha.

 

- Glenn! Faça alguma coisa, não vou conseguir alcançá-los! – gritou Linda.

 

- Eles estão longe de mim também, o que eu faço?

 

- Não sei, improvise!

 

 O espadachim correu desesperadamente atrás dos monstros, mas estavam longe do alcance da sua espada. “Se ao menos esse escudo não fosse tão pesado”, pensou. No mesmo instante, teve uma idéia.

 

- É isso! O escudo!

 

Largou a espada e, juntando todas as forças dos seus braços, lançou o escudo em direção aos monstros. O objeto fez uma curva adiante e atingiu, em cheio, seguidamente, os dois raydrics, quando já se preparavam para golpear a pobre bruxinha indefesa.

 

O golpe, no entanto, não foi suficiente para derrotá-los. Percebendo quem os havia atacado, mudaram de direção, com as espadas apontadas para o espadachim de cabelos verdes. Glenn posicionou-se para se defender como podia, sem a ajuda do seu amado escudo.

 

Conseguiu bloquear com a própria espada o golpe do primeiro raydric. O ataque do segundo seria amortecido pelo escudo, mas, como estava sem ele, virou o corpo para esquivar-se. Lento, acabou sendo atingido.

 

- Glenn, cuidado! – gritou Linda.

 

A espada do raydric, porém, encontrou a ombreira de sua armadura, que o protegeu. Logo outro ataque viria, e a sorte poderia não querer sorrir-lhe pela segunda vez. Nesse instante, ouvi a voz de Linda, que corria em sua direção.

 

- Segure firme!

 

Percebeu que um objeto havia sido arremessado. No reflexo, agarrou-o com a mão esquerda. Era um frasco. Bebeu rapidamente, sem perguntar o que era. Imediatamente, sentiu um calor no estômago e o sangue correr mais rápido em suas veias. O braço ficou mais leve e os raydrics pareciam mais lentos que o normal.

 

“Poção do despertar. Agora vai”, pensou o espadachim. Mais confiante, defendeu o ataque do primeiro e, desta vez, conseguiu contra-atacar o outro, com um Golpe Fulminante. A força do impacto fez o raydric ficar tonto: foi o suficiente para que Glenn conseguisse derrotar o primeiro monstro e, em seguida, usando a mesma técnica, derrubasse o segundo.

 

Foi quando se tocou: não havia um terceiro? Olhou ao redor. Boquiaberto, teve tempo de ver o monstro cair derrotado facilmente por um arruaceiro, a poucos centímetros de Naninha. “Não agüento mais ver esses arruaceiros aparecendo do nada”, resmungou pra si mesmo.

 

- Tio Trevor! Que bom ver você!

 

- Digo o mesmo, Naninha Flor. Vocês estavam demorando, então resolvi vir buscá-los.

 

Com a ajuda de Trevor, o grupo conseguiu vencer os poucos metros que os separavam dos guerreiros que defendiam a entrada da cidade. Receberam suporte dos sacerdotes e alquimistas deles e os ajudaram a exterminar os últimos inimigos.

 

Assim que puderam, todos caíram exaustos próximo aos muros de Juno.

 

- Glenn, de onde tirou aquela idéia de jogar o escudo? – quis saber Sayoko.

 

- Vi Cyrus fazer uma vez.

 

- Você me salvou, Glennzinho, merece um prêmio.

 

Naninha foi até o espadachim e o beijou-o no rosto.

 

O garoto sorriu envergonhado, sob os olhares enciumados de uma certa alquimista.

 

* * *

 

Angel, Akero e Bruninha partiram de Al De Baran com uma missão: distrair os capangas de Lagus. Viajando a pé, seguiram rumo à Geffen, a cidade dos bruxos. Caminhavam sem pressa, aproveitando o clima ameno e as sombras das muitas árvores dispostas ao longo da estrada.

 

- Droga, Angel, porque tenho que andar com essa peruca verde ridícula?

 

- Vou repetir pela décima vez, Akero. Vamos fazer os filhos do Bouty acharem que você é o Glenn.

 

- Que ótimo, vão querer me matar.

 

- Que falta de confiança na gente! Estamos aqui pra te proteger – interveio Bruninha.

 

- Se é assim, porque parou de conjurar Kyrie Eleison? Não pare! – reclamou Akero, se referindo à magia dos sacerdotes, que criava um escudo protetor em torno do alvo.

 

Bruninha mostrou a língua para o caçador, mas atendeu seu pedido.

 

- Que cara feia, moço. Não precisa ficar brabo, já conjurei a magia.

 

- Não é isso. É que senti um ventinho aqui na orelha, como se uma assombração tivesse passado por aqui...

 

Angel ouviu aquilo e arregalou os olhos, virando-se na direção do amigo.

 

- Saia daí, Akeeeerooooo!!!

 

Outro monge surgiu neste instante, ao lado do falso Glenn. A palavra ASURA foi ouvida, seguida de um enorme estrondo. Bruninha foi jogada pra trás e, um pouco atordoada, procurava entender o que tinha acontecido, enquanto uma nuvem de poeira baixava devagar.

 

Akero permanecia na mesma posição, olhos arregalados. Ao seu lado, Angel, caída ao chão, jazia desacordada. Havia salvado o companheiro, recebendo, sozinha, o impacto de um Punho Supremo de Asura, o golpe mais temido dos monges. O autor da técnica era Evann, um dos filhos de Bouty.

 

- Ela foi muito rápida! – comentou o monge, desapontado – Mas levou o que merecia. Agora, vamos mandar esse espadachim noob para o cemitério. Como toda a minha energia espiritual se foi nesse golpe, vai ter que ser a seco mesmo.

 

Preparou-se para atacar novamente, mas deteve-se, ao ouvir uma chuva de conjurações.

 

- Agilidade! Benção! Glória!

 

Era Bruninha utilizando suas técnicas para ajudar o suposto Glenn, melhorando sua agilidade, destreza e sorte, respectivamente.

 

- Aff, que sacerdotisa chata. Hei, Synk, vai me ajudar ou não?

 

Espalhafatosamente, um cavaleiro surgiu de um arbusto.

 

- Você é muito sem graça, Evann. Estava esperando para fazer uma entrada triunfal como a sua.

 

- E você gostou?

 

- Aham, papai ficaria orgulhoso.

 

O monge sorriu satisfeito.

 

- Agora faça o seu trabalho. Não quero mais ouvir um “a” dessa sacerdotisa.

 

Synk passou a golpear Bruninha, que se defendia do jeito que podia, recuando e curando-se, sem poder ajudar Akero.

 

Evann, por sua vez, deu um passo à frente para concretizar a sua ação, em direção ao que julgava ser um pobre espadachim. Terminando de completar o passo, ouviu um “creck”.

 

- Aw, minha perna! Quem foi o inconseqüente que deixou uma armadilha bem no meu caminho? Arre égua, não posso me mover!

 

Olhou para a pessoa à sua frente.

 

- Espere aí! Você não é um espadachim!

 

Akero jogou a peruca verde pra longe.

 

- Tcharam! Caiu na minha armadilha! He, he – zombou o caçador.

 

- Maldito! Mas não pense que vou cair para as suas flechinhas.

 

- Nem vou precisar. Sabia que tem alguém bastante nervosa contigo?

 

- Como assim?

 

Quando Evann se deu conta, Angel surgiu na sua frente. Sem dó, a monja aplicou-lhe quatro socos e, logo após, a técnica final.

 

- Último Dragão!!!

 

Uma força destruidora emergiu do punho da lutadora, que atingiu o adversário, arremessando-o para longe.

 

Vendo aquilo, Synk correu para acudir o irmão desacordado. Foi quando se viu cercado por uma monja, um caçador e uma sacerdotisa, que não pareciam nem um pouco felizes.

 

- Er...he, he. Que coisa, não? Acho que estou bem encrencado.

 

- Muito encrencado, mocinho – disse Bruninha.

 

Acuado, Synk não teve outra saída. Girando a espada no ar, gritou:

 

- Impacto de Tyr!!!

 

Os três amigos sentiram o som de um pequeno trovão e uma onda de energia envolvê-los, que fez com que se chocassem uns com os outros. Confusos, perceberam, após poucos segundos, que o cavaleiro fugia em desabalada.

 

- Akero!

 

- Pode deixar, Angel.

 

O caçador tirou uma flecha do alforje, esticou bem o arco e mirou com capricho. Zunindo no ar, o objeto encontrou seu destino, transpassando a perna do fugitivo, que capotou mais à frente.

 

Furiosa, Angel andou pisando forte até Synk. Prensou-o junto a uma árvore com uma das mãos, tendo na outra o punho armado em direção ao rosto do cavaleiro.

 

- Não me mate!

 

- E porque não deveria fazer isso?

 

- Posso dar alguma informação.

 

Angel relaxou os músculos do braço.

 

- Desembucha.

 

- He, he. O mestre Lagus sabe que vão procurar a pessoa que pode manipular a máquina do tempo - respondeu, com um sorriso maroto.

 

- E daí?

 

- Um de nós estará à espera... E vocês não terão nenhuma chance. Queria estar lá pra ver a cara de manés que farão quando chegar a hor...

 

- Quem estará à espera?

 

Angel não obteve resposta. O cavaleiro havia pendido a cabeça, desmaiado. A queda havia sido bem feia.

 

- Droga. Bruninha, vamos voltar. Por favor, abra um portal para Al De Baran.

 

- Que cara é essa, Angel?

 

- Fomos muito ingênuos... Nossos amigos estão em perigo!

 

E num portal de luz os três viajaram, sem saber que Sayoko, Glenn e Linda estavam em Juno.

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Capítulo 15

 

Impressionado, Glenn admirava a imponência dos prédios e demais construções de Juno, enquanto andava pelas suas calçadas de pedras bem feitas. “Era uma cidade irada”, pensou o espadachim, repetindo a expressão que ouvira de Naninha. Ouvira dizer também que era bem maior que Prontera.

 

Àquela altura, Naninha já era íntima de todos. Parecia que a conheciam há muitos anos. E, como perceberiam com o tempo, seu passatempo preferido era “pentelhar” os amigos. Paciente, Glenn procurava responder as perguntas dela, enquanto se dirigiam ao lugar onde se encontrariam com o personagem misterioso que ela havia mencionado a Sayoko.

 

- Tio Glenn, você e a Tia Linda estão namorando?

 

A pergunta pegou o espadachim de surpresa.

 

- Er... bem, por que está perguntando isso? – desconversou, encabulado.

 

- Ah, sabe como é, vocês só andam juntos, cheios de coisinhas... – disse, dando uma risadinha mal disfarçada – Eu vi lá na batalha, quando te beijei no rosto. Ela quase me espancou com o olhar.

 

- Mesmo? Percebeu isso?

 

- É claro! Eu percebo tudo, tio! Não escapa nada a esses olhinhos.

 

- Mas a verdade é que não estamos namorando.

 

- Ah, fala sério! Como não? Por quê?

 

- Ora, porque, porque...

 

- Ah, já sei! Você tem vergonha de pedi-la em namoro!

 

- Hei! Fale mais baixo, quer que toda Juno saiba? – disse Glenn, sussurrando – Não tenho vergonha... É que, é que...

 

- Hi, hi, hi! É tímido... Quer uma ajuda? Eu falo pra ela, tio! Tia Linda, o tio Glenn quer te falar uma coisa!

 

- Não!!! Não faça isso...

 

Linda se aproximou dos dois.

 

- O que é? O que quer me falar, Glenn?

 

- Não é nada não. Viagem da Naninha.

 

- Ora, tio Glenn, não fique com vergonha. Tia Linda, o tio Glenn queria dizer que...

 

De repente, Trevor, que os guiava por Juno, parou e disse:

 

- Chegamos! É aqui. Vamos entrar logo. Não podemos ficar aqui de fora de bobeira, chamando a atenção das pessoas.

 

- Oba, oba! Vamos ver o nosso vovô! – exclamou Naninha, empolgada.

 

“Salvo pelo gongo”, pensou Glenn. A novidade fez a bruxinha esquecer momentaneamente o assunto. Foi a primeira a entrar, correndo adentro pela porta de uma casa simples, que ficava nas imediações do centro da cidade. Encaixada no meio de tantas outras residências parecidas, jamais se poderia imaginar que ela fosse o palco de um encontro tão importante para os nossos amigos.

 

Enquanto atravessavam a soleira da porta, Linda perguntou a Glenn:

 

- O que você queria me dizer?

 

- Ah, nada não. Não tinha importância. Coisa de criança – disfarçou o garoto, com um sorriso amarelo.

 

A sala de entrada era singularmente decorada. Vasos com plantas esquisitas e outras obras de artes ornavam o ambiente. O chão era atapetado e estantes com livros se equilibravam junto às paredes. Havia pouca iluminação. Trevor os convidou a sentar num confortável sofá, enquanto esperavam Naninha trazer o dono da casa.

 

Não tardou para que um senhor de idade avançada, com cabelos e bigode bem brancos surgisse. “Esse não é o meu pai, mas o conheço de algum lugar”, pensou Linda. “Sim, é claro!”.

 

- Roger. Meu nome é Roger – respondeu o velho – Que bom encontrar vocês! Como vai, Glenn? Pelo visto, chegou são e salvo ao presente.

 

Espantado, o espadachim reconheceu o pupilo do velho Baltasar, que havia encontrado no passado. Pelo nome, Sayoko também o identificou através da história que o companheiro havia contado. Naninha e Trevor também pareciam saber de tudo.

 

Em seguida, Roger fixou os olhos na alquimista.

 

- Linda? É você? Meu Deus! Então é isso! Você veio para o futuro!

 

O velho estava transtornado.

 

- Como pôde fazer isso? Seu pai ficou desesperado com o seu desaparecimento na época. Enquanto viveu, procurou você por todo o canto desse planeta.

 

Linda contraiu a face, provocando a queda das lágrimas que se formaram em seus olhos.

 

- Papai está... Está morto?

 

Roger compreendeu a comoção da garota. Afinal, há poucos dias havia estado com o pai. Respirou fundo e disse:

 

- Trouxe vocês aqui para esclarecer muitos pontos, que vocês precisam saber se quiserem derrotar Lagus. O que aconteceu com Baltasar é um deles. Escutem com atenção.

 

O velho sábio passou, então, a descrever tudo o que acontecera desde o retorno de Glenn ao presente. Contou que Cyrus havia tentando de todas as maneiras possíveis impedir que Lagus continuasse suas pesquisas. No entanto, não conseguiu encontrá-lo em lugar algum, por mais que vasculhasse todo o reino.

 

Frustrado, resolveu contar tudo o que sabia para Baltasar. Este não duvidou do que o templário lhe disse; pelo contrário, mostrou a ele os esboços de um projeto secreto, o qual não havia mencionado a mais ninguém. Tratava-se da máquina do tempo.

 

Combinaram que Baltasar deveria continuar trabalhando veladamente no projeto, enquanto Cyrus continuava com a sua busca ao vilão. Lagus não foi encontrado. Anos mais tarde, os dois passaram a desconfiar da progressiva mudança de atitudes do rei Tristan III. Quando começaram os ataques de monstros e as mudanças climáticas, a desconfiança tornou-se certeza: Lagus havia surgido.

 

Em vão tentaram alertar o rei sobre a aproximação da nefasta figura. Ambos acabaram expulsos do castelo ao tentar combater as ambições de Lagus e formaram um grupo de resistência. Ao longo do tempo, muitas baixas ocorreram no grupo, até que, enfim, a máquina do tempo ficou pronta.

 

Mas antes que Cyrus fosse enviado ao passado, Lagus soube de algum modo o que estavam planejando e tentou apossar-se da invenção. O templário foi obrigado a fugir para o interior do país, levando consigo a esperança de todos.

 

- Cyrus sabia onde deveria ir. Era um homem ciente do próprio destino – comentou Sayoko.

 

Roger fez um movimento com a cabeça, concordando com as palavras da caçadora.

 

- Quando Cyrus partiu, o senhor Baltasar, preocupado, confiou a mim todo o segredo da máquina do tempo, temeroso de que algo pudesse acontecer a ele. Inclusive, mostrou-me a melhoria que havia feito na invenção, e o ajudei a terminá-la.

 

- Foi quando Lagus roubou a máquina... – disse Glenn, encaixando os fatos.

 

- Sim. Infelizmente, Baltasar tinha razão. Tempos depois, Lagus descobriu onde ficava nosso laboratório secreto e surpreendeu meu mestre, matando-o e levando com ele a invenção. Por sorte, eu havia saído para fazer uma compra. Voltei a tempo de ver Lagus saindo do local, mas não a tempo de salvar a vida do seu pai, Linda.

 

- Assassino miserável!

 

Os outros se solidarizaram com a alquimista, que não conteve as lágrimas restantes.

 

- Após esse fato, escondi-me novamente e decidi construir uma nova máquina do tempo, para continuar com o plano de voltar ao passado e destruir do início os planos de Lagus. Para não ter que começar do zero, lembrei que você, Glenn, havia voltado ao presente. E tive a idéia de utilizar como base a máquina que está com você. Ela está contigo, não está?

 

- Sim, sim. Bem aqui – disse Glenn, enfiando a mão no bolso e retirando o pequeno objeto metálico.

 

- Ótimo. Foi por isso que confiei à melhor integrante do Chrono Triggers a missão de trazê-los até aqui.

 

- Chrono Triggers? O que é isso? – o espadachim perguntou.

 

- É como nomeamos o grupo de resistência a Lagus, fundado por Cyrus e Baltasar. Claro que é uma denominação confidencial. É uma pena que contemos com tão poucos membros atualmente: restaram apenas Naninha e Trevor.

 

- Pois o Chrono Triggers acaba de dobrar o número de seus membros, senhor Roger – disse Sayoko, resoluta – Eu, Glenn e Linda estamos dentro, se o objetivo é acabar com a farra desse tal de Lagus!

 

- Isso é muito bom! Sinto renovadas as minhas esperanças!

 

Animados, Roger convidou a todos para comer alguma coisa e descansarem. No dia seguinte, prometeu que levaria os novos Chrono Triggers para conhecerem seu laboratório.

 

* * *

 

Enquanto todos descansavam em Juno, uma discreta sala no palácio do rei Tristan III, em Prontera, era palco de uma sinistra conversa.

 

- Então, como foi o ataque dos meus raydrics à Juno? – perguntou Lagus, enquanto movia-se entre as estantes abarrotadas de livros que havia na sala.

 

Atrás dele, o ar ganhava o rastro fétido de uma fumaça negra, que emanava do seu corpo. Sentindo o peso enorme de toda aquela energia, e evitando o olhar perturbante e sombrio do seu interlocutor, Bouty Hunter respondeu:

 

- Atingimos o objetivo, mestre. Os inimigos tiveram muitas baixas. Logo estarão enfraquecidos o suficiente. Senhor, se me permite dizer, porque não aproveita a chance e ataca novamente hoje mesmo, enquanto se refazem da luta?

 

Um imperceptível franzir de testa demonstrou a contrariedade do vilão ao ser questionado. Após uma pausa, disse:

 

- Infelizmente, ainda não consigo invocar tal quantidade de monstros de uma vez só em um intervalo tão curto de tempo. Mas chegará a hora da República de Schwartzvald cair. Lamentarão o dia em que resolveram apoiar nossos traidores.

 

- Por falar em traidores, nosso informante confirmou a chegada do portador da máquina do tempo a Juno. Está acompanhado de uma caçadora e uma alquimista. Devo agir?

 

- Não. Você deve permanecer aqui. Designarei outro servo para essa missão. Por mais que o retorno deles ao passado seja praticamente impossível, devo eliminar todas as chances de atrapalharem meus planos.

 

- Sua nova arma já está pronta pra ser usada, senhor?

 

- É claro.

 

- Devo advertir que a caçadora está num nível mais elevado que os outros.

 

- Não será problema. Agora, vá.

 

- Sim, senhor.

 

Bouty deu meia volta e, angustiado, retirou-se apressadamente da sala. Deixou o castelo conversando com os próprios botões.

 

- Gostaria de não ter que seguir ordens de alguém tão repugnante. Eca! Está cada dia pior. Aquele negócio preto dá até coceira no corpo. Minha orelha está queimando... Ou tem alguém falando mal de mim...

 

* * *

 

- Bouty, maldito!

 

Enquanto golpeava furiosamente um enorme pedaço de carne pendurado no teto, de algum monstro que havia sido abatido recentemente, Ayla fixava o pensamento no seu ex-amigo. Superá-lo o mais rápido possível era a sua meta. Não sentia ódio dele, mas de si mesma, por ser tão fraca.

 

Tchum, tchum – era o som surdo e repetitivo que se ouvia das lâminas penetrando na carne. Em pouco tempo era preciso substituí-la, após tantos recortes. Nos poucos momentos em que se permitia certa descontração, se imaginava trabalhando com destaque no melhor açougue de Prontera, quando saísse dali.

 

Ainda estava se acostumando a utilizar duas adagas ao mesmo tempo, uma em cada mão. Era estranho a princípio, mas bem lógico para um mercenário. Afinal, deveria ser capaz de esquivar-se de todos os golpes, por isso, um escudo se fazia totalmente desnecessário, além de torná-la mais pesada.

 

Após os primeiros dias de treinamento, pensou em desistir. Ferraz era muito rígido normalmente, mas com ela era mais. Em geral, após dispensar os demais gatunos, ordenava que permanecesse até mais tarde, sob uma desculpa qualquer de que havia feito algo errado ou o desrespeitado de alguma forma. Cansada, com fome e sede, a gatuna era obrigada a refazer todos os exercícios.

 

Quando se recolhia para sua cela, era difícil descansar. Os instrutores costumavam soltar monstros nos alojamentos, no meio da noite, para testar os alunos. Era preciso estar sempre alerta. Havia também os colegas invejosos, que vendo o quanto ela se destacava, procuravam prejudicá-la, envenenando sua comida ou tentando machucá-la no meio da noite. Como resultado, muitas vezes passava a madrugada em claro e o dia inteiro com fome. Não adiantava reclamar aos superiores: faziam vista grossa, admitindo aquilo como parte do treinamento de um mercenário.

 

Nos momentos de vigília, lembrava dos primeiros tempos como gatuna, quando percorria as ruas de Morroc ou Prontera com o companheiro Bouty, realizando pequenos furtos. Furtavam alimentos para matarem a própria fome e objetos menores, que eram oferecidos à guilda dos gatunos em troca do treinamento que recebiam. Bouty se sentia bem à vontade com aquilo, ao contrário de Ayla. De qualquer forma, a gatuna seguia em frente, no que achava ser a melhor maneira de se fortalecer. “Outras classes são cheias de regras e princípios, deve ser muito chato”, pensava. Gostava de se sentir livre.

 

Também pensava muito nos amigos. Como estariam se saindo? Ao menos estavam agora na companhia de Sayoko. Isso a deixava mais tranqüila. Depois de um tempo começou a achar que, no dia do confronto com Bouty, a caçadora escondia alguma coisa. Parecia tensa, como se estivesse sofrendo para conter a própria força.

 

E Tenerife? Custava a crer que estivesse vivo, como acreditavam os outros. Pela história que o Glenn contou, não imaginava como poderia ter escapado do acidente ocorrido no passado. Cyrus se salvou porque tinha um bom escudo, além de muita força e vitalidade. Mas, um bruxo, e ainda por cima congelado?

 

E os dias foram passando. Ou semanas? Não demorou muito e Ayla perdeu a noção de quanto tempo estava ali.

 

Um dia, pela manhã, quando se dirigia ao espaço de treino, ouviu vozes nos corredores. Não teria dado muita bola caso não tivesse percebido que dois mercenários mais experientes tocavam em dois nomes familiares.

 

- Estou te falando, rapaz, luta bonita foi aquela. Arruaceiro contra templário. Eu estava lá. Os dois eram fora de série.

 

- Você os conhecia?

 

- Claro! Um era o Bouty Hunter. Não sei dizer direito, mas ele tem um cargo importante no castelo, parece que é guarda-costas de um dos conselheiros do rei. Eu e outros mercenários e arruaceiros estávamos sob as ordens dele.

 

- E o outro?

 

- Era o velho Cyrus, o antigo chefe da guarda pessoal do rei. Estava sendo procurado por traição. Nossa missão era encontrá-lo e acabar com ele. Depois de vários dias de busca, o achamos, e Bouty o desafiou para uma luta.

 

- Um contra um?

 

- Aham. Apesar de velho, o templário era durão. Agüentava todos os golpes ou defendia com o escudo. Parecia um muro de ferro. Ele só tinha dificuldade para contra-atacar, porque Bouty se esquivava bem. E nisso ficaram um bom tempo.

 

- E como o arruaceiro conseguiu vencer?

 

- Foi pelo cansaço mesmo. Parece que o tal Cyrus tinha passado muitos dias sobre o seu peco-peco, fugindo da gente. Quando ele se distraiu, Bouty utilizou aquela técnica chata pra burro, de remover o escudo e a arma.

 

- Vixi, deixou o cara peladão.

 

- Quase isso. Aí ficou fácil aplicar o golpe final. E o templário deitou.

 

- Cumpriram a missão.

 

- Sim. E valeu a pena. Ganhamos uma boa recompensa. Mas acho que o Bouty deu sorte também, pois o velhote não usou o Crux Magnum. Talvez porque já estivesse fraco. Ouvi dizer que os templários sofrem dano, também, quando o utilizam.

 

- Entendi. Bem, mas quando aparecer uma bocada desta, me chame.

 

- Beleza. Pode deixar.

 

Enquanto os dois se despediam, Ayla, camuflada a uma parede, processava na memória tudo que ouvira. Então, havia sido o Bouty que assassinara Cyrus. E, muito provavelmente, ele liderou o grupo de arruaceiros e mercenários que mataram os pais do Glenn.

 

“Aguardem, Lagus e Bouty. Em breve vamos acertar as contas”, pensou a gatuna. E correu para encarar mais um dia de treinamento.

 

* * *

 

Mal Angel e companhia chegaram a Al De Baran, tentaram encontrar Sayoko para avisar sobre a cilada que haviam armado contra eles. Não só não acharam a caçadora, como também não obtiveram qualquer informação sobre o rumo que haviam tomado. Havia a necessidade de serem discretos, uma vez que espiões e informantes de Lagus poderiam estar à espreita.

 

Um dia inteiro se passou e nada. No meio da noite, foram até o bar da cidade, escolheram uma mesa e pediram uma cerveja. Na verdade, somente Akero pediu. Angel e Bruninha pediram suco de laranja. O objetivo era tentar pescar qualquer informação que fosse útil.

 

Não demorou muito e um ferreiro, puxando uma cadeira, sentou-se à mesa sem ser convidado.

 

- Uau, que gatas! Ei, caçador, não tem como me emprestar uma não? Está com duas – disse ele, dando uma piscadinha para Akero.

 

O caçador reconheceu nele um amigo, que ambas não conheciam. E resolveu dar corda à brincadeira.

 

- Converse um pouco com a monja, ela está muito carente ultimamente.

 

Angel olhou para o caçador, sem acreditar que ele havia dito aquilo. Atribuiu a um possível estado de embriaguês do colega. Enquanto isso, o ferreiro arrastava a cadeira, ficando a poucos centímetros da garota.

 

- Você tem jeito de ser durona. Mas adoro mulheres assim, fortes, atléticas...

 

A essa altura, Akero já havia sinalizado discretamente a Bruninha que era uma brincadeira. Com a mão sobre a boca, a sacerdotisa mal conteve o riso.

 

- Gostaria de conhecer minha coleção de armas lá em casa? Prometo que não vai se arrepender.

 

- Ora, se manca, cara! Não sou pro teu bico não! Vai alugar outra.

 

- Fica mais linda quando nervosa, ai, ai.

 

Angel cerrou os punhos. O ferreiro já era. Percebendo que era hora de retirar-se, disse:

 

- Calma, calma, minha deusa. Vou dar o fora. Mas, antes, tome isso. É pra você.

 

Colocou um bilhetinho entre as mãos da monja e saiu cantarolando uma música qualquer. Angel ficou parada, sem reação.

 

- Olha só, recebendo bilhetinho de amor. Dona Angel, arrasando corações! – zombou Bruninha.

 

- O que diz esse bilhete? – quis saber Akero.

 

A monja desdobrou o papel e leu o conteúdo:

 

Fui incumbido por Sayoko de informar que ela e os outros foram para Juno. Desculpe o mal jeito, mas precisava entregar a mensagem sem despertar suspeitas.

 

Sucesso em sua jornada.

 

Alfred

 

- Quem é Alfred?

 

- É um velho amigo de Tenerife e Sayoko.

 

- Ah, tá.

 

- Que foi Angel, parece decepcionada.

 

- Ora, calem a boca. Vamos logo pra Juno!

 

Bruninha olhou pra Akero e deu outra risadinha.

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Capítulo 16

 

Roger deixou seus convidados dormirem até mais tarde. Afinal, haviam acabado de sair de uma batalha quando chegaram, e estavam bastante cansados. Para adiantar, mandou Trevor na frente, para se certificarem da não presença de observadores indesejados durante o trajeto até o laboratório.

 

Quando o arruaceiro voltou com a informação de que estava tudo ok, todos estavam em pé e prontos para partir. Começaram com uma pequena caminhada até o subúrbio de Juno, longe das vias principais da cidade, por onde havia apenas ruas estreitas de pedras.

 

Glenn observou que os bairros de Juno não eram muito diferentes dos de Prontera e de Al De Baran, sob um aspecto: por todo o lado se via a miséria, vestida com muita sujeira, pedintes, velhos doentes e crianças maltrapilhas. Pelas janelas das casas e prédios, podia-se notar que dezenas de pessoas dividiam, às vezes, uma mesma habitação.

 

- Esse é o resultado do mau uso do poder, espadachim – comentou Roger – Fico pensando o quanto Lagus poderia ajudar o mundo caso utilizasse sua inteligência para outros fins que não satisfazer a própria ambição...

 

- É muita gente amontoada num lugar só – comentou Linda, também indignada com a situação daquela gente.

 

- Sim, Linda. São pessoas que deixaram o campo, refugiando-se sob os muros de Juno, devido aos ataques de monstros e outros desastres. Mesmo com os esforços dos governantes, é impossível dar condições de vida digna a todos.

 

Aquilo só gerava em todos mais revolta. E crescia, no coração de todos, a vontade de fazer alguma coisa para acabar com o sofrimento daquela gente.

 

Nos arredores da biblioteca de Juno, seguindo Roger, entraram em uma porta estreita de um pequeno prédio de dois andares. Era uma construção antiga e mal conservada, com paredes que não viam há anos uma mão de tinta. O assoalho, de uma madeira desbotada, cantava um rangido triste ao ser pisado. Não havia móveis nem outros adereços na sala e cômodos do andar térreo.

 

Uma escada, também de madeira, dava acesso ao segundo andar. Roger dirigiu-se a ela. Todos imaginaram que o laboratório estaria acima deles. No entanto, o velho ligou um dispositivo camuflado numa parede, que revelou uma abertura no chão. A escada se prolongava, levando a um andar abaixo do que estavam.

 

Sem dizer nada, todos desceram alguns degraus, que levavam a um extenso e escuro corredor. Caminharam mais até chegarem numa porta de ferro, a qual Roger abriu com uma chave.

 

- Pronto. Nosso laboratório.

 

Surpresos, Glenn, Sayoko e Linda contemplaram um largo salão. No centro, concentrava-se toda a parafernália típica de laboratórios científicos. Três pessoas circulavam atarefadas ao redor de uma grande mesa, onde pareciam trabalhar em algo importante. Percebendo a presença de Roger e companhia, os cumprimentaram discretamente e logo voltaram ao que estava fazendo.

 

- Quem são eles? – indagou Linda, desconfiada.

 

- Não se preocupe, são de confiança – disse Roger – São cientistas gentilmente cedidos pelo governo da República de Schwartzvald, que, em segredo, apóia nossa causa.

 

O velho alquimista virou-se para o espadachim:

 

- Glenn, poderia dar-me a máquina do tempo? Temos trabalho a fazer.

 

De boa vontade, o garoto estendeu a mão para entregar a Roger a máquina do tempo. Entretanto, uma súbita e conhecida voz o fez retrair o braço e guardar o objeto novamente no bolso.

 

- Dê-me isto, agora!

 

Os olhos se voltaram para a porta de entrada do salão, onde estava postada uma estranha figura encapuzada. Glenn reconheceu a capa:

 

- Não é possível! Te-te-nerife! É você?

 

A voz novamente retumbou de dentro do capuz.

 

- Tenho ordens de levar este objeto. Se não entregarem, serei obrigado a usar a força.

 

Reconhecendo a voz do amigo, desta vez foi Sayoko quem disse:

 

- Cara! Tenerife! É você? Está maluco ou o quê? Somos nós, seus amigos!

 

- Eu avisei.

 

A um movimento do estranho encapuzado, o ar no teto do laboratório começou a esfriar:

 

- Nevasca!

 

Pegos de surpresa, não houve como os alvos da magia fugirem. O intervalo entre a conjuração e a execução foi quase instantâneo.

 

Vendo todos congelados, o bruxo, de olhar fixo e sem brilho, caminhou até Glenn. Um rastro de fumaça negra o acompanhava. Com o cajado, golpeou o bloco de gelo, que se quebrou e veio ao chão, juntamente com o espadachim desacordado. Vasculhou as pedras de gelo no chão até achar o que procurava.

 

Quando estendeu a mão para pegar a máquina do tempo, alguém foi mais rápido que ele.

 

- Porque quer este objeto? Veio a mando de Lagus? Por acaso vendeu a sua alma em troca de mais poder?

 

O bruxo levantou a cabeça e mirou a vestimenta da caçadora. Acoplada a ela, na altura do peito, como que bordada por linhas invisíveis, viu que brilhava uma carta Cavalo-Marinho. A força mágica do equipamento impedia que o usuário congelasse.

 

- Não se intrometa.

 

- Este objeto pertence ao Glenn. É o passaporte pra vencermos Lagus. Vamos, Tenerife, acorde deste sonho. Sou eu, sua amiga Sayoko Bizen. Não está me reconhecendo?

 

Enervada com a indiferença do bruxo, a caçadora esbofeteou-o.

 

- Acorde, seu idiota!

 

Quando se preparou para golpear a segunda vez, foi bloqueada pelo bruxo. Este cerrou o semblante e deu um passo para trás, posicionando para frente a palma da mão aberta.

 

Foi possível distinguir as veias negras de Tenerife estufando sob a pele, antes que um raio emergisse em direção à caçadora, que se esquivou e por muito pouco não foi atingida. Ouviu-se um estrondo, causado por blocos de pedra caindo da parede ao lado, onde o raio havia causado um rombo enorme.

 

- Por Odin! Que diabos fizeram com você, meu amigo? – exclamou assustada a caçadora. E pensou: “Pelo jeito ele não tem consciência de quem é. Droga! Terei que lutar. Não queria machucá-lo”.

 

Sacou o arco e mirou em algum ponto não letal: a flecha viajou pelo ar, com destino certo. Mas, no meio do caminho, foi consumida por uma espessa barreira de fogo criada pelo super bruxo.

 

“Como pode ser isso... Esta não é uma barreira de fogo comum. Está amplificada muitas vezes. Normalmente não seria capaz de parar uma de minhas flechas”.

 

Enquanto isso, o espadachim, liberto do gelo, recobrava a consciência. Percebendo que uma batalha se desenrolava a poucos passos, correu até os amigos congelados, golpeando os blocos de gelo um a um para libertá-los. Feito isso, arrastou-os para um canto mais seguro.

 

- Fique aí, Glenn. É muito perigoso. Este não é o Tenerife que conhecemos. Foi dominado pelo poder do anti-elemento. Terei que lutar a sério desta vez...

 

“Lutar a sério? Como assim? Ela não estava lutando pra valer?”, surpreendeu-se o espadachim. Mas o cenho carregado da caçadora não deixava dúvidas sobre as suas palavras.

 

O bruxo aproveitou a pequena distração da adversária e invocou nova magia. Quando Glenn olhou novamente para o lado, onde os dois amigos lutavam, reparou que uma estranha forma de energia verde e pegajosa se espalhava sob os pés da caçadora. Parecia um pântano. Aquilo preocupou o espadachim, ao notar que Sayoko estava coom dificuldades para se movimentar.

 

O plano do bruxo foi logo colocado em prática. Não demorou nem um segundo até que nova carga de raios fosse disparada. Desta vez, um deles atingiu em cheio a caçadora, que desapareceu em meio a uma nuvem de fumaça.

 

- Oh, não! Sayoko!

 

O garoto disparou rumo ao local da explosão, mas deteve-se no meio do caminho. No centro da fumaça que se dissipava, uma luz azulada começou a brilhar intensamente, emitindo ondas de energia ao redor.

 

- A-a-aura a-a-azul! – gaguejou – Por isso ela é tão poderosa... Atingiu o nível máximo de um guerreiro!

 

A caçadora, envolta em sua própria luz, avançou alguns passos. Pelas manchas vermelhas de queimaduras pelo corpo, podia-se ver que realmente havia sido atingida. Mas aquilo era nada em comparação ao dano que aquele golpe teria causado a um guerreiro comum, que certamente teria virado pó.

 

Com o olhar fixo no calado e frio oponente, Sayoko esticou novamente seu arco. Numa fração de segundo, Glenn conseguiu ver que tentaria disparar uma flecha de fogo. “Desta vez a barreira não vai funcionar. É fogo contra fogo. Vai passar direto”.

 

A flecha zuniu pelo ar, mas, outra vez, não chegou ao seu destino. Cravou-se em uma sólida barreira de gelo que se formou rapidamente entre ela e Tenerife.

 

Sayoko franziu a testa. “Ele tem muita destreza. Suas magias são conjuradas quase instantaneamente... Mas vamos ver se consegue ser tão rápido quanto eu”.

 

Sacou do alforje outra flecha e disparou tão rápido que desta vez Glenn não conseguiu ver de qual elemento era. Seria uma com a ponta feita de cristal de gelo? Se fosse, não passaria pela barreira de fogo.

 

A barreira de fogo se ergueu novamente, como imaginou o espadachim. No entanto, desta vez, ouviu-se um discreto gemido por detrás das chamas. Quando estas se dissiparam, o espadachim e a caçadora viram o bruxo agachado, com uma mão sobre o peito. Uma flecha que emitia vapores gelados estava cravada na altura do coração.

 

- Ajude-me a segurá-lo, Glenn! Isto não vai detê-lo por muito tempo!

 

Ambos correram em direção ao bruxo. O espadachim chegou primeiro e atingiu-o na cabeça com o escudo. Tenerife tombou desacordado.

 

- Desculpe, não pensei em mais nada...

 

- Está tudo bem. Quando ele recobrar a consciência, vai perceber um galo na cabeça. Prepare-se pra ser xingado uma semana inteira.

 

Glenn não resistiu e perguntou:

 

- Sayoko, como sabia que ele iria conjurar a barreira de fogo desta última vez?

 

- Não sabia. Aliás, não havia como saber. Por isso fiz o mesmo com ele, sacando tão rápido que ele teria que tentar a sorte.

 

- Mas você também arriscou.

 

- Não sou uma caçadora que confia na sorte, como um ferreiro na hora de forjar uma espada rara. Por isso, saquei duas flechas ao mesmo tempo, uma de fogo e outra de gelo.

 

Glenn ficou admirado com a astúcia da caçadora. Constatou que estava realmente diante de uma guerreira de aura azul. Abriu a boca pra fazer outra pergunta, mas foi interrompido:

 

- Está curioso sobre a aura? Depois eu explico. Primeiro, vamos limpar essa bagunça e ajudar nossos amigos.

 

- Ora essa! Esta aura também faz você ler pensamentos?

 

- He, he. Que nada. Essa eu adivinhei pela sua cara de bobo...

 

* * *

 

Deitado em uma grande mesa cirúrgica instalada no laboratório, Tenerife, desacordado, era examinado por Roger. Fios e pequenos tubos conectavam o bruxo a estranhas engenhocas que, por sua vez, estavam ligadas a monitores coloridos, que mostravam complicados gráficos. Um enorme curativo fora feito no lugar onde estava antes a flecha gelada de Sayoko.

 

- Conseguimos retirar a flecha. Por pouco ela não perfurou o coração – informou o velho alquimista.

 

- Ele ficará bom? – quis saber Sayoko.

 

- Do ferimento da flecha, sim. Mas não sei se recuperará a razão, pois a contaminação pelo anti-elemento foi muito forte. Pelo jeito, foram ministradas altas doses, mais do que a mente dele poderia suportar. Por isso apliquei nele um sedativo, para mantê-lo desacordado até descobrirmos como reverter o caso.

 

Sayoko, Glenn e Linda baixaram a cabeça. Roger tornou a falar:

 

- Façamos o seguinte: voltem para a cidade e instalem-se todos em minha casa por um tempo. Preciso de alguns dias para fazer uns testes e também trabalhar na máquina do tempo.

 

- Alguns dias? O que faremos enquanto isso? – perguntou Linda.

 

- Há muitas coisas a se fazer em Juno, minha filha. Que tal a biblioteca?

 

Linda pareceu gostar da idéia. Sayoko encerrou o assunto:

 

- Não se preocupe, senhor Roger. Nós nos viramos. Trabalhe sossegado, que o aguardaremos confiantes.

 

Retornaram em silêncio à casa do alquimista. Foram recebidos por Naninha. Perguntaram por Trevor e a bruxinha disse que ele estava desaparecido desde o dia anterior, pouco depois do ataque ao laboratório. Em seguida, deixou-os à vontade, retirando-se, pois tinha outros afazeres.

 

Uma vez a sós, Linda falou:

 

- Pessoal, desde ontem estou querendo perguntar, mas não tive oportunidade: como Tenerife descobriu onde era o laboratório?

 

- Também pensei nisso – respondeu Sayoko – Desconfio que exista um espião nos Chrono Triggers.

 

- Mas, quem seria?

 

- Não sei, Glenn. Não podemos acusar ninguém sem ter certeza. Mas é melhor ficarmos atentos durante estes dias. Talvez até mudar nosso esconderijo.

 

Linda e Glenn concordaram e, nos dias que se seguiram, enfurnaram-se na biblioteca. Linda se interessou pelos livros de alquimia, enquanto o espadachim encantou-se com as histórias de cavalaria. Sayoko, por sua vez, ocupou-se em encontrar um novo esconderijo. Feito isso, passou a alternar visitas periódicas ao laboratório, para saber do estado de saúde do amigo, com andanças pela cidade, sempre atenta a qualquer novidade.

 

Numa das primeiras andanças, encontrou Angel, Bruninha e Akero, que rondavam a cidade em busca de notícias sobre os amigos. Sayoko os colocou a par de tudo o que acontecera. Angel também contou à caçadora sobre a batalha contra os filhos de Bouty.

 

- Então, há mesmo um traidor... – convenceu-se a caçadora.

 

Combinaram que, já que estavam em muitos, eles se revezariam na tarefa de vigiar discretamente a entrada do laboratório, para impedir que este sofresse novo ataque. Cogitaram em mudá-lo de lugar, mas Roger disse que seria muito arriscado para Tenerife, fora o fato de que não havia muitos lugares adequados para acomodar toda a parafernália.

 

Os dias foram passando sem muitas novidades em relação ao estado de saúde do bruxo. Roger continuava circunspecto, sem falar muito, também trabalhando na máquina do tempo.

 

Em relação ao clima político, a situação, entretanto, estava de mal a pior. Corria o boato de que o Alto Chanceler de Juno havia dito que o recente ataque à cidade havia sido planejado pelo governo de Rune-Midgard. O Rei Tristan III sentiu-se ofendido com a acusação e anunciou que aguardava as desculpas do governo vizinho. O Alto Chanceler retrucou, dizendo que jamais de desculparia por algo que não havia feito, gerando um imbróglio diplomático difícil de resolver.

 

De fato, o boato havia sido plantado por seguidores de Lagus, a mando deste, da mesma forma que a reação de Tristan III tinha um dedo de veneno inoculado pelo sábio negro. Diziam os entendidos em política externa que uma guerra era iminente entre as duas nações.

 

Este era o assunto que dominava a conversa entre os Chrono Triggers numa tarde fria e cinzenta, no esconderijo do grupo, nos arredores de Juno. Havia se passado dois meses desde o incidente no laboratório. Estavam todos reunidos, com exceção de Trevor – que continuava desaparecido – e Naninha, quando Akero apareceu de surpresa, esbaforido.

 

- Pessoal! Acabei de saber. Tristan III declarou guerra à Schwartzvald. Tropas estão marchando pra cá neste momento e, acreditem, não são somente humanos que engrossam essas fileiras.

 

- Como assim, Akero?

 

- Monstros, Angel. Hordas de monstros marcham junto com humanos. Como pode ser isso?

 

- Lagus, é claro. Droga! Que faremos, Sayoko? – perguntou a monja.

 

- Não temos nada contra Schwartzvald, pelo contrário. Nossa luta é contra Lagus. Sinto-me mal em ter que entrar em batalha contra meu próprio país, mas não há outro jeito. Pelo menos até que a máquina do tempo fique pronta.

 

- É, realmente, será difícil ter que enfrentá-los. Tenho muitos conhecidos no exército de Rune-Midgard... Mas, Sayoko tem razão – conformou-se Akero.

 

A caçadora calou-se pensativa por uns instantes e voltou-se para Bruninha:

 

- Bruninha, fez o que lhe pedi? Conseguiu notícias de Ayla e Cacos?

 

- Mandei mensageiros de confiança a Morroc, Prontera e Al De Baran. Mas, até agora, nada.

 

- Que pena. Eles seriam de grande ajuda agora... Espero que estejam bem.

 

Sayoko fez nova pausa, olhando demoradamente para os companheiros reunidos à frente.

 

- É isso aí, pessoal! Chegou a hora de mostrarmos do que somos feitos. Vamos nos preparar para a batalha. Que Odin nos proteja!

 

Apesar de demonstrar segurança em suas palavras, a caçadora sabia que partiam para uma guerra desigual.

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Capítulo 17

 

Os Chrono Triggers se dispersaram, cada um deles preocupado em se preparar o melhor possível para a batalha que se aproximava. Sayoko e Akero foram renovar o estoque de flechas. Angel, em local isolado da casa, buscou refúgio na meditação. Bruninha, com a ajuda de Naninha, foi tentar obter novas notícias sobre Ayla e Cacos.

 

Linda havia terminado de ajeitar suas melhores poções no carrinho e foi ajudar Glenn a vestir sua armadura.

 

- Você parece tão confiante... Não está com medo?

 

- Um pouco, Linda. Mas acredito na força dos nossos amigos.

 

- Você se refere à Sayoko, não é? Afinal, ela atingiu um nível extraordinário. Ela te contou como conseguiu?

 

- Sim. Disse que também não acreditava ser possível chegar tão longe. Segundo ela, foi um conjunto de fatores: os equipamentos certos no lugar certo e muito treinamento.

 

- É verdade que ela ficou desaparecida por alguns anos?

 

- Mais ou menos. Tenerife sempre soube onde ela estava. Treinava em Glast Helm.

 

- Nossa! Mesmo no meu tempo era um lugar perigoso. Dizem que são as ruínas de um antigo reino, muito poderoso, que dominou Rune-Midgard. E que entrou em decadência, até ser destruída por um grande conflito.

 

- Sim. Uma vez Tenerife disse que tinha uma razão muito forte para Sayoko agir assim.

 

- Assim como?

 

- Treinar obsessivamente.

 

- E qual seria este motivo?

 

- Não sei, ele não quis me contar. Disse que não se sentia à vontade, e que era melhor perguntar diretamente pra ela.

 

Ambos se calaram, pensativos, até que a própria Sayoko apareceu.

 

- Vocês dois. Apressem-se. Roger nos convocou para uma reunião urgente.

 

- Legal! Novidades?

 

- É o que eu espero.

 

A caçadora observou o olhar inquiridor da alquimista sobre ela.

 

- Algum problema, Linda? Quer me perguntar alguma coisa?

 

- Não, nada não. Nada importante.

 

Enquanto se dirigiam ao laboratório, Linda observou que Sayoko mantinha um olhar sombrio. E não se agüentou:

 

- Sayoko...

 

A alquimista nem precisou perguntar. A caçadora disparou as palavras, que para Linda teve o mesmo efeito de uma de suas flechas.

 

- Lagus é meu pai.

 

Linda ficou pálida e diminuiu os passos, sem conseguir retrucar, deixando a caçadora ir à frente. Glenn, que vinha atrás, alcançou a amiga e percebeu que algo não estava bem.

 

- O que foi, Linda? Você está passando mal?

 

Ela pegou fôlego antes de responder:

 

- Você não vai acreditar...

 

* * *

 

Sayoko decepcionou-se um pouco ao entrar no laboratório e ver que o amigo bruxo continuava sobre a cama, inconsciente. Sob os olhares de Linda e Glenn, ainda surpresos com a revelação e sem coragem pra dizerem alguma coisa a respeito com os outros, a caçadora acomodou-se a um canto, juntamente aos demais, aguardando as palavras do alquimista.

 

Este veio andando devagar em direção a eles. Quando chegou perto, virou-se para trás, dizendo:

 

- Aproximem-se, amigos.

 

Todos esticaram o pescoço para ver, por sobre os ombros de Roger, quem eram as pessoas que contornavam andando os balcões dispostos no centro do laboratório. Distinguiram Trevor, o arruaceiro, trazendo pelas mãos uma mercenária. Linda não se conteve, deixando escapar ao grupo as suas suspeitas:

 

- É você! O traidor!

 

O arruaceiro estampou na face uma expressão de indignada resignação. Sayoko tentou amenizar as palavras da alquimista:

 

- Por onde esteve? Ficamos preocupados.

 

Antes que Trevor respondesse, o som de passos leves, vindos do fundo do laboratório, chamou a atenção, juntamente com uma voz familiar:

 

- Pode deixar, Trevor, eu explico tudo.

 

Outra mercenária surgiu com um sorriso velado, denunciando ao mais observador o quanto curtia aquele breve momento de aflição que causava em todos. Com um movimento de cabeça, deixou que os longos cabelos mostrassem seu rosto por inteiro.

 

- Ayla!!! – disseram várias vozes ao mesmo tempo.

 

Todos foram cumprimentar a companheira, esquecendo-se, por um momento, do arruaceiro e de sua amiga.

 

- Como você está diferente! – notou Glenn.

 

A roupa justa modelava o corpo atlético da ex-gatuna e deixa parte de suas pernas e braços a mostra, cobertos de pequenas e recentes cicatrizes feitas por algum objeto cortante. Na cintura, destacavam-se duas adagas, penduradas por um cinto de couro e, no rosto, um ar de confiança, próprio dos guerreiros orgulhosos que venceram muitos desafios.

 

- Conte-nos como se tornou uma mercenária – entusiasmou-se Akero.

 

- Adoraria compartilhar minhas experiências recentes com todos vocês, mas temos um assunto mais importante para discutir agora - disse a mercenária, mirando Linda, a única que parecia não compartilhar da empolgação dos companheiros.

 

- Trevor nos deve explicações – adiantou-se a alquimista.

 

- Sim e, como eu disse, explicarei tudo.

 

Ayla respirou fundo, como se, ao encher o pulmão de ar, também enchesse a mente com mil imagens.

 

- Os corredores do templo dos mercenários sempre estão cheios de histórias, nem sempre felizes... São raros os gatunos que não são contaminados pelas sombras que os cercam a todo o tempo naquele lugar. É repleto de gente pérfida e perigosa. Por isso, acho natural ter se tornado um ninho de seguidores de Lagus.

 

A mercenária se sentou no chão.

 

- Se você souber ser discreta o bastante, tem a chance de adquirir muita informação útil. Como uma que consegui do seu interesse, amigo Glenn. Mas, esta, contarei depois...

 

O espadachim ficou imaginando o que poderia ser, mas logo voltou a atenção para o que dizia Ayla.

 

- Um dia ouvi boatos de que haviam trazido pra guilda um prisioneiro. Até aí, sem novidades, porque isso havia se tornado comum nos últimos tempos. É pra lá que Lagus envia aqueles que o contrariam e que, por alguma razão, não podem ser simplesmente assassinados.

 

- Não quero nem imaginar o que fazem com esses pobres coitados...

 

- Pois é, Akero. Há aqueles que têm algum valor vivo, sobretudo se são importantes pra outras pessoas as quais queremos que façam algum favorzinho sujo por nós.

 

Todos olharam imediatamente para a mercenária, ao lado de Trevor.

 

- Você quer dizer que... – murmurou Linda, desconcertada.

 

- Sim. Essa mercenária era o prisioneiro do qual estou falando. Chama-se Marguerite e é a namorada do Trevor. Mas, num primeiro momento, é claro que eu nem fazia idéia disso. Nem a conhecia. Mas ouvi dizer que estava sob o cuidado especial de certo arruaceiro, braço direito de Lagus.

 

- Bouty Hunter – disse Angel.

 

- Aham. O próprio. E isso me interessou muito. Um dia consegui me passar por um dos guardas que tomava conta de Marguerite. Consegui ficar a sós com ela, que me contou por que estava ali. Estava sendo usada para chantagear Trevor, para que ele desse informações sobre vocês.

 

O arruaceiro levantou a cabeça.

 

- Eu sinto muito, pessoal, coloquei a vida de todos em risco, bem como a nossa principal missão... Mas não podia deixar Marguerite nas mãos desses monstros e acabei contando ao Bouty a localização do laboratório.

 

- Não se desculpe, Trevor – disse Linda, baixando os olhos – Sou eu quem peço perdão, por julgá-lo mal. Creio que todos nós teríamos feito o mesmo pela pessoa que amamos...

 

- Linda tem razão – concordou Sayoko – Imagino que depois você tenha ido ao encontro dela, esperando que a libertassem.

 

- Sim, eu fui. Mas, quando cheguei a Prontera, no local combinado, ninguém apareceu. Invadi o castelo a procura de Bouty Hunter, mas fui impedido por um grupo liderado por um arruaceiro chamado Alok, um dos “filhos” do Bouty...

 

- Ainda tem mais desses malucos? – interrompeu Akero. Bruninha deu um cutucão no caçador e fez um sinal para que ele calasse a boca.

 

Trevor respondeu:

 

- Sim. Existem muitos deles. Ouvi dizer que são crianças de rua adotadas pelo Bouty, que os treina para lutar sob as suas ordens.

 

- E o que este tal de Alok disse?

 

- Bem... – murmurou o arruaceiro, reticente – Antes de me darem uma surra e me jogarem quase morto próximo à entrada dos esgotos de Prontera, disseram que eu não veria minha Marguerite... Nunca mais...

 

- São mesmo uns malditos – Ayla cerrou os punhos – Mas, por sorte, eu estava no lugar certo no momento certo. Decidi que deveria fugir com ela o mais rápido possível, para evitar que o laboratório fosse descoberto. Àquela altura, já não tinha mais o que aprender por lá mesmo.

 

Foi fácil passar pelos dois guardas que vigiavam o cativeiro. Nos esgueiramos pelos corredores do QG dos mercenários até alcançar a saída. Mas, eu não contava com outras duas pedras no meu sapato: Wedge e Pete. São dois mercenários que protegem a entrada do templo e que tinham contas a acertar comigo. Passamos por eles sem que nos vissem, mas, assim que foram alertados pelos companheiros, passaram a nos perseguir pelo deserto, com mais uma dezena de soldados.

 

Nossa dificuldade de locomoção era visível, pois Marguerite estava muito debilitada após os dias de cativeiro. Wedge, Pete e o grupo de mercenários nos alcançaram a alguns quilômetros de Morroc. Não havia outra saída a não ser lutar. Paramos e esperamos que eles se aproximassem. Então, pra minha surpresa, apareceu uma ajuda inesperada.

 

Ferraz, o mercenário que me treinou, surgiu ao meu lado. Brevemente revelou que conhecia meus propósitos e que era favorável à nossa causa. Aquilo realmente não me estranhou, porque sempre o achei bem diferente dos demais mercenários que comandavam a guilda.

 

De qualquer forma, a situação ainda era ruim. Dois contra doze. O grupo de mercenários se aproximou e a batalha teve início. Enfrentei Wedge e outros dois, enquanto Ferraz lutava contra o resto.

 

Eu nunca havia visto meu mestre brigar a sério. Só mesmo vendo para crer. Uma velocidade espantosa. Apenas Pete conseguia atingi-lo, já que se esquivava com facilidade dos golpes. Quando, com grande esforço, derrotei meus adversários, corri para ajudá-lo. Logo acabamos com todos.

 

Mas, não houve nem tempo pra comemorar. Ao mirar o horizonte do deserto, vi uma nuvem de poeira que arrefeceu meus ânimos. Outro grupo maior ainda de mercenários e arruaceiros se aproximava. Olhei para trás e vi Margherite, ferida e sem condições de nos ajudar. Ferraz percebeu minha preocupação e ordenou que fugíssemos, pois ele daria um jeito nos inimigos.

 

É claro que tentei argumentar ao contrário. Não podia deixar meu mestre. Queria morrer lutando. Mas ele disse para não me preocupar. Vi então, algo inimaginável: de repente, uma aura azul passou a envolver o seu corpo. Era tanto poder emanando dele que cheguei a imaginar que seria capaz de derrotar sozinho todo o bando. Vocês iriam adorar ver aquilo. O que foi Glenn, porque o riso?

 

- Er... Nada não. Continue... – respondeu o espadachim, olhando de soslaio para Sayoko.

 

- Pois bem. Queria perguntar a ele o que era aquilo, mas senti que era a minha deixa e, junto com Margherite, fugimos pra Morroc. De lá, escapamos para Prontera e, na estalagem, uma pessoa de confiança nos indicou que Trevor estava nos arredores da cidade. Nos encontramos e viemos pra cá.

 

Foi a vez de Sayoko tomar a palavra. Contou a Ayla tudo o que havia acontecido enquanto esteve treinando, inclusive que estavam todos prestes a entrar numa batalha de vida e morte. Neste ponto, Roger interveio:

 

- Antes disso, porém, preciso compartilhar uma novidade com vocês e um plano que passou pela minha cabeça. Sayoko, gostaria de ter Tenerife firme e forte do lado de vocês na batalha?

 

A caçadora sobressaltou-se.

 

- É claro! O senhor descobriu uma cura?

 

- Não exatamente... Mas, que tal uma viagem para o futuro?

 

- O quê!?

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Ah! Aproveitando minha assinatura, pra quem acompanha a historia, talvez seria legal conhecer melhor alguns dos personagens.

 

Da esquerda pra direita ao fundo temos:

 

Junior / Samosuke / Evann / Synnk / Zagar / Thor / Glenn / Tenerife / Cacos / Bouty / Samosuke / Ser Divino / Yokora / Arcan

 

Na fileira da frente:

 

Marle / Linda / RideI / Angel / Ayla / Sayoko / Bruninha / Feita pra voce / Linda Flor

 

E as pequenas Naninha Flor e Shalinha.

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Capítulo 18

 

- Porque viajaríamos para o futuro? Isso é possível? – perguntou Sayoko.

 

- Vou explicar pra vocês a idéia que tive – disse Roger, caminhando pelo laboratório – Não consegui desenvolver a máquina do tempo de forma que ela pudesse nos mandar diretamente ao período em que seria possível impedir Lagus de desenvolver seus poderes.

 

- Mas você não trabalhou nisso juntamente com meu pai?

 

- Sim, Linda. Mas não acompanhei todo o processo. Sem ele, chegamos a um estágio da pesquisa e ficamos estacionados, sem saber o que fazer. É um segredo que se foi junto com o seu brilhante criador...

 

Roger respirou fundo e continuou.

 

- Por isso, resolvemos avançar por outro lado e conseguimos fazer com que o dispositivo proporcionasse viagens ao futuro.

 

- E o que podemos fazer no futuro para ajudar a resolver nosso problema no presente? O que isso tem a ver com Tenerife? – indagou Glenn.

 

- Tem a ver com ele e outras coisas. Paralelamente ao trabalho com o dispositivo do tempo, retomei meus estudos sobre o quinto elemento. Creio que, em mais alguns anos, serei capaz de oferecer a vocês algo que derrotará Lagus de uma vez por todas e ainda curar nosso amigo bruxo.

 

- Entendi – disse Linda – Quer que avancemos no tempo e traga essa cura para o presente.

 

- Isso mesmo. Sei que vamos mexer substancialmente no arranjo temporal, mas é a forma que pensei para tentar evitar muitas mortes e anos de sofrimento sob o poder de Lagus.

 

Akero empertigou-se.

 

- Mas e a batalha que estamos prestes a lutar? Se vencermos tudo estará acabado. Não precisaremos viajar para o futuro.

 

- Não quero ser pessimista, meu amigo, mas as chances que temos são mínimas – reconheceu Ayla.

 

- Mesmo com Sayoko e sua aura azul do nosso lado?

 

- Como assim, Bruninha? Sayoko... Aura azul?

 

Glenn cutucou Ayla, a autora da pergunta, fazendo um sinal positivo com a cabeça. A caçadora, por sua vez, adiantou-se.

 

- Mesmo com cinco Sayokos, mais o pequeno contingente de guerreiros que temos, não haveria como vencer. O máximo que podemos fazer é resistir bastante tempo atrás dos muros da cidade, se tivermos uma boa estratégia. Não vejo muita saída. Senhor Roger, podemos confiar que esta novidade, que ficará pronta somente no futuro, será a salvação?

 

- Sem dúvidas.

 

- Ok. Sendo assim, eu irei.

 

- Mas, Sayoko, não podemos deixar de contar contigo na batalha – alertou Glenn.

 

Um vinco formou-se na testa da caçadora.

 

- Ele tem razão, Sayoko. Além disso, a sua ausência no campo de guerra pode gerar suspeitas. Por isso, eu irei – disse Ayla.

 

Cacos se levantou:

 

- Talvez precise de algum suporte. Vou junto.

 

- Então está decidido. Ayla e Cacos irão. Os demais ficarão para lutar. Mas, senhor Roger, tenho uma dúvida: como iremos viajar se os portais aleatórios da Torre do Relógio estão vigiados?

 

- Esta é outra boa novidade que tinha a dizer pra vocês, Sayoko. Descobrimos que a freqüência desses portais é o que determina o tempo para o qual se vai viajar. Por exemplo, aquele portal em que o Glenn viajou levará para aquela determinada data. Assim, um portal diferente levará para um tempo também diferente, dependendo de sua frequência.

 

- E como saberemos em qual portal entrar para chegar no futuro?

 

- Podemos criar um portal com essa frequência, Ayla, aqui mesmo no laboratório.

 

- Então não é melhor criar um portal que nem aquele em que fui para o passado e derrotar Lagus quando ele era ainda um fracote?

 

- Tentamos fazer isso, Glenn, mas não conseguimos copiar freqüências com exatidão. Corremos o risco de enviar vocês para um lugar no passado bem diferente daquele, o que não ajudaria muito. Quanto ao futuro, como não estamos presos a alguma data específica, não há esse problema.

 

Cacos ficou curioso:

 

- E quantos anos no futuro o senhor vai nos mandar?

 

- Creio que uns dez anos serão suficientes.

 

Neste momento, Naninha Flor entrou correndo no laboratório. Antes que alguém pudesse falar alguma coisa, ela disse, aflita:

 

- Chegaram! Chegaram os monstros feios e os soldados de Rune Midgard!

 

Todos se entreolharam, sentindo que chegara o momento.

 

- Pois bem, pessoal. Vamos lá! Faremos nosso melhor! – motivou a caçadora de aura azul – Ayla e Cacos, vemos vocês no futuro.

 

Ayla acenou com a cabeça e observou os amigos saírem. Respirou fundo e disse:

 

- Ok, Roger. Estamos prontos.

 

- Certo. Venham comigo.

 

Cacos e a mercenária seguiram o pesquisador até uma estranha máquina. Parecia uma balança, o que fez Ayla lembrar-se de Bruninha. Com certeza, se a sacerdotisa estivesse ali, faria alguma piada com o seu peso. Roger ligou a “balança”, digitou algumas coisas em um painel numérico e apertou um botão. Na base, uma espécie de disco começou a girar a toda a velocidade, até dar forma a um portal.

 

O portal se assemelhava a um pequeno redemoinho feito de uma pálida luz azul. A um sinal de Roger, Ayla e Cacos subiram nele, desaparecendo instantaneamente rumo ao futuro.

 

* * *

 

Um vento gélido acordou Ayla. Confusa, buscou reorganizar o pensamento. Ao se dar conta da situação, levantou num salto. Abriu os olhos e se assustou com o que viu. Ao invés do laboratório, havia somente as ruínas do que antes fora um. O teto ausente e as paredes esburacadas permitiram verificar que era noite. Uma noite fria e escura.

 

Andou para fora do antigo laboratório, seguindo o que antes era o caminho para a rua. Subiu as escadas giratórias e viu Cacos sentado um pouco à frente, tentando manter acesa uma fogueira.

 

- O que aconteceu com o nosso futuro, Cacos?

 

O alquimista falou, ainda com os olhos fixos na fraca chama que se debatia ao vento:

 

- Pelo jeito, perdemos a batalha. Veja, só há ruínas e nenhum sinal de vida, Ayla. Andei por aí, a cidade foi totalmente destruída. É um futuro tenebroso.

 

Uma nova rajada de vento fustigou os dois amigos e definitivamente apagou a tímida fogueira de Cacos. A escuridão tomou conta do ambiente. O barulho de passos foi ouvido.

 

- O que é isso, Ayla? Tem alguém vindo na nossa direção.

 

- Não é alguém. São vários alguéns. Escuta esses gemidos. Estou com um mau pressentimento.

 

Cacos pegou uma lanterna no seu carrinho de mercador. Ao lançar para o lado o tênue raio de luz, arregalou os olhos.

 

- Oh, não... Zumbis! Muitos zumbis!

 

Uma horda de mortos-vivos avançava sobre eles. Ayla sondou a área: sem chance de escapatória. A saída era lutar até onde permitiriam as forças. E foi o que fizeram. Com golpes rápidos de seus katares, a mercenária derrubava um a um os adversários. Cacos, por sua vez, se virava com uma adaga de fogo, que parecia funcionar bem contra os zumbis. Mas, apesar de frágeis, eram como moscas na sopa: matava um e outro vinha em seu lugar, tanta era a enorme quantidade deles. Seriam vencidos pelo cansaço.

 

- Droga, Ayla. Que praga desses defuntos – disse o alquimista, suando em bicas, apesar do frio da noite.

 

- Nem me diga. Que falta faz um sacerdote nessas horas pra abençoar minhas armas – respondeu Ayla, resfolegante.

 

Estavam já caindo de exaustão quando ouviram alguém conjurar uma conhecida técnica:

 

- Crux Magnum!

 

Um clarão de energia formou-se entre os mortos-vivos, mandando-os de vez para o plano espiritual e afastando outra centena, assustados. No centro da luz viram a figura de um imponente templário, com ar superior. O elmo refletia a luz do próprio golpe e impedia que reconhecessem o salvador, que, em seguida, caminhou em direção aos estafados amigos.

 

Cacos colocou-se em posição de ataque.

 

- Não, Cacos. É amigo, eu sinto.

 

O alquimista relaxou e aguardou ansioso a aproximação do templário.

 

- He, he, he. Derrotar um zumbi é mole, mas centenas deles somente com magia de área – disse o templário, tirando o elmo e deixando cair sob a testa alguns fios de cabelos verdes.

 

Ayla sorriu.

 

- Glenn! É você! Eu sabia! Nossa, como você cresceu. E tornou-se um templário, que maravilha! – disse, correndo a abraçar o amigo.

 

- Que bom vê-los! Pra vocês foram alguns minutos, mas, para mim, foram anos sem os ver.

 

- Caramba. Está fortão. Vejo que treinou à beça.

 

- É verdade. Esses dez anos fizeram bem a você – emendou Cacos – Onde está o restante dos nossos companheiros?

 

Antes alegre, o cenho do templário fechou-se.

 

- Venham comigo. Explicarei a situação pra vocês durante o caminho.

 

- Caminho pra onde? – quis saber Cacos.

 

Glenn não respondeu e pôs-se a caminhar entre as ruínas de Juno. Contou o que aconteceu há cerca de dez anos, depois que Ayla e Cacos partiram para o futuro. A batalha contra o exército de Lagus fora perdida, quando muitos dos amigos faleceram. Os que não partiram durante a batalha morreram no decorrer dos anos, tentando sem sucesso derrotar o poderoso sábio das trevas.

 

Este último se fortaleceu sem parar e estendeu seus domínios para muitas terras. O desequilíbrio causado pelo uso indiscriminado das forças sobrenaturais, amplificadas pelo antielemento, tornaram os campos inférteis e totalmente infestados de monstros ainda mais poderosos. Até mesmo a luz do sol tornou-se rara, pois era impedida de chegar a terra pelos gases expelidos das erupções vulcânicas. Os sobreviventes viviam em condições subumanas, escondidos em abrigos subterrâneos.

 

Ayla e Cacos seguiam cabisbaixos o velho amigo e reconheciam que o futuro em que estavam era previsível, diante das condições que deixaram o presente.

 

Pararam próximos a uma estreita abertura no chão. O que antigamente era passagem para os esgotos da cidade, era agora entrada para o lugar onde Glenn vivia. Andaram alguns metros seguindo o templário, que parecia seguro dos seus passos. Chegaram a uma porta de ferro improvisada em um buraco na parede, onde Glenn deu três batidas com intervalos de tempo diferentes. Era uma espécie de senha.

 

A porta abriu-se devagar, suficiente para passar uma pessoa de cada vez. Havia luz lá dentro.

 

- Linda, veja quem eu trouxe, enfim, pro jantar!

 

Em um espaço limitado por frias paredes de pedra, uma moça de longos cabelos loiros espremia-se entre uma mesa e uma pia improvisada, onde picava algumas verduras. Ouvindo as palavras do templário, voltou-se aos visitantes, sorrindo:

 

- Enfim mesmo! Há quanto tempo esperávamos vocês chegarem.

 

Abraçaram-se os amigos. Ayla sentiu-se meio estranha, mas se lembrou que o que para ela e Cacos foram minutos, para Linda e Glenn foram dez anos. Ou seria mais?

 

- Linda, porque disse que demoramos? Não se passaram dez anos?

 

- Não exatamente, Ayla. Lembra o que Roger disse? Que a máquina não era precisa? Na verdade, passaram-se 11 anos, 9 meses e 12 dias. Há mais de um ano, portanto, todos os dias, Glenn caminha pelas redondezas do laboratório a procura de vocês.

 

Sentaram-se à mesa para comer. Ayla ficou espantada com a possibilidade de terem verduras frescas num tempo como aquele lá fora. A alquimista explicou:

 

- Roger sabia que o futuro não seria de fartura. Por isso, estocamos sementes e desenvolvemos uma forma de cultivá-las sem terra e com pouca água.

 

- E de onde vem a água? – inquiriu Cacos.

 

- Reciclamos toda a água que utilizamos.

 

- E há mais sobreviventes?

 

- Não por aqui. Somos os únicos. Mas há mais gente ao norte, em Einbech e redondezas. Nos deixamos ficar porque precisávamos esperar por vocês.

 

Ayla percebeu que a conversa tomava o rumo que mais interessava.

 

- Então, Roger não está com vocês?

 

Desta vez foi Glenn quem respondeu:

 

- Roger nos deixou há cerca de cinco anos. Mas, Linda soube dar continuidade às pesquisas.

 

Cacos e Ayla olharam pra ela, esperando a resposta que tanto queriam.

 

- Sim, consegui encontrar uma forma de anular os efeitos do anti-elemento no organismo. E também mais uma coisinha...

 

- Legal! Mostre pra gente! Onde vocês instalaram o laboratório? Percebemos que aquele antigo não existe mais.

 

- É verdade. Quando percebemos que a invasão da cidade era iminente, transferimos para outro lugar. Era preciso ser um local escondido, para evitar qualquer ataque das forças de Lagus.

 

- Ele continua atrás da máquina do tempo, Glenn?

 

- Aham. Desconfia de alguma coisa. Mas nunca aparece diretamente, pois há muitos servos que fazem de tudo por ele, seduzidos por seu poder. Por isso, temos que tomar todo o cuidado possível no caminho para o laboratório.

 

- É longe? – perguntou Cacos.

 

- Não muito. Mas descansemos antes de ir.

 

Cacos e Ayla foram dormir cheios de esperança de, em poucas horas, conquistar um presente melhor.

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  oia, o negocio ta otimo, continue assim q vc ganha uma estrelinha!kkk sempre idolatrei Chrono Trigger, e adoro Rag, junta 2+2=estoria perfeita!, ah, quando o Lavos entra nessa? e o Melchior? adoro aqule veinho! ponha um chefe ai, tipo YakraXII ou Giga-Gaia, sei la, poe como um MVP do Rag se der, mais prifiro um MVP ''customizado''(to muito palpitero?).

"parabens, vc ganhou a medalha Orfeu!"

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Capítulo 19

 

Quando botou a cara pra fora dos subterrâneos da cidade, pelo que antes era um bueiro, Cacos sentiu um calafrio. Depois de dormir por cerca de sete horas, seu corpo precisava de uma manhã cheia de sol para sentir-se revitalizado, mas o que encontrou foi um céu avermelhado e cheio de nuvens escuras. Cabisbaixo, acelerou o passo para não perder de vista os amigos. Glenn ia à frente pelas ruínas de Juno, seguido por Ayla e Linda.

 

Caminharam por cerca de duas horas, quase sempre em silêncio e evitando passagens muito estreitas e escombros. Segundo o templário, era prudente evitar batalhas contra os zumbis que se escondiam nesses lugares.

 

- O som da batalha pode chamar atenção de alguém que deve ser evitado – comentou Glenn antes de saírem – Devemos ter cuidado com o Baphomet, pois esse demônio é agora controlado por Lagus e costuma vasculhar essa área em busca de sobreviventes.

 

- E o que ele faz com quem encontra? – perguntou Cacos.

 

Glenn fez um sinal característico, com o dedo indicador passando horizontalmente próximo ao pescoço. Mas o alquimista não esboçou sinal de medo. Pelo contrário, seus olhinhos brilharam.

 

- Hum... E esse Baphomet não seria um MVP?

 

- Esqueça, Cacos, não temos tempo nem forças pra perder lutando com este demônio – ralhou Ayla.

 

Cacos fez um muxoxo e calou-se contrariado.

 

Chegaram, enfim, aos pés de uma ampla escadaria, com degraus rasos e largos. O templário fez sinal para que esperassem e adiantou-se andando devagar, quase agachado. Parecia ter percebido algum perigo.

 

Depois de um tempo, voltou com o semblante fechado.

 

- Seguinte. Temos um problema.

 

- Oba! Oba! Vamos matar o Baphomet!

 

Ayla interferiu:

 

- Cala a boca, Cacos, deixa o Glenn falar.

 

- Ayla, você está muito nervosa. Quer um suquinho de maracujá?

 

Glenn olhou meio constrangido para os dois amigos. Mas não perdeu o foco:

 

- Essa escadaria dá acesso ao que antes costumava ser a Escola de Magia de Juno. Escondemos o laboratório em uma das salas. Mas observei um movimento estranho na entrada, de uma dezena de baphomets jr.

 

- Droga, Glenn, será que desconfiam de alguma coisa? – preocupou-se Linda.

 

- Talvez. Eles são mais inteligentes que a maioria dos monstros. Ou pode ser somente coincidência.

 

- Devemos tomar cuidado, porque onde tem baphomet jr. tem Baphomet pai por perto... – disse Ayla, olhando feio para Cacos, que deu um sorrisinho maroto.

 

Glenn retomou a palavra:

 

- Seguinte, então. Tenho um plano. Vou chamar a atenção deles e tentar levá-los para longe. Vocês aproveitam e entram no laboratório sem que os monstros os vejam.

 

- Glennzito, não é perigoso todo esse mob em cima de você?

 

O templário piscou um olho e, sem responder, tomou o caminho para o lugar onde estavam os bafinhos, sob o olhar intrigado de Ayla, que havia feito a pergunta.

 

- Fique fria, Ayla. Lembre-se, ele não é mais um espadachinzinho. Dê uma olhada – falou Linda.

 

De onde estavam, a mercenária percebeu, embasbacada, uma brilhante luz azul cobrir, pouco a pouco, todo o corpo do amigo.

 

- Meu Deus, o Glenn... Nunca imaginei...

 

- Os perigos pelos quais ele passou nesse período, mais a morte dos amigos, o tornaram obcecado pelos treinamentos.

 

Ayla franziu a testa e olhou de soslaio para a alquimista, que entendeu a silenciosa pergunta:

 

- Não, Ayla. Somente o Glenn conquistou a aura azul. Eu não tive tempo de treinar tanto. Passei grande parte do tempo dentro do laboratório.

 

Ouviram o assobio, que era o sinal do templário para que avançassem. Subiram correndo os degraus da Escola de Magia, enquanto Glenn lutava com os monstros, ao mesmo tempo em que os atraíam para longe.

 

Ayla ajudou Linda a empurrar uma pesada porta de ferro, que estava escondida sob alguns escombros. Atrás dela estava instalado o laboratório.

 

- Que coisa pesada! Ei, Cacos, dá uma mão aqui.

 

Sem resposta.

 

- Ora, cadê aquele preguiçoso?

 

- Ayla, dê uma olhada lá longe – disse Linda.

 

Viram o alquimista acabando de descer a escadaria, em direção ao Glenn. A mercenária fez menção de ir atrás do companheiro, mas foi impedida.

 

- Deixa, Ayla. Ele estará com o Glenn, não se preocupe.

 

- Pois estou preocupado é com o Glenn, se é que me entende...

 

- Acho que você subestima o Cacos. Deixemos eles pra lá, por enquanto. Venha, preciso que me ajude aqui.

 

Conseguiram, enfim, entreabrir a pesada porta. Tatearam no escuro por algum tempo até que Linda acendeu um velho lampião. Lá estavam todos os antigos objetos do laboratório de Roger. Ayla teve a sensação de que havia visto aquilo tudo ontem. “Sensação nada, foi ontem mesmo...”, pensou. Achou apenas estranho, junto a embolorados livros de alquimia, uma pilha de obras religiosas.

 

A obra que chamava mais a atenção se intitulava: “A força do amor divino”. Havia outra com nome parecido: “A energia da fé”, escrito na capa com letras douradas. Ayla pensou que o sofrimento dos últimos anos havia levado a amiga a buscar conforto na religião.

 

- Vejo que encontrou minha inspiração.

 

- Ah, sim, Linda. A religião ajuda a gente a suportar melhor os momentos de dificuldades.

 

A alquimista deu uma risada.

 

- Ah, ah. É verdade, Ayla. Mas não foi exatamente esse tipo de inspiração que essas obras me ofereceram.

 

Um ponto de interrogação formou-se no rosto da mercenária.

 

- Eu explico – voltou a dizer Linda, desta vez em tom mais sério – Lembra de ouvir Roger falar que o antielemento circula naturalmente dentro do nosso organismo?

 

- Sim, lembro de algo a respeito. E que Lagus aprendeu a controlar a energia gerada pelo antielemento.

 

- Exato. Lembre também que, da mesma forma que essa energia animalizada, também há dentro de cada um de nós um pouco do quinto elemento. É o que chamam de fé, essência ou centelha divina, bastante utilizada por sacerdotes, templários e monges. A diferença é que ela existe em menor quantidade no nosso corpo. Digamos que o antielemento ocupa uns 97% e o quinto elemento uns 3%.

 

Ayla acompanhava o raciocínio da amiga com interesse. Linda continuou:

 

- Isso explica a dificuldade de manipular essa energia. Mas, por outro lado, se considerarmos a força das habilidades de templários, sacerdotes e monges, nos deparamos com um grande potencial que ainda não foi utilizado por ninguém.

 

- É possível aumentar esses 3%?

 

- Boa pergunta, Ayla! É exatamente neste ponto que as pesquisas de meu pai Baltasar empacaram. E Roger também não foi muito além, embora soubesse que o quinto elemento pudesse ser injetado artificialmente na pessoa, da mesma forma que Lagus fez com o antielemento. A diferença é que, com a primeira forma de energia, não havia efeitos colaterais.

 

- Injetar o quinto elemento não fez efeito nas pessoas?

 

- Quase nenhum. Isso porque exigia uma força de vontade bem maior da pessoa para controlá-la. Ao passo que controlar a energia densa do antielemento é mais fácil, naturalmente por existir em maior quantidade em nosso corpo.

 

- E como Roger soube disso?

 

- Ele injetou nele mesmo o quinto elemento e começou a rezar diariamente.

 

- Rezar???

 

- Bem, os religiosos dizem “rezar” ou “orar”, mas preferimos dizer “meditar”.

 

- Como fazem os monges...

 

- Sim, mas em um nível bem mais profundo. No entanto, apesar de ter conseguido algum sucesso, Roger conseguiu apenas uma compreensão limitada do processo.

 

- Como assim, Linda?

 

- Assim como meu pai, Roger era um cientista. A razão estava, para eles, acima de tudo. O conhecimento de todo o processo é importante, assim como o autoconhecimento. Mas, somente dessa forma, jamais poderiam ter ido além...

 

Linda parou de falar por um instante e Ayla sentiu profunda emoção na voz dela.

 

- Você fala como se tivesse descoberto... Vamos, Linda, diga logo!

 

A alquimista pegou fôlego e continuou:

 

- Depois da morte de Roger, Glenn se ofereceu como cobaia e recebeu injeção com uma boa dose do quinto elemento. Mas eu estava cansada, porque, assim como Roger, não percebia nenhum avanço. Até que um dia...

 

“Um dia, acabamos ficando até muito tarde no laboratório. Já era noite quando Glenn e eu pegamos o caminho de volta pra nosso esconderijo. Havíamos passado bastante tempo treinando a mente através da meditação, para tentar encontrar alguma resposta. Talvez por isso tenhamos nos distraído e não percebendo a presença do Baphomet nas imediações.

 

Corremos muito, sem poder voltar pra casa ou para o laboratório, pois havia o risco de os monstros marcarem os lugares onde costumávamos ficar. Num descuido, deixei que os baphomets jr. me pegassem. Quando Glenn viu aquilo, aconteceu o que não esperávamos. Ele ficou transtornado e uma luz branca intensa começou a brotar do coração até envolver todo o corpo.

 

Correu até os bafinhos e precisou de apenas um golpe em cada um para derrotá-los. Assim conseguimos voltar são e salvos para nosso esconderijo. Mais tarde, Glenn me contou que sentiu um calor imenso na altura do peito quando percebeu que poderia me perder pra sempre. A partir daí, toda vez que ele precisava utilizar essa força, bastava firmar a mente neste sentimento”.

 

Ayla imaginou o quanto Glenn poderia ficar poderoso, uma vez que já tinha conquistado a aura azul. E analisou bem a profundidade das palavras de Linda, até que uma lágrima formou-se no canto dos seus olhos.

 

- Qual a palavra certa para explicar isso tudo, Linda?

 

- Essa mesma que você está pensando agora, Ayla: AMOR.

 

A mercenária baixou os olhos e colocou a mão na altura do seu próprio coração.

 

- Com isso conseguiremos deter Lagus?

 

Linda fez que sim com a cabeça.

 

A mercenária tinha vontade de rir e de chorar. Tudo era muito lógico, mas ao mesmo tempo não era. Mas, o que isso importava? Precisava voltar logo e ajudar os amigos a evitar o futuro tenebroso em que eles estavam.

 

Neste instante, ouviram a pesada porta de ferro se abrir. Glenn entrou esbaforido, carregando um desacordado Cacos nas costas.

 

- Acalmem-se, ele teve apenas um ferimento leve na cabeça. Nada que uma poção branca não resolva. Devemos nos preocupar com outra coisa.

 

Um urro maligno vindo do lado de fora fez todos estremecerem de pavor.

 

- Preparem-se para a briga. Papai Baphomet quer nos pegar!

 

(continua...)

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Muita gente vai me trucidar se ler isso, mas eu joguei primeiro CC e só agora estou jogando CT.Não fui da época so SNES(Na verdade fui,mas não tinha CT) e estou zerando agora em emulador.Fazer o que...Enfim, tem meu total apoio, uma das histórias mais bem feitas dentre todos os RPG's misturada com o que para mim é o melhor MMORPG.

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Capítulo 20

 

Na mais nova turma de postulantes à carreira de alquimista, na Escola de Alquimistas de Aldebaran, a carteira mais próxima do professor, na primeiríssima fileira, teve um único dono desde a primeira aula: um simpático e entusiasmado mercador chamado Cacos. Naquele dia, a aula versava sobre monstros da raça “demônio”.

 

- Esta raça contempla vários tipos de monstros, de diferentes propriedades. Os sombrios estão entre os mais perigosos. Para derrotá-los, é essencial equipar-se com armas com carta Poring Noel ou estar acompanhado de um sacerdote com habilidade Aspersio.

 

Como todo bom estudante, Cacos sabia que a habilidade Aspersio batizava a arma do guerreiro com água benta e conferia a propriedade sagrada à arma. Isso aumentava o dano causado aos monstros Sombrios. Também sabia que a carta Poring Noel, acoplada à arma, adicionava 20% no dano causado aos monstros da mesma propriedade.

 

- Não se esqueça da carta Strouf, professor – disse um aluno.

 

- Bem lembrado. Esta carta, se adicionada à arma, adiciona 20% ao dano causado a monstros da raça demônio. Alguém tem alguma pergunta?

 

- Isso tudo aí funciona contra o Baphomet?

 

Ao ouvir aquele nome, os demais estudantes arregalaram os olhos e, assustados, encararam Cacos, o autor da pergunta. O mestre pareceu também sobressaltar-se:

 

- Jamais pronuncie esse nome com tal displicência. Este não é qualquer monstro: é um dos mais fortes e temidos entre os demônios, um MVP. Certamente os equipamentos a que me referi têm efeito contra ele, mas não pense que seria o bastante para derrotá-lo. Reze para ele nunca topar o seu caminho.

 

Por um instante, Cacos analisou mais uma vez a figura do monstro estampada no seu livro didático: meio humano, meio bode, grande chifres, com uma enorme e afiada foice nas mãos. E disse:

 

- Pois se eu encontrar esse bicho na minha frente é ele que vai ter que correr!

 

A turma inteira caiu na gargalhada.

 

- Como você vai fazer isso, seu lesado? Quando ele te vir a sua cabeça vai rolar e você nem vai saber o que te matou – zombou um colega.

 

O mercador ficou calado, mas ninguém imaginava que naquela mente fervilhava o embrião de uma nova habilidade destruidora, ideia que o perseguiu durante todo o curso, até o dia em que deixou a Escola de Alquimistas para se juntar novamente aos Chrono Triggers. A sacerdotisa Bruninha levou-o ao grupo a tempo de fazer-se presente na reunião convocada por Roger, quando Trevor e Ayla reapareceram.

 

Naquele dia, a custo conteve-se para não contar aos amigos o que havia descoberto. Achou que não era o momento. Mas a situação era diferente agora. Era uma batalha de vida ou morte. Quando Linda ministrou-lhe uma eficiente poção branca, que aliviou bastante a dor que sentia na cabeça, levantou-se decidido.

 

Lá fora, o som de repetidos choques de metal contra metal ecoava pela noite sombria. Foice versus escudo. Espada versus foice. O diabólico monstro meio humano e meio bode atacava com fúria o templário Glenn, que se defendia e contra-atacava com força igual. A poucos metros, Ayla lutava contra um grupo de baphomets jr., pequenas réplicas não tão poderosas do pai.

 

A aura azul e a intensa luz que brilhava da altura do peito do antigo espadachim eram o sinal de que este utilizava todas as forças de que dispunha.

 

- Muito estranho... – comentou Linda ao sair do laboratório – Pelos meus cálculos, mesmo sendo poderoso, este monstro não deveria ser páreo para o Glenn.

 

- Linda, aquela névoa negra que envolve o corpo do Baphomet é o que eu estou pensando que é? – disse Cacos.

 

Estava explicado. Até o mais temido dos demônios havia sido vítima das experiências de Lagus. O antielemento injetado em seu corpo tornava o Baphomet mais forte que o normal. “Hora de agir”, pensou Cacos.

 

- Linda, por acaso você teria aí um frasco de ácido e um de terror grego? – perguntou.

 

- Tenho sim. Mas, para que você quer isso? Se for para jogar no monstro, desista. Não vai funcionar.

 

- Sem perguntas. Me dá o que eu pedi e confie em mim.

 

Com perícia, o alquimista começou a misturar o conteúdo dos dois frascos. “Vamos, Cacos, cuidado, tem que ser na proporção certa, senão não vai funcionar”, pensava consigo mesmo. Em poucos segundos, o alquimista tinha o produto final.

 

Correu até onde se desenrolava a luta, sem hesitar. Glenn, esperto, percebeu o movimento atrás dele e recuou quando viu o sorriso malicioso do amigo e um objeto suspeito a ponto de ser arremessado contra o Baphomet.

 

Seguiu-se uma estrondosa explosão. Um cogumelo de fumaça negra subiu em direção aos céus e uma nuvem de poeira cobriu tudo em volta. Até que um vento gelado se encarregou de limpar a paisagem e revelou, sob o enorme escudo do templário, Cacos e Glenn, imóveis e embasbacados de olhos fixos no enorme Baphomet, que ainda estava de pé.

 

- Como isso é possível? - balbuciou Ayla, que havia se protegido debaixo de uma enorme pedra, ao lado de Linda.

 

O bicho, entretanto, permanecia imóvel. Será que estaria armando alguma coisa? Cacos e Glenn juntaram coragem e se aproximaram devagar. Sim! Estava vivo, mas bem machucado.

 

Lentamente, os olhos da criatura se levantaram e se depararam com os dois guerreiros. Não demonstrava a fúria de antes, pelo contrário, parecia aliviado com o destino que lhe coube. Em seguida, deixou cair a enorme foice e desabou no solo.

 

- Agora, sim, mortinho... - disse Cacos.

 

- Que sinistro... Parecia que ele sofria. Veja o semblante dele, está mais sereno...

 

Ayla e Linda se aproximaram.

 

- É verdade, Glenn – comentou a alquimista – Parece que até mesmo no Baphomet o antielemento fez seus estragos...

 

- Ayla, você está bem?

 

- Estou, Glenn. Quando veio a explosão, os baphonets jr. se assustaram e deram no pé.

 

- Ótimo. Agora, vamos ao que interesse. Você e Cacos têm uma viagem a fazer.

 

* * *

 

No presente, a batalha estava para começar. Sayoko, Bruninha, Akero, Trevor, Marguerite, Angel, Naninha Flor e até o ferreiro Alfred se juntaram a centenas de outros guerreiros, recrutados às pressas em Juno e nas redondezas. Todos se reuniram nos portões da cidade.

 

Sayoko trepou no muro mais alto e calibrou seus binóculos. Não fez cara boa.

 

- Está tão ruim assim? - perguntou Akero.

 

- Marchando pra cá, andando na frente, temos alguns milhares de Raydrics e Khalitzburgs, liderados por centenas de Cavaleiros do Abismo. Um grupo enfezado de Grand Orcs vem logo atrás, com Orcs Arqueiros estrategicamente posicionados a certa distância. Depois temos humanos, em grande quantidade também... cavaleiros com lanças, templários, arruaceiros... E, por último, bruxos, bardos, odaliscas, alquimistas...

 

- Então, como diria o Tenerife, tamu fu... E o que são aqueles vultos andando entre eles? - quis saber de novo o caçador, que também havia subido na muralha.

 

A caçadora firmou a vista.

 

- São mercenários. É melhor tomar cuidado para não ser surpreendido por eles quando estiver lá em baixo. Parece que a maioria sabe usar Furtividade. Você sabe, eles têm a fama de atacar pelas costas.

 

- E aqueles caras parados lá em cima, naquele morrão?

 

- Deixa eu dar um zoom aqui... Hum.... Era de se esperar: Bouty Hunter e seus amados filhos.

 

- Só podia ser. Ô vontade de chutar a bunda deles.

 

- Não creio que vamos ter essa chance... - suspirou Bruninha.

 

Vendo o abatimento da amiga, Angel interveio.

 

- Bruninha, cadê a sua fé? - e voltando-se pra todos – Meu povo, onde está a garra de vocês? Tenho certeza que Ayla e Cacos voltarão com alguma solução. Até lá, vamos resistir com todas as forças, vamos brigar, lutar, dar umas voadoras nas fuças desses caras.

 

A injeção de ânimo da monja pareceu surtir algum efeito. De armas em punho, correram para tomar suas posições na grande batalha, um pouco mais confiantes. Sayoko virou-se para Bruninha.

 

- Venha comigo. Tive uma ideia.

 

A sacerdotisa acompanhou a amiga até o ponto de observação mais alto da muralha. A caçadora apontou o dedo para algum lugar no meio do descampado.

 

- Está vendo aquele pequeno morro a alguns metros daqui?

 

Ela acenou que sim com a cabeça.

 

- Pois bem. Antes que o exército de Lagus se aproxime mais ainda, quero que corra sem ser vista e memorize um portal lá. Depois volte pra cá.

 

Não foi difícil pra Bruninha cumprir sua pequena missão.

 

- Ok. Deixe salvo por enquanto. Agora, vamos pra guerra!

 

Antes que Bruninha pudesse pedir qualquer explicação, já estavam alinhados com o modesto exército que teria a intangível missão de defender as muralhas de Juno.

 

Num primeiro momento, os arqueiros e caçadores deveriam entrar em cena. Eles teriam a ajuda de sacerdotes, que deveriam conjurar agilidade e benção, proporcionando mais velocidade para as flechadas e mais destreza; também seriam impulsionados pelos acordes mágicos dos bardos, que garantiriam aumento de vários status.

 

À medida que os Khalitzburgs e Raydrics avançavam em direção aos muros, os arcos se flexionavam mais. Era preciso muito controle para não atirar antes do tempo: as flechas só teriam o efeito desejado se fossem disparadas juntas. Todos estavam devidamente equipados com flechas de prata, pois ambos os monstros temiam a propriedade sagrada.

 

Então veio a deixa. Sayoko gritou “atirem” com toda a força da sua garganta e uma saraivada de feixes vazou o céu, tapando o sol dos inimigos. Sabiam do fim da trajetória quando ouviam o som da ponta de prata perfurando as velhas armaduras dos monstros.

 

A cena se repetiu inúmeras vezes, mas a quantidade de inimigos era gigantesca. As flechas de prata acabaram e foram substituídas pelas normais, o que começou a cansar os arqueiros, que deveriam atirar mais vezes para ter o mesmo efeito.

 

Alguns monstros já conseguiam furar o manto de flechas e chegar próximo ao portão. Era quando Linda se juntava aos demais alquimistas, jogando, de cima dos muros, fogo grego e terror ácido nos invasores. Magos e sábios também faziam o possível, conjurando magias de área próximas ao portão.

 

Havia poucos Raydrics e Khalitzburgs quando o portão se abriu para que uma tropa selecionada de guerreiros, bem equipada e com armas abençoadas pelos sacerdotes, saísse para confrontar os Cavaleiros Abismo que ainda insistiam em liderar os monstros na beira dos muros da cidade.

 

Não foi fácil pará-los. Do alto da muralha, Sayoko e outros caçadores experientes tentavam ajudar, atirando sem errar: não podiam desperdiçar flechas. Ao final, ao mesmo tempo em que ficou aliviada pela vitória da tropa, lamentou algumas baixas inevitáveis. Esperava que a ajuda chegasse a tempo de poupar muitas vidas.

 

- Ayla, Cacos, porque demoram tanto?

 

Já era noite quando, enfim, conseguiram derrotar a linha de frente dos inimigos. Todos estavam extenuados. Mas aquilo era apenas um início de uma longa batalha. Imediatamente os caçadores mais bem colocados e de posse de seus binóculos avisaram que os Orcs rumavam ao encontro deles.

 

Um pouco mais inteligentes, os Grand Orcs, debaixo de seus escudos, protegiam-se melhor das flechas, que já não eram despachadas com a mesma força e sincronia, e tampouco na mesma quantidade. Mas algo deveria ser feito. Liderando um grupo de mercenários e arruaceiros camuflados, Trevor partiu por uma saída secreta de Juno para atacar de surpresa os Orcs Arqueiros que davam cobertura aos Grand Orcs. Um ataque direto seria suicídio.

 

Enquanto Trevor partia, um grupo de ataque de solo aguardava, ansioso, a hora de agir, próximo ao portão principal. Cavaleiros, templários, monges, ferreiros e magos mais experientes engrossavam a massa humana. Entre eles, destoando, havia um espadachim de cabelo verde.

 

- Ei, você, o que está fazendo longe de seu batalhão? – ralhou um enorme cavaleiro do alto do seu peco-peco.

 

Ao perceber o olhar fixo e compenetrado do pequeno guerreiro, porém, desistiu de incomodá-lo. Guerreiro entende guerreiro, e naquela hora o cavaleiro sacou que nada poderia demover o espadachim de estar na frente de batalha, quando deveria estar posicionado bem mais atrás.

 

Nisso, soou uma corneta. Era o sinal de que a missão de Trevor havia sido bem sucedida. Enquanto os pesados portões abriam, Glenn ouviu o burburinho de que muitos arruaceiros e mercenários haviam perdido a vida na missão.

 

Aquilo fez com que um sentimento, misto de raiva e tristeza, o paralisasse por instantes. Mas logo o portão abriu por completo e o vento da madrugada soprou forte, sinalizando ao batalhão que deveria iniciar sua marcha em direção ao campo de batalha. Era difícil caminhar com o monte de pedaços de Khalitzburgs e Raydrics no chão. Alguns jovens noviços tentavam socorrer os feridos da batalha anterior e outros corajosos recolhiam os corpos dos que haviam perdido a vida.

 

O encontro com os Grand Orcs foi brutal. Uma pequena massa humana versus um oceano azulado, devido à cor da pele dos monstros. Infelizmente, nem todos os soldados de Juno traziam consigo uma arma com a propriedade gelo, que era a vulnerabilidade dos Grand Orcs. Nem os sábios haviam conseguido encantar todas com o mesmo elemento, devido à falta de matéria-prima.

 

O tilintar das armas ressoava entre urros e os gritos de batalha dos ferreiros. De longe se viam esferas de energia dos monges sendo arremessadas contra os adversários. O cheiro forte de sangue e suor vez ou outra era suavizado pela névoa gelada que encobria algumas áreas: eram os bruxos que, mais recuados, procuravam ajudar com suas nevascas.

 

Glenn encarava de igual pra igual um dos azulões. Empenhava com perícia um sabre de gelo, presente do amigo Tenerife. Ao seu lado, Angel atacava vários inimigos ao mesmo tempo, deferindo golpes certeiros com seu punho de ferro. Alfred espalhava o terror, ganhando grande vantagem atordoando os orcs com seu Martelo de Thor. De vez em quando Glenn percebia, sem entender o porquê, que ele olhava pra ela e dava uma piscadela.

 

Parecia que a batalha dessa vez seria ganha com relativa facilidade, tal o ímpeto com que os nossos heróis se atiravam contra os adversários. Foi o que Glenn pensou antes de ver, de relance, a poucos metros dele, um ferreiro e um templário tombarem de forma muito estranha. Lutavam com todo o gás e, subitamente, vieram ao chão, se contorcendo em dores.

 

Angel percebeu estranhas correntes de ar passando entre os participantes da batalha.

 

- Cuidado, pessoal, há mercenários e arruaceiros entre nós, utilizando Furtividade! – alertou, solicitando aos sacerdotes que conjurassem Revelação imediatamente, a fim de evitar os ataques surpresa e tocaias dos inimigos.

 

Mas o aviso foi tardio para Glenn. Uma apunhalada certeira afundou-se em seu peito, sem que pudesse fazer algo para impedir.

 

- Santo Deus! – exclamou Angel, que rapidamente correu em direção ao amigo, colocou-o sob seus ombros e saiu em disparada rumo ao interior das muralhas de Juno.

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Capítulo 21

- Algumas dezenas dessas ampolas serão suficientes?

 

- Calculo que sim. Eu estive naquela batalha, lembra-se? Glenn também. Pode confiar.

 

- Mas, Linda, será que vai funcionar mesmo?

 

A alquimista olhou profundamente nos olhos da amiga.

 

- Imagino o que está pensando, Ayla. Duvida se todos os nossos amigos serão capazes de disparar o gatilho para despertar o poder do quinto elemento.

 

Glenn interviu:

 

- Faça aquilo que combinamos. Tenho certeza que conseguirá. Utilize a força que tem escondida aí dentro – interviu Glenn, apontando em direção ao coração da mercenária.

 

- E Tenerife?

 

- Apenas tenha fé. Agora vão.

 

Ayla acomodou-se no espaço onde seria aberto o portal que levaria ela e Cacos para o presente.

 

- Espere! Quase me esqueço de uma coisa.

 

- O que foi, Linda?

 

- Tome isto. Quando chegar ao presente, dê isso a mim mesma.

 

- O quê? Uma poção branca? Não entendi.

 

- Não é uma poção branca comum. Você entenderá quando chegar lá.

 

Dito isso, Glenn ligou a máquina. Rapidamente o vórtice azul se formou a Ayla e Cacos desapareceram.

 

- Será que essa poção vai resolver, Linda?

 

- Com certeza. Essa é bem mais potente que aquela que utilizei 10 anos atrás. Pode deixar que você não vai mais ficar o resto da vida sentindo essa dor que tanto te incomoda.

 

- He, he. Você é demais!

 

- Eu sei, amor, eu sei...

 

* * *

 

Angel corria desesperadamente com um ferido Glenn sobre os ombros. Mas uma massa de inimigos à frente a impedia de movimentar-se com rapidez.

 

Em meio à correria, estava prestes a bater de frente contra um avantajado Grand Orc quando uma flecha certeira zuniu e cravou na cabeça do azulão. Com seus sentidos apurados, captou a direção de onde o tiro havia partido e enxergou Sayoko Bizen camuflada no alto de um monte de terra, como uma verdadeira atiradora de elite.

 

Da sua posição estratégica, ela mirava e acertava os arruaceiros e mercenários que se moviam com rapidez e atacavam de surpresa os guerreiros no campo de batalha. Corria sério risco, caso fosse descoberta, mas foi a melhor maneira que encontrou para tentar fazer alguma diferença naquela batalha desigual.

 

“Como será que ela conseguiu chegar ali?”, pensou Angel. Mas logo voltou sua atenção para o seu objetivo, que era chegar segura no interior da cidade. Foi recebida por Bruninha e Linda.

 

A alquimista sentiu que a situação era grave.

 

- Akero viu... lá... de cima...

 

O espadachim tentou balbuciar qualquer palavra, mas estava para desmaiar. Havia perdido muito sangue.

 

Linda retirou a armadura perfurada do garoto e, com uma adaga, rasgou a camisa ensanguentada.

 

- Deus! Foi muito fundo. Pode ter perfurado o coração. Bruninha, por favor, faça alguma coisa!

 

Comovida, a sacerdotisa concentrou-se. “Cura 10!”, disse, conjurando a magia regenerativa com toda a força que podia. Fez isso várias vezes, mas, em vão. O ferimento não fechava. Estava além das suas forças.

 

- Adaga envenenada! – percebeu, finalmente.

 

Linda desesperou-se:

 

- Glenn, fique com a gente! Aguente firme!

 

O espadachim tentou novamente dizer alguma coisa:

 

- Ay... la...Ca... cos...

 

- Ele está delirando, Bruninha! Droga! Continue tentando!

 

Em lágrimas, agachada junto ao espadachim, Linda viu a sombra da sacerdotisa se mover e dar lugar a outra, também conhecida. E levantou a cabeça.

 

- São... Vocês... Vocês voltaram! Ayla, Cacos!

 

Ayla estendeu a mão para a alquimista.

 

- Rápido, dê-lhe essa poção.

 

Linda não titubeou. Destampou o frasco da beberagem e derramou nos lábios do soldado ferido.

 

- Beba, vamos...

 

Longo minuto se passou. Por fim, o ferimento começou a diminuir, diminuir, até dar lugar a uma pequena cicatriz. Com um sorriso, Glenn agradeceu sorrindo e cerrou os olhos, caindo em sono profundo.

 

- Deu certo! – exultou Linda – Que poção é essa? Parece uma das minhas... Mas é bem mais potente...

 

- Depois eu explico. Por agora, precisamos reunir todos os nossos amigos, temos que conversar.

 

- Impossível, Ayla! Sayoko e Alfred ainda estão no campo de batalha – alguém lembrou.

 

No mesmo instante, uma voz se fez ouvir a pouca distância.

 

- Não mais! Pelo menos por enquanto. Derrotamos os malditos Orcs... Parece que teremos um tempo para recuperar o fôlego.

 

- Sayoko!!!

 

Alguns correram para ver se a caçadora estava bem e saber o que tinha acontecido.

 

- Não me pergunte como, mas conseguimos botá-los pra correr.

 

- Graças à nossa atiradora de elite – disse Alfred – Não fosse isso teríamos caído com o ataque dos mercenários e arruaceiros.

 

Angel tomou palavra:

 

- Ayla, acho que não teremos tempo para uma reunião. Lagus deve estar pronto para novo ataque. Pode ser a qualquer momento. Se vierem pra cima de nós agora, não teremos chances. Estamos exaustos e perdemos muitos soldados...

 

Sayoko complementou:

 

- Eles sabem disso e acho que era o plano desde o início. Não queriam sujar as mãos, aqueles manés. Acho que, neste momento, estão tendo seu momento de satisfação sádica, dando um tempo para saborearem nosso desespero perante a derrota iminente. Mas nós temos uma carta na manga, certo, Ayla?

 

A mercenária não perdeu tempo e falou o que todos queriam ouvir:

 

- Temos sim! Rápido, vamos todos para o laboratório.

 

* * *

 

Sem dizer uma palavra, Ayla cruzou a porta do laboratório e, perante o olhar de todos, dirigiu-se até o biombo onde Roger mantinha Tenerife em observação. Deitado sobre uma cama, desacordado, o bruxo tinha o cenho carregado, como se estivesse em meio a um grande pesadelo.

 

A um sinal da mercenária, Cacos se aproximou e retirou uma ampola de vidro de dentro do seu carrinho. No interior do pequeno receptáculo, um líquido vaporoso brilhante chamava a atenção dos espectadores.

 

Roger entendeu o que se passava. Pegou uma seringa e injetou o conteúdo do frasco sob a pele do bruxo. A essa altura, todos os Chrono Triggers presentes também estavam próximos, se acotovelando para ver o que ia acontecer.

 

Segundos se passaram até que uma verdadeira transformação teve início. As veias saltadas e escuras que se viam na pele do bruxo desapareceram, voltando ao normal. O rosto vincado e a expressão de sofrimento deram lugar a um tranquilo sorriso de satisfação.

 

Não demorou muito para Tenerife abrir os olhos e perceber que era o centro das atenções.

 

- Ah, cambada! Vocês estão péssimos! Cansados e sujos. Mas agora eu estou aqui, pronto pra ser o bruxo que vai fazer a diferença contra esse Lagus e seus malucos.

 

Alguém tentou balbuciar uma explicação sobre o que estava acontecendo.

 

- Não precisa. Eu vi tudo em meus pesadelos... – disse o bruxo.

 

E voltando-se para Ayla:

 

- Obrigado por acreditar em mim. Não vou decepcionar.

 

- E o que acontece agora? – inquiriu Akero, sempre impaciente.

 

Cacos tirou mais ampolas do carrinho e entregou-as a Roger. Todos fizeram fila para receber a “vacina”, inclusive alguns guerreiros mais preparados selecionados por Sayoko, que faziam parte da guarda especial de Juno.

 

- Não estou me sentindo mais forte...

 

- Não é simples assim, Akero.

 

E Ayla, aproveitando que Linda estava ausente, pois velava Glenn, que se recuperava do trauma sofrido, contou aos companheiros, em breves palavras, como o espadachim havia despertado o poder do quinto elemento no futuro.

 

- E como vamos fazer isso?

 

Ayla apontou para o coração do caçador.

 

- Isso é meio constrangedor...

 

- Akero, na hora certa você vai saber liberar todo esse amor que tem dentro de você – brincou Angel, dando um tapinha nas costas do amigo.

 

O caçador ficou um pouco sem graça, mas nada que o impedisse de apertar o passo para correr em direção aos amigos, que haviam deixado o laboratório. Era hora da batalha final.

 

 

* * *

 

Um portal se abriu na sala do trono do castelo de Prontera e dele saiu um empertigado arruaceiro. Resolutivamente, moveu-se em direção ao seu objetivo. Refestelado no trono, definitivamente usurpado do rei Tristan III, Lagus recebeu o visitante com enfado.

 

- Aguardo ordem para a invasão de Juno – disse o Bouty Hunter, pois era ele o arruaceiro.

 

- Ah, ah, ah! Imagino que a esta hora todos devem estar desesperados dentro daquelas muralhas. Esperando a morte, o fim iminente.

 

- Senhor, não era melhor dar logo o golpe final? Sei lá, tenho a impressão de que se dermos muito tempo eles podem preparar algo contra nós.

 

- Não seja tolo! – esbravejou o maquiavélico vilão – Acabei com todas as chances que eles tinham ao tomar posse daquela ridícula máquina do tempo.

 

Lagus, com sua enorme prepotência e cego diante do enorme poder que dominava, não poderia vislumbrar que uma pequena esperança dos heróis que lhe faziam resistência estava prestes a se tornar realidade.

 

Bouty, que não tinha nada de bobo, havia percebido há algum tempo que algo estava errado com o patrão. Por isso, questionava interiormente as ordens que recebia. Mas, enquanto fosse conveniente para ele, obedecia. No íntimo, planejava como poderia tirar vantagem da situação na hora certa.

 

- Irei pessoalmente e assistirei tudo de camarote – decidiu, por fim, o vilão.

 

E abrindo um portal, Lagus posicionou-se no meio do cilindro de luz, seguido pelo seu capanga.

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Capítulo 22Enquanto mais uma vez todos se preparavam para a batalha, Sayoko conversava com Tenerife em um lugar reservado.

 

- Tene, você não pode ir a esta batalha.

 

- O quê? Tá doidona? Você acha que vou perder a chance dar um bom peteleco na “oreia” desse tal de Lagus, depois que ele cair derrotado?

 

- Entendo seu sentimento, mas preciso de alguém para liderar a tropa que deverá proteger o castelo. Enquanto isso, alguns de nós tentarão chegar até os líderes inimigos. Quanto mais cedo terminar essa batalha, menos mortes ocorrerão.

 

Por um momento, o bruxo, sentindo sob os ombros o peso da responsabilidade, baixou a cabeça e ficou sem saber o que responder.

 

- Só você saberá fazer isso, levantar o moral dos combatentes, fazê-los perceber a importância do momento...

 

Após um angustiante silêncio, o imprevisível bruxo abriu um largo sorriso.

 

- Já entendi sua intenção, Sayoko. Muito esperto da sua parte. Quer evocar os sentimentos, fazer despertar o poder do quinto elemento em cada um deles. Pois bem, me convenceu. Missão aceita.

 

- Legal, tenho certeza que conseguirá!

 

E, ao mesmo tempo em que Sayoko se juntava à Ayla, Akero, Bruninha, Cacos e Angel, rumo à missão a que estavam destinados, Tenerife, resoluto, dirigia-se à tropa que já estava perfilada.

 

Já era noite. Nuvens esparsas deixavam a luz do luar chegar até a terra, iluminando de forma dramática o local onde o bruxo escolheu parar, à frente dos cerca de duzentos companheiros, das mais variadas classes de guerreiros: cavaleiros e templários, monges e sacerdotes, caçadores, bardos e odaliscas, bruxos e sábios, ferreiros e alquimistas.

 

Respirações lentas e olhares compenetrados: todos compreendiam a gravidade do momento. Tenerife hesitou. Pensou que seria mais fácil. Havia elaborado na mente todo o esquema de um discurso, desde que se despediu de Sayoko, mas, de repente, a mente havia ficado vazia.

 

Engoliu um restinho de saliva que tinha na boca seca:

 

- Ah, bosta, o jeito é falar de improviso mesmo. Seja o que Deus quiser!

 

Pigarreou e soltou o vozeirão:

 

“Bravos guerreiros e guerreiras! Amigos e amigas de Juno! Eu sou Tenerife, ex-vice-líder dos Angueroules, orgulhoso membro dos Chrono Triggers. Fui designado para comandá-los nesta última batalha contra Lagus.

 

Quando Sayoko Bizen me designou para estar aqui com vocês, uma euforia enorme tomou conta de mim. Sempre quis ser líder de um batalhão como esse, tão seleto, cheio de corajosas pessoas prontas a arriscar a vida em defesa do seu país e da sua terra, da sua família, dos seus amigos.

 

Sim, pois é esta a razão pela qual estamos aqui hoje. Até entendo que um maluco possa resolver injetar em si mesmo uma merda de uma meleca preta na veia atrás de mais poder. Afinal, quem não quer ser mais poderoso? Eu queria ser um maluco cabuloso, forte à beça, tocar o terror, no bom sentido, vencer monstros poderosos, ficar milionário.

 

Mas, eu disse “mas”, jamais passaria em cima de ninguém pra conseguir isso. Não destruiria o lar de pessoas inocentes, que deram tão duro pra construí-lo. Não zoaria com o planeta, fazendo monstros enlouquecerem e impedirem as pessoas de cultivarem suas terras, de alimentarem suas famílias.

 

Não separaria pais de filhos, filhos de pais, mestres de alunos. Não tornaria amigos em inimigos. Não permitiria que meu filho se voltasse contra o próprio pai. Não separaria pessoas que se amassem. Não colocaria conterrâneos para lutar contra conterrâneos, não colocaria vizinhos contra vizinhos”.

 

À medida que o eloquente bruxo discursava, uma intensa luz imergia do seu coração. Como Sayoko previu, o quinto elemento despertava em Tenerife, guiado por forte emoção.

 

“Como sabem, neste momento, meus melhores amigos, também amigos de alguns de vocês, vão desafiar Lagus diretamente, para que tenhamos uma mínima chance de vitória. Na minha mente vejo Sayoko Bizen séria correndo à frente do grupo, sempre intrépida e determinada. Ayla em seguida, corajosa e confiante, transmitindo segurança aos demais, junto com o Cacos, otimista e perspicaz.

 

Akero certamente contando algum caso engraçado, pra aliviar a tensão, mas nem por isso menos compromissado. Bruninha decidida, pronta a ajudar, simplesmente pelo gosto de ajudar, e Angel serena, motivando os demais com uma das suas palavras de desinteressada sabedoria.

 

E isso sem falar no Glenn, quanta nobreza de coração, que tinha tudo pra odiar Lagus, pois perdeu os pais e o mestre nessa guerra estúpida, mas não sente um pingo de ódio que não seja da boca pra fora”.

 

Pontos de luz branca começaram a pipocar na multidão de guerreiros, estimulados pela emoção evidenciada na voz do bruxo, que, inflamado, expelia palavras vindas direto do coração.

 

“Pois é. Ódio... Falando tudo isso pra vocês eu percebi que apesar de tudo eles não têm ódio no coração. Estranho, não é? São nossas vidas e de nossas famílias em jogo. Nada mais natural ter raiva de quem nos coloca nessa desesperada situação.

 

Não estou dizendo que Lagus não deve pagar pelos seus crimes. Queremos nossa vida de volta. Nossa luta é justa, porque o diálogo não é possível. Vamos acabar com essa putaria que ele anda fazendo, mas sem revanchismo.

 

Vamos lutar não movidos pelo ódio, mas porque é nosso direito lutar pelo direito de amar nossa família, nossos amigos, nosso lar, nossa terra, de viver em paz!”.

 

Era evidente que o inflamado discurso havia mexido com os sentimentos de toda a tropa, agora definitivamente coberta por uma aura branqueada e reluzente. Alguns grupos gritavam o nome de Tenerife.

 

“Caracas, vou me candidatar a presidente!”, pensou por um momento, para logo em seguida fazer a convocação final.

 

- É chegada a hora de saber do que somos feitos. Pra guerra, cambada!!! – emendou o bruxo, que, eufórico, seguia à frente, guiando os demais em direção aos portões da cidade.

 

 

* * *

 

Enquanto isso, os demais tentavam colocar em prática um ousado plano. Esperavam que o maquiavélico sábio enviasse praticamente todo o seu exército pra esmagar Juno, deixando desguarnecida a base que havia sido construída nas proximidades da cidade.

 

A possibilidade de bater de frente com o numeroso exército inimigo durante a ida era praticamente certa. Mas tinham uma chance de passar despercebidos. Esperavam que Tenerife cumprisse sua dupla missão: ao mesmo tempo em que deveria segurar a trupe de Lagus, tentaria causar o maior barulho possível durante a briga, a fim de desconcentrar os sacerdotes e bruxos do outro lado.

 

Desta forma, teriam dificuldade para invocar magias, principalmente Revelação e Chama Reveladora, que permitiam enxergar oponentes escondidos. Era a única chance de tinham. Recolheram em Juno todas as capas que continham a carta Frilldora acopladas. Com essas capas equipadas, conseguiriam utilizar a habilidade “furtividade”, como os mercenários, se movendo enquanto estivessem invisíveis.

 

Assim fizeram. Munidos de suas capas passaram próximos aos guerreiros inimigos. O som que se ouvia ao longe, e cada vez mais perto, era o de uma estranha cantoria, um coro uníssono de retumbantes vozes.

 

- Arrá, urrú, Lagus vou comer seu bolo!!!

 

- Um, dois, três, quatro, cinco, mil, queremos que o Lagus vá pra puta que pariu!

 

- Olê, olê, olê, Lagus, cê vai morrer! Olé, olé, olá, Lagus, vou te quebrar!

 

Ao mesmo tempo a tropa de Tenerife, pois era ela a responsável pelo barulho, pisava forte no chão, batia palmas, urrava e gargalhava. Parecia um bando de loucos.

 

Enquanto estava camuflada e silenciosamente passava rente aos inimigos, Ayla observava diferentes reações. Uns falavam mal, outros até mesmo riam debochadamente, sem meio termo. O fato é que todos se distraíram e não puderam perceber que guerreiros ocultos se esgueiravam por ali. A mercenária ficou pensando se aquilo não era um efeito do anti-elemento, que exacerbava os sentimentos mais vis.

 

Quando se sentiram seguros, retiraram as capas de camuflagem. Agora ouviam ao longe os sons de uma verdadeira batalha, de espadas contra escudos, de flechas zunindo, gritos de dor e de magias sendo conjuradas.

 

Seguiram em frente e alcançaram o pé de um paredão natural de pedra, que separava dois planos do terreno, um mais baixo, onde estavam, e outro mais elevado. No mais alto, esperavam encontrar Lagus e seus guarda-costas. Havia pessoas reunidas, cem metros à frente, e nenhuma delas parecia ser o vilão. Reconheceram Bouty e seus “filhos”, atentos à batalha que ocorria na planície abaixo deles, que se entendia até os muros de Juno.

 

Rapidamente definiram a estratégia de ataque. Bruninha distribuiu todos os “buffs” a que tinham direito: Aumentar Agilidade, Benção, Angelus, Glória, Kirie Eleyson e outros. Cacos distribuiu suas melhores poções.

 

Movendo-se como um fantasma, Angel aproximou-se do grupo de inimigos, formado, além de Bouty, pelo monge Evann, pelo cavaleiro Synk e pelo arruaceiro Alok. Antes que fosse vista por eles, a monja disparou quatro esferas espirituais, uma para cada um, que foram pegos de surpresa.

 

- O que foi isso? De onde vieram essas esferas? – perguntaram-se.

 

- Estamos sob ataque, seus bestas! – bradou Bouty Hunter, o primeiro a perceber o que estava acontecendo.

 

Mas antes que os filhos de Bouty pudessem se colocar em posição de defesa, uma saraivada de violentos disparos de flechas, originadas dos arcos de Sayoko e Akero, os atingiram. A força do impacto jogou os guerreiros atingidos para diferentes pontos do descampado onde se dava a batalha.

 

- Pronto, galera! Agora, cada um pega o seu!

 

Ayla foi pra cima de Bouty, Akero de Synk, Angel de Evann e Cacos de Alok. Bruninha à distância, ficou pronta para intervir no suporte aos amigos se precisassem. Sayoko foi em busca de Lagus.

 

- Então, sua lombriga loira! Você quer um mano a mana? Quer apanhar de novo, que nem na última vez? Você quem sabe! Mas hoje não estou de brincadeira! – disse Bouty, provocando a adversária.

 

- Você fala demais, moço! – retrucou Ayla, posicionando seus braços à frente, de onde reluziam, nas pontas, afiados katares.

 

- Essa será a batalha final! - gritou Bouty, ao mesmo tempo em que partia pra cima da mercenária, a toda a velocidade.

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Ola Maxim, dando uma relaxada do up do meu shura, achei seu fanfict e, gostei muito do desenrolar da história.Como alguem que gosta muito da "arte de contar histórias" e tambem que curti os games classicos como crono trigger, espero q vc ainda estreja na ativa no rag, apesar do desanimo q da acompanhar o nosso rag nos dias de hoje.Eu tenho a dizer que uma boa história tem começo, meio e fim.Espero que voçe de o fim merecido que a sua saga pois, seria uma pena ver uma bela historia como essa sem o final.

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Ressucitando o topico hehe (tomara que ressucite mesmo!)

Ai Glenn, cara primeiramente meus parabens! Voce escreve muito bem! Esta historia prendeu minha atencao desde o comeco.Assim como muitos outros aqui, tenho certeza, estou na esperanca de voce terminar esta historia incrivel, pois sei que tens muito a contar ainda.Bom, eh isso, espero que renove as vontades de continuar a cronica, pois sera uma pena nao haver um fim para ela...Abracos

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