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O Mundo Visto Através de Olhos Vermelhos


Toph

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Serial, a gente não sabe nada dos teus olhos. Tu nunca tirou aquela máscara. Fala sério, tu toma banho com aquilo??? Deve estar um belo bronzeado no teu rosto.P.S.: Valeu por lembrar! Tava mesmo a fim de ameaçar alguém, mas não conseguia me decidir. Valeu mesmo! 

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Bah! Medo da Tenko? Nem. Não aceito desafio de mulheres. Não por medo, mas por respeito. Tenho meus princípios, apesar de ser um Desordeiro malaco. Além do mais, eu tb manipulo venenos, esqueceu? Também sei atacar de longe e o meu Composto Cabal Quad é meu companheiro de sempre, viu? Só troco ele quando tenho a companhia de um suporte muito eficiente, como o Kyrie ou o Dynamo pra apanhar por mim. [/mal]

 

 

 

Tomar banho? O que é isso? Como se faz? Cara, eu DURMO com a minha máscara. E você acha que mormaço não queima Pd? Você realmente é de morroc?

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CAPÍTULO 20 - TRAIÇÃO SOB O LUAR 

 

 

 

 

Faltavam algumas horas

para o Sol se pôr. Tenko Kitsune checou o céu e anotou o fato mentalmente. Encaminhou-se

para o pequeno cais improvisado da Ilha das Tartarugas, atravessando a floresta

com incrível facilidade. Desviava de hordas de lavadeiras sem ao menos virar o

pescoço para enxergá-las, e saltava por cima de sapos de thara e pestes,

chutando de tempos em tempos uma ou outra mais atrevida que ousava abocanhar

seu tornozelo. Aproveitava o impulso da corrida para apoiar as mãos no casco

das tartarugas que passeavam pachorrentamente entre as árvores e saltar por

cima delas. Em pouco menos de um quarto de hora a assassina estava sentada na

parte de trás do bote de Gotanblue, saboreando a brisa do mar.

 

 

Ela estava mudada. Nos

últimos meses o corpo de Tenko estava visivelmente mais forte. Quando a

assassina se movia era possível ver seus tendões e músculos se contraindo sob

sua pele. Estava ainda mais imponente, e sua aparência e postura lembravam uma

pantera adulta. O quadril estreito e os seios comprimidos por faixas lhe davam

uma aparência levemente andrógina, e os cabelos soltos ao vento lhe davam um toque

extremamente feminino. Mas a mudança mais surpreendente estava nos cantos

repuxados de sua boca carnuda e rosada. A pantera sorria. Tenko Kitsune estava

visivelmente feliz.

 

Desceu do barco. O Sol já

estava começando a mergulhar no horizonte. Tenko jogou por cima dos ombros sua

velha e longa capa cinzenta. Seu fiel Manteau de Loki, excelente para fugas e

camuflagens. O manto tinha cor de sombra e se mesclava com qualquer tom de

escuridão. Já a havia salvado dezenas de vezes, e Tenko apostava que ainda a salvaria

dezenas mais. Principalmente nestes tempos atuais. Seu eterno inimigo, Sir Secousse

Primus, parecia estar realmente disposto a capturá-la. Seus encontros com

soldados estavam cada vez mais freqüentes, e suas lâminas haviam se tingido de

sangue humano mais vezes do que ela podia contar. Será que o cavaleiro

realmente acreditava que aqueles jovens guerreiros mal-treinados teriam alguma

chance contra ela, uma assassina experiente? Quantas vidas mais Primus estaria

disposto a sacrificar para satisfazer seus caprichos? Talvez ele a estivesse

testando. Esperando que ela tivesse piedade e deixasse os jovens soldados

viverem. Se fosse essa a intenção de Primus, ela seria frustrada. Tenko não

deixaria o inimigo viver para depois delatar sua localização.

 

 

Nariz e boca ocultos

pelas dobras da capa, olhos escondidos sob a sombra de um velho e desgastado

sakkat, a assassina rapidamente se esgueirou pelas sombras compridas do fim de

tarde. Andava junto às paredes e seus passos eram silenciosos. Subiu a avenida

principal da cidade de Alberta, em direção ao portão norte. Viu os soldados de

túnica negra, carregando espadas rústicas e escudos frágeis com o emblema da

cobra envolvendo a espada. O emblema da Casa Primus. Eles estavam por toda

parte, montando guarda em todas as portas e janelas de todas as estalagens da

cidade. Tenko passou tranqüilamente por trás de um deles. O soldado não se

moveu. Um movimento rápido da mão da assassina e o jovem teria um palmo e meio

de aço cravado entre as costelas. Tenko sentiu pena do despreparo do jovem, e

desejou que ele jamais a encontrasse. Ela era uma Assassina da Guilda do

Deserto de Sograt, não uma matadora sanguinária. Ao contrário do que diz o

senso comum, há uma grande diferença.

 

 

Atravessou os portões da

cidade e atingiu o trecho tranqüilo de floresta que circundava a cidade. Agora

ela não seria capturada facilmente. Os soldados de Primus, como todo garoto

pronterano criado em um castelo sem nunca botar o nariz para fora, eram

supersticiosos e não costumavam se atrever a entrar na floresta à noite. Tenko

não. A floresta noturna é o refúgio da pantera. Nesses últimos meses, a

assassina havia feito daquele trecho de mata sua casa, dormindo nas copas das

árvores e se alimentando do que pudesse encontrar. Pássaros, castanhas, frutos,

roedores. Ficaria um pouco mais complicado quando chegasse o inverno, mas

contava com a ajuda de Kuroi e Sethit, sem falar de Freya, que continuava

mantendo contato apesar do fim do relacionamento. De qualquer modo, a

perseguição estava se tornando desgastante. Mas Tenko Kitsune tinha algo que

mantinha o sorriso em seus lábios. Algo especial e querido.

 

 

Correu pela floresta até

chegar aos pés de uma grande árvore escondida no meio de muito mato, fora da

rota habitual. Farejou o ar por algum tempo. Confirmado que estava no lugar

certo, Tenko bateu no tronco da árvore com os nós dos dedos. Algo se deslocou

da copa frondosa para um dos galhos. A criatura saltou para o chão, pousando

com precisão surpreendente e quase nenhum ruído. Tenko se abaixou, ocultando-se

sob os arbustos, e tomou a criatura nos braços. Era uma mulher de esplêndidos

olhos verdes e longos cabelos prateados presos em uma trança. Tinha um casaco

comprido e vermelho, e um gládio pendurado na cintura. Uma ladina. Sua ladina.

Sua preciosa e amada Nhyx. Tenko puxou a ladina para perto de si com um

dos braços enquanto abaixava com a outra mão a dobra da capa que cobria sua

boca. Nhyx a beijou rapidamente. Ainda estavam muito perto da rota popular.

 

 

- Está com fome? -,

sussurrou a ladina.

 

 

- Um pouco -, respondeu

Tenko no mesmo tom. – E preciso de um banho.

 

 

- Eu também. Vamos até

aquele lago no fundo da floresta, enquanto ainda tem Sol. Aí dá pra gente

conversar direito.

 

 

Tenko assentiu com a

cabeça. Puxou de volta a dobra do manteau para cima do nariz. Nhyx jogou seu

próprio manteau, também cinzento e opaco, sobre os ombros. Correram em meio aos

arbustos, em direção à floresta fechada. Fora da rota dos viajantes e soldados

poderiam conversar tranqüilamente.

 

 

O lago em questão era um

bolsão de água que vinha de um riacho que cortava a floresta de Payon e corria

para o mar. Era um lugar calmo, uma pequena clareira rodeada de árvores. O Sol

agora era um grande disco alaranjado mergulhado no horizonte. O céu estava

dourado e púrpura, e se refletia nas águas calmas do pequeno lago. Tenko

rapidamente se livrou dos trajes encardidos e da armadura e mergulhou na água.

Emergiu sacudindo a cabeça e espalhando respingos.

 

 

- Está gelada! -, ganiu a

assassina. Nhyx riu, jogando o casaco e o elmo por cima da indumentária de

Tenko. Saltou na água e começou a desembaraçar os cabelos com os dedos. Tenko

empurrou a água com a palma da mão, formando uma pequena onda, que atingiu o

rosto da ladina. Nhyx levantou uma sobrancelha, desafiadora. A assassina

respondeu com outro jato d’água. Nhyx atingiu a superfície do lago com força,

empurrando uma quantidade considerável de água para cima da assassina.

 

 

- Assim não vale! Você

apela! E essa água está muito fria!

 

 

- Você que começou! -,

retrucou a ladina, rindo. Em seguida abraçou Tenko carinhosamente e sussurrou

em seu ouvido:

 

 

- Não se preocupe, eu te

aqueço!

 

 

----------------------------------------------------------------

 

 

Tenko considerou que

aquela era uma noite especialmente bonita. A Lua estava cheia e clara, um

imenso disco prateado flutuando acima de sua cabeça. A assassina tinha a

impressão de poder tocá-la. Milhares de estrelas pontilhavam o manto negro da

noite, recortado pelas copas frondosas das grandes e antigas árvores de troncos

grossos e nodosos que circundavam a pequena clareira e o lago onde Tenko havia

se banhado pouco tempo atrás. Um leve cheiro de carne assada ainda preenchia o

ar, único indício do jantar das duas gatunas. A fogueira e os ossos haviam sido

enterrados. Era importante não deixar vestígios de sua presença.

 

 

Agora a assassina estava

sentada, costas apoiadas em uma das árvores, mascando tranqüilamente o talo de

uma folha de grama. Sentada entre suas pernas estava Nhyx, que admirava a Lua em silêncio. Tenko

passava os dedos gentilmente pelos longos cabelos ainda úmidos da ladina,

desembaraçando-os com cuidado. Separou os fios prateados em três mechas de

tamanho mais ou menos igual e começou a trançá-las delicadamente, mas com

firmeza. Trançou o cabelo inteiro e então estendeu a mão e alcançou a presilha

metálica que Nhyx costumava usar. Afixou a presilha no fim da trança, deixando

um pequeno tufo de cabelo solto na ponta. Abraçou a ladina em seguida e

a puxou para perto de si.

 

 

- Ficou boa?

 

 

Nhyx puxou a longa trança

por cima o ombro e fingiu que a avaliava severamente. Sorriu e beijou os lábios

da assassina.

 

 

- Ficou sim. Você está

começando a aprender! -, disse, e se aninhou junto a Tenko, apoiando a cabeça

em seu peito. Tenko a abraçou e beijou sua testa, suas orelhas e seu pescoço.

Sorria como uma criança quando a ladina estava por perto. Permaneceram assim

por algum tempo, sem dizer uma palavra, como se suas vozes fossem profanar

aquele momento tão belo.

 

 

Às vezes pensamentos

indesejados surgiam na mente de Tenko, como uma súbita neblina que ofusca a luz

do Sol. Amava Nhyx, tinha certeza disso. Mas Nhyx ainda amava aquela pequena

assassina de cabelos castanhos. Ou não amava mais? Abraçou a ladina com

mais força, e esta soltou um leve suspiro. Talvez estivesse cochilando. Tenko

procurou manter-se imóvel, para não acordá-la. De certo modo, era uma honra ter

Nhyx dormindo em seus braços. Ladinos, assim como assassinos,

normalmente são pessoas extremamente cautelosas. Nhyx confiava nela o bastante

para abaixar a guarda totalmente e se entregar aos seus cuidados. Mas a amaria?

A ladina parecia se incomodar com as declarações de Tenko, então a

assassina costumava evitá-las. Às vezes sentia as palavras queimarem sua

garganta, loucas para escapar. Mas os lábios da assassina mantinham-se

cerrados. Palavras são mais destrutivas que a adaga ou o katar. Palavras são

traiçoeiras. Manter o silêncio era o correto a se fazer, e ter sua amada ladina

em seus braços já era mais que o suficiente.

 

 

Nhyx levantou a cabeça e

beijou o rosto de Tenko. A assassina respondeu beijando-lhe os lábios.

 

 

- Pensei que você

estivesse dormindo...

 

 

- Não estava não. Só

descansando um pouquinho. Hoje foi um dia cansativo.

 

 

Havia sido realmente um

dia cansativo. Ambas tinham o hábito de caçar tartarugas, e vez ou outra se

cruzavam na Ilha. No entanto preferiam não demonstrar seus sentimentos uma pela

outra em público. Tenko

tinha plena consciência que estava sendo perseguida e que os soldados de Primus

adorariam a oportunidade de usar sua amante como refém ou isca, e apesar de

saber que os jovens e supersticiosos guerreiros da Casa Primus jamais se

arriscariam na supostamente amaldiçoada Ilha das Tartarugas, sabia que o clã

tinha ouro o bastante para pagar um informante. E era por esse motivo que as

duas preferiam se encontrar no meio da floresta, fora das rotas normais, no fim

da tarde ou na calada da noite.

 

 

A ladina se deitou

na grama, cabeça apoiada nas mãos, olhando para o céu. Tenko deitou-se ao seu

lado, recostando a cabeça em seu ombro.

 

 

- A noite está linda

hoje, não está, Tenko?

 

 

Tenko concordou, balançando

a cabeça.

 

 

- Está sim. Costumava

ouvir que as noites de baile no castelo de meu pai eram belas, mas nenhuma foi

tão bela quanto esta de hoje.

 

 

- Ah, sim, você veio de

Prontera. Você me contou...

 

 

Durante seus encontros

furtivos, Tenko havia contado toda sua história para Nhyx. Desde o dia em que

havia saído de casa, montada em um pecopeco sem sela, até suas mais atuais

caçadas na Ilha das Tartarugas. Descobriu em uma dessas conversas que Nhyx

havia conhecido seu mestre Shi no Toge, embora não tivessem tido nenhuma

relação além da comum entre uma gatuna e um ladino nas ruas de Morroc.

Havia contado sobre suas frustrações e sobre os acontecimentos que a levaram a

se tornar uma gatuna.

 

 

- E você, Nhyx? Como foi

que acabou virando gatuna? E como acabou sendo uma ladina?

 

 

Nhyx suspirou fundo e

fechou os olhos, como se tentasse visualizar as cenas do passado. Permaneceu

alguns minutos deste jeito, concentrada, e então deitou-se de lado, sua face

próxima à da assassina, as pontas dos narizes quase se tocando.

 

 

- Minha história não tem

nada muito especial, Tenko. Nenhum ato heróico, nenhuma fuga no meio da noite,

nada. Minha família vivia em

Morroc. Em uma daquelas casas pobres, na periferia da cidade.

Meus pais eram mercadores, não de uma família nobre como a da Kuroi, mas

pessoas simples. Eles compravam poções e flechas dos grandes fornecedores da

cidade e revendiam nos arredores da Pirâmide de Morroc, e da Esfinge também. O

lucro nunca era muito alto, e mal dava pra gente se sustentar. Até que um dia

eles saíram de casa e não voltaram mais. Houve um ataque de monstros, ficamos

sabendo só depois. Os aventureiros que costumam caçar naquela área mataram os

monstros. Morreram naquele dia um ou dois cavaleiros, um caçador ou outro, até

da morte de um assassino ouvimos falar. Mas quando esse tipo de coisa acontece

os mercadores são sempre os primeiros a morrer...

 

 

- Eu sinto muito. -,

disse a assassina, um pouco constrangida por ter perguntado. Achou que nesse

caso específico não seria muito gentil soltar uma das máximas da Guilda do

Deserto de Sograt, como “a morte é nossa companheira em todo momento” ou “os

fortes sobrevivem, os fracos sucumbem”. Ao invés disso, acariciou as costas da

ladina e deu-lhe um beijo delicado.

 

 

- Tudo bem, Tenko! Isso

foi há muito tempo. -, disse a ladina, com um leve sorriso nos lábios. – Enfim,

acabei ficando sozinha. Existia um orfanato na cidade, dirigido por um grupo de

sacerdotes vindos de Prontera. Não sei se ainda existe, mas na época existia e

acabei ficando por lá. Mas eu não tinha a mínima vocação para o sacerdócio! -,

disse Nhyx, rindo alto. – Nunca tive paciência para ficar ajoelhada por horas

rezando para deuses em que não tenho certeza se acredito. Além disso, “voto de

pobreza” é uma expressão que não me agrada nem um pouco! Nunca fui

disciplinada, arranjava briga com a maioria das crianças do orfanato. Deixava

as sacerdotisas loucas, fugia para o deserto e ficava atirando pedras nos

monstros só para ver eles se irritarem. Eles corriam atrás de mim, mas nunca me

pegavam. Eu sempre fui rápida! Foi quando comecei a me dar conta que minha

agilidade poderia ter utilidade maior que algumas brincadeiras com monstros.

Foi então que comecei a bater carteiras, assaltar lojas de mercadores, enfim,

realizar pequenos furtos. E naturalmente acabei me juntando à Guilda dos

Gatunos e largando aquela porcaria de orfanato. Conheci bastante gente,

gatunos, ladinos, alguns de outras classes também. Viajei um pouco por

Rune-Midgard...

 

 

- ...E aí você treinou

bastante e virou uma ladina! -, disse Tenko suavemente, roçando seus lábios nos

de Nhyx.

 

 

- Eu treinei bastante

sim, mas não para ser uma ladina. Eu parti para o deserto, em busca de um

lendário templo envolvido em tempestades de areia...

 

 

- Você queria ser uma

assassina? -, disse Tenko, surpresa. Nhyx sorriu ante o espanto da companheira.

 

 

- Sim. Eu sempre admirei

a força e a tenacidade dos assassinos. Me sentia atraída por eles quando os via

passar pelas ruas de Morroc. Sempre tão misteriosos e calados, com aquelas

capas manchadas de sangue. Além disso, ela havia se tornado uma

assassina...

 

 

Nhyx abaixou o olhar,

pensativa. Tenko permaneceu impassível, embora a menção à sua rival de olhos

escuros fizesse seu peito arder de ciúme.

 

 

- Mas então -, disse a

ladina, sacudindo a cabeça e afastando de sua mente o que quer que estivesse

pensando. – Eu cheguei a encontrar o templo. Passei em todos os testes, mas o

mestre da guilda não quis me aceitar. Disse que eu não tenho o “espírito do

assassino”. Que eu sou destemida e leal, e isso é bom. Mas não tenho esse

orgulho todo que vocês prezam tanto, e não sou muito de seguir regras e

códigos. Enfim, não consegui o Colar do Oblívio e a roupa colada sexy.

Mas depois de ouvir aquele discurso de “a morte é companheira” e tal, não

queria mesmo! Vocês levam tudo muito a sério!

 

 

Tenko deu um leve

beliscão na coxa da ladina ao ouvir o comentário sobre seus trajes. Nhyx riu, e

respondeu com um tapa na panturrilha da assassina. Em seguida escorregou os

dedos para o peito da assassina e alargou com a mão as faixas apertadas que

envolviam seu tórax e pescoço. Mergulhou a mão no decote do traje escuro de

Tenko. Puxou de dentro dele uma corrente fina, com um pequeno pingente

representando um busto feminino com uma adaga cravada no peito. O Colar do

Oblívio, emblema da Guilda dos Assassinos do Deserto de Sograt. Tenko Kitsune

nunca removia o colar, nem mesmo quando dormia ou se banhava.

 

 

- Você sempre usa isso,

não usa?

 

 

Tenko assentiu com a

cabeça.

 

 

- Minha mocinha é uma

assassina orgulhosa e mal-humorada! –, brincou Nhyx, sorrindo maliciosamente

enquanto observava o pingente com cuidado.

 

 

- Ei, isso é prata não é?

 

 

- É sim. Por que?

Pretende me assaltar enquanto eu durmo?

 

 

- Quem sabe?

 

 

- Duvido que você

consiga! – A assassina abriu um sorrisinho cínico e levantou uma sobrancelha. A

ladina saltou sobre ela e as duas rolaram na grama. Nhyx era mais ágil e Tenko

mais resistente. As duas tinham a mesma força, e essas pequenas disputas sempre

acabavam com as duas sujas de terra, abraçadas e dando risada. E esta vez não

foi diferente. Tenko abraçava a ladina com força, suas mãos passando por dentro

do pesado sobretudo escarlate. Nhyx a afastou delicadamente.

 

 

- A Lua já vai alta no

céu. Preciso dormir um pouco.

 

 

Tenko concordou.

Precisava de algum tempo de sono também. Tinha que acordar antes do nascer do

Sol. Antes que os soldados de Primus se embrenhassem na floresta, pois sob a

luz forte do dia os medos e superstições diminuem consideravelmente.

Despediram-se, lamentando não poderem dormir uma nos braços da outra.

Beijaram-se com carinho, jogaram seus mantos cinzentos sobre os ombros e

desapareceram entre as sombras da floresta.

 

 

Tenko sempre se sentia um

pouco melancólica nestes momentos de despedida. Escolheu uma árvore de tronco

grosso e muitas folhas, e a escalou sem dificuldade. Aninhou-se em um galho

alto e cobriu-se com a capa. Estaria protegida do frio e de olhares

indesejados. Era bom ter um corpo leve nessas horas. Fechou os olhos e

adormeceu rapidamente.

 

 

----------------------------------------------------------------

 

 

Tenko

acordou subitamente. Olhou para o céu. Ainda podia ver raios prateados de luar

atravessando a copa frondosa da árvore que lhe servia de cama. Apurou os

ouvidos. Alguém caminhava pela floresta sem cuidado algum, esmagando folhas

secas e gravetos e fazendo muito barulho. O vento trazia um aroma conhecido.

Farejou, tentando identificá-lo. Reconheceu. Era o cheiro de Freya.

 

 

Olhou

para baixo e viu a sacerdotisa de cabelos verdes rondando o tronco da árvore.

Freya estaria com algum problema? Saltou de sua cama para um galho mais baixo,

e deste foi para o chão, pousando habilmente e quase sem produzir ruído algum.

 

 

-

Freya, o que houve?

 

 

A

sacerdotisa olhou diretamente para as íris vermelho-sangue da assassina. Tenko

sentiu cada pêlo de seu corpo se arrepiar. Seus olhos, seu nariz e seus ouvidos

não captavam nada de anormal, mas seu misterioso sensor de perigo a avisava que

havia algo muito errado com Freya Dellan. Suas mãos instintivamente alcançaram

as jurs presas em suas coxas. Seu coração havia disparado. Olhou mais uma vez

para a sacerdotisa. Havia algo estranho em seu olhar.

 

 

-

Freya...

 

 

-

Confuturus facere lex divina! Silentio!

 

 

Tenko sentiu a garganta

arder, como se estivesse engolindo faíscas. Conhecia aquela magia. Já havia

visto os sacerdotes a usarem para suprimir os poderes curativos de algumas

tartarugas na Ilha. O efeito era simples: sob o efeito da magia, a voz da

vítima era completamente eliminada. Isso era particularmente ruim para magos e

outros usuários de magia, que precisam recitar formular, ou para qualquer um

que dependa de kiai para desferir seus golpes com força. Mas contra uma

assassina, uma guerreira silenciosa, a magia tinha pouca utilidade. Tenko só

podia concluir que Freya a queria calada. Mas por quê?

 

 

Logo descobriu. Algumas

sombras se moveram por trás das árvores. Três figuras masculinas vieram em sua

direção. Agora, banhadas pelo luar, Tenko podia identificá-las. A primeira era

um mercador, pálido e esguio, com longos cabelos louros presos em um rabo de

cavalo. O segundo também era pálido, e também possuía cabelos louros, que caiam

em tufos macios sobre seu rosto. Trajava-se como um mago. O terceiro era um

homem alto, trajando armadura completa. Seus cabelos eram longos e negros,

presos junto à nuca. Seus olhos caídos eram de um azul profundo. Seu rosto era

fino, e seu nariz era grande e reto. Tinha uma boca grande demais para seu

rosto, e seus lábios estavam retorcidos em um sorriso cruel. Em suas mãos havia

uma longa espada bastarda, com diversas cabeças serpentinas entalhadas na

empunhadura.

 

 

Seu incansável perseguidor.

Sir Secousse Primus.

 

 

- Ora, ora, se não é

minha linda noiva. Finalmente nos reencontramos, senhorita Tenko Renard! Ou...

Como a chamam agora? Ah sim! Tenko Kitsune!

 

 

Tenko dobrou os joelhos,

abaixando seu centro de gravidade, e aumentou a distância entre seus pés,

reforçando sua base. Estava em desvantagem. Não poderia fugir, provavelmente os

soldados de Primus estavam espalhados pela floresta inteira. Correr era, com

certeza, cair em uma emboscada. Segurava suas jurs com firmeza. Esperaria

Primus fazer o primeiro ataque, e então contra-atacaria. Olhou de relance para

Freya, que havia corrido para o lado do cavaleiro, e a odiou. Esteve certa o

tempo inteiro. Primus tinha mesmo uma informante. “Traidora”, rosnou entre os

dentes. Mas sua voz não saiu. Voltou o olhar para Primus. Notou que o cavaleiro

afrouxou as mãos no punho da espada, e seus olhos se arregalaram por um

instante. Ele temia o olhar furioso de Tenko Kitsune.

 

 

- Mestiça nojenta! -,

rosnou Primus, se desfazendo da longa capa cor de creme e dobrando os joelhos

em uma pose de combate. Tenko também abaixou os seus pouco mais. – Você deveria

ter aceitado minha proposta de casamento. Você poderia ter uma vida decente, e

ninguém nunca saberia o monstro sanguinário que você é! Mas você não pode controlar

isso, não é? Não pode ir contra sua natureza! Agora você vai morrer, Tenko

Kitsune! Vai morrer como um monstro, que é o que você é!

 

 

Reiko e Byakko se

entreolharam. Byakko suspirou e sacudiu a cabeça, como se estivesse na presença

de uma criança birrenta. Reiko olhou com um certo desprezo para o cavaleiro.

 

 

- Lembre-se do nosso

acordo, Secousse. A mestiça deve viver.

 

 

- CALE A BOCA, MAGO! -,

urrou o cavaleiro, sem tirar os olhos de Tenko.

 

 

- Secousse, devo

lembrá-lo de que Lady Irina...

 

 

- Silêncio! Não vou mais

obedecer a ordem alguma daquela bruxa velha! Esse demônio matou dezenas de

membros do meu clã! Da minha família! EU VOU MATAR ESSA MESTIÇA DESGRAÇADA!

 

 

Urrou outra vez e avançou

em direção à assassina com a espada em riste. Tenko estava preparada. Saltou de lado,

evitando o ataque. Mas Primus rapidamente girou o corpo e atacou novamente.

Secousse Primus não era nenhum amador. Há muito tempo ele havia dominado a arte

de lutar com a espada de duas mãos. O cavaleiro sabia aproveitar o peso da

espada para fazê-la cair mais rápido, e aproveitando a inércia, brandia a arma

em uma velocidade espantosa. Tenko, acostumada a lutar com tartarugas, não

estava preparada para enfrentar um inimigo tão veloz. Esquivava dos golpes com

dificuldade, e não conseguia encontrar tempo para atacar o inimigo.

 

 

Primus levantou a espada

acima da cabeça, pronto para desferir um golpe vertical fulminante. Tenko viu

sua chance. Saltou, desenhando um arco com o katar e cortando ambos os pulsos

do cavaleiro. Os cortes foram profundos. Com os tendões arrebentados, Primus

teria dificuldade em usar a espada. Tenko havia conquistado uma certa vantagem.

Aproveitou a brecha para desferir um golpe mais preciso. Recuou o cotovelo para

ganhar mais impulso, e em seguida cravou a lâmina da mão direita na lateral do

abdome do cavaleiro, estilhaçando sua cota de malha e perfurando sua carne.

Moveu lateralmente o braço esquerdo, preparando seu próximo ataque. O movimento

seguinte rasgaria a garganta de Primus. Havia sido mais fácil do que ela esperava.

Mas a lâmina não atingiu o pescoço de seu adversário. Parou a alguns

centímetros de distância. Tenko conhecia este pequeno truque também. Magia

divina. Cria uma barreira temporária de energia que protege o alvo. Kyrie

Eleison é como os sacerdotes a chamam. Freya estava dando suporte para Primus.

 

 

Tenko recuou para evitar

o golpe da espada do cavaleiro. Viu Freya de mãos postas, murmurando suas

orações. Os ferimentos de Primus se fecharam. A assassina resolveu mudar seu

alvo. Correu em direção à sacerdotisa, katar em riste. Eliminar Freya

era sua única chance. Saltou sobre ela. Não sabia se conseguiria matá-la.

Sacerdotes se curam, é difícil eliminá-los em pouco tempo. Mas tentaria

perfurar seus olhos, é mais difícil realizar magia sem contato visual.

 

 

- Que os espíritos dos

pântanos segurem suas pernas! Que seu corpo se torne pesado como a rocha!

 

 

Tenko realmente sentiu o

corpo pesar. Aterrissou de seu salto mau jeito, quase não conseguindo cair de

pé. Primus surgiu ao seu lado e a atingiu com a manopla antes que pudesse se

equilibrar. Tenko foi jogada no chão e rolou por alguns metros. Levantou-se e

voltou a lutar. Mas dessa vez Primus parecia mais rápido!

 

 

“Não... sou eu que estou

mais lenta!”

 

 

Viu a espada de Primus

vindo em sua direção. Esquivou-se, mas a espada a atingiu de raspão. Primus

grunhiu de felicidade ao ver o sangue da assassina jorrar, e continuou

atacando. Tenko tentava desviar os golpes, fazendo-os atingir suas ombreiras,

enquanto procurava atingir os pulsos do cavaleiro. Conseguia freqüentemente, e

então Freya fazia os cortes se fecharem. Mas isso fazia Primus se atrasar, e

lhe dava algum tempo para pensar em uma estratégia. Um golpe mais forte da

espada de Primus estilhaçou sua ombreira esquerda, e Tenko foi forçada a pensar

em outro modo de escapar. Primus aproveitou a falta da ombreira para tentar

decepar o braço. Tenko o atingiu no punho no momento exato, fazendo a parte

chata da espada atingir seu ombro no lugar da lâmina. Mesmo assim o golpe foi

doloroso, e Tenko teve a ligeira impressão de que seus ossos haviam se

transformado em farinha.

 

 

Ainda atordoada pela dor,

Tenko percebeu tarde demais a espada de Primus cortando o ar horizontalmente,

na altura de seu pescoço. Não teria tempo de saltar para longe, então se

abaixou. Sentiu a espada passar a poucos centímetros de distância do topo da

sua cabeça.

 

 

- Peguei você! -, grunhiu

Primus. Rosnando com o esforço, reverteu o movimento anterior, em um golpe

diagonal ascendente, veloz e inesperado. Tenko reuniu todas as suas forças e

saltou para trás. Mas não conseguiu evitar o golpe. A assassina sentiu o sangue

escorrer por sua face.

 

Primus soltou uma risada

insana ao ver a ponta da espada tinta de vermelho. Demorou alguns segundos para

perceber que Tenko havia escapado de seu golpe. Se a assassina houvesse

demorado um segundo a mais para saltar, a espada do cavaleiro teria partido sua

cabeça em duas. Mas

ela havia saltado no momento certo. Apenas a ponta da espada a havia atingido.

Tenko Kitsune escapou do golpe fatal de Primus com apenas um corte na testa. E

estava aproveitando o momento de hesitação do cavaleiro para fugir em disparada

para o meio da floresta. Primus correu em seu encalço, seguido por Freya, Reiko

e Byakko.

 

 

Tenko correu o mais que

pode. Não sabia para onde ir. Sua única chance era alcançar o Deserto de

Sograt, o que significaria cobrir uma distância humanamente impossível. Mas ela

precisava tentar. Corria o mais rápido que seu corpo ferido podia agüentar.

Havia perdido uma quantidade considerável de sangue na batalha, e sentia-se cada

vez mais fraca.

 

 

Um grande vulto negro

cortou seu caminho. Tenko demorou alguns segundos para identificar a figura.

Era um pecopeco. E havia alguém montado. Segurou com firmeza o katar da mão

direita, e o da esquerda melhor que pode com o braço ferido. Nas suas atuais

condições não teria chance alguma contra um cavaleiro montado, mas não se

entregaria facilmente.

 

 

- Tenko Kitsune!

Finalmente a encontrei!

 

 

Era uma voz feminina. Uma

amazona. Não poderia fazer parte da Casa Primus, pois era muito improvável que

aquele clã permitisse que uma mulher andasse montada em um pecopeco, sozinha no

meio da noite. Porém, a amazona conhecia seu nome, e a estava procurando.

Desconfiada, Tenko colocou-se em posição defensiva. Tentou levantar o braço

esquerdo, mas o ombro ferido não permitiu. Grunhiu de dor.

 

 

- Tenko Kitsune, se me

permite dizer, a senhorita não está em condições de lutar no momento. Sei que

meu pedido irá lhe parecer um tanto inusitado, mas peço que confie em mim. Monte comigo, e eu

a levarei para um lugar seguro.

 

 

A amazona estendeu a mão.

Tenko a observou por um bom tempo, e então aceitou a ajuda. Assim que a amazona

a fez montar, a assassina desfaleceu em seus braços. Havia perdido sangue

demais. A amazona apoiou Tenko o melhor que pode, segurando-a firmemente com um

dos braços. Abaixou a cabeça e sussurrou para sua montaria.

 

 

- Voltemos agora, querido

Siegfried. Corra o mais que puder.

 

 

O pecopeco grasnou, como

se compreendesse as palavras de sua amazona, e em seguida saiu em disparada

pelo meio da floresta.

 

 

Tenko não soube dizer na

hora porque havia confiado imediatamente na amazona. Talvez fosse por causa de

sua voz tranqüila. Talvez fosse por seus modos gentis. Quem sabe fosse por

causa da estranha aura de poder que ela emanava? Mas mais provavelmente, por causa

do pequeno lírio negro gravado na cruz da espada que a amazona tinha na

cintura, bem no ponto que refletia com mais intensidade a luz do luar. 

 

 

 

 

Primus seguiu a trilha de

sangue deixada por Tenko até onde pode. Gritou de raiva quando a perdeu.

 

 

- Não fique assim,

Secousse, meu amor! Vamos encontrá-la de novo logo, logo! -, disse Freya,

abraçando o cavaleiro.

 

 

- Na verdade, já

encontramos -, disse Reiko, apontando no chão as marcas feitas pelas patas de

um pecopeco. O mago se abaixou e farejou o chão.

 

 

- Exatamente como

imaginei. Ah, Lady Irina vai ficar satisfeitíssima quando souber para

onde a mestiça foi levada! -, rosnou o mago. Pelo tom irônico de sua voz, Lady

Irina iria ficar bastante descontente caso soubesse do paradeiro de sua

filha.

 

 

- Você sabe para onde ela

foi, mago? -, grunhiu Primus.

 

 

- Sei. Com certeza sei.

Não precisamos nem seguir as pegadas, conheço um caminho mais rápido.

 

 

- Certo! -, disse o

cavaleiro, acariciando os cabelos de Freya Dellan. – Freya, querida, você sabe

mais alguma coisa sobre essa mestiça malvada que você ainda não tenha me

contado?

 

 

- Te contei tudo que sei!

Não escondo nada de você!

 

 

Primus torceu o canto da

boca, em uma espécie de meio-sorriso. Com um movimento rápido, desembainhou a

espada bastarda e brandiu-a horizontalmente, decepando a cabeça de Freya Dellan

em um só golpe. Tirou um lenço da bolsa e começou a limpar a lâmina

tranqüilamente.

 

 

- Isso era realmente

necessário? -, perguntou o mago, fitando enojado a sacerdotisa morta. Byakko

nada disse. Apenas cruzou os braços e levantou as sobrancelhas, olhando com

desprezo do cavaleiro para o cadáver, do cadáver para o cavaleiro.

 

 

- Era sim. Ela foi útil

por algum tempo, mas não quero essa víborazinha solta por aí para me trair. Ela

se enroscava em qualquer um com uma aparência mais ou menos agradável, e tinha

a língua frouxa demais. Acredite, ela é mais segura deste jeito -, disse o

cavaleiro, apontando a sacerdotisa morta com a espada, antes de colocá-la de

volta na bainha. – Aliás, não sei como aquela mestiça não acabou com ela antes.

Se eu estivesse no lugar dela, essa pequena serpente já estaria morta há um bom

tempo. Vamos embora daqui logo. Temos mais o que fazer.

 

 

Reiko assentiu com a

cabeça. Murmurou algumas palavras arcanas. O cadáver imediatamente ardeu em

chamas.

 

 

Partiram na direção de

Alberta.

 

 

----------------------------------------------------------------

 

 

Tenko

abriu os olhos e se deparou com um teto estranho. Sentou-se e olhou ao redor.

Percebeu que não estava em uma cama, e sim em uma espécie de acolchoado baixo.

O estilo arquitetônico também era bastante estranho. Era um aposento todo feito

de pedra cinzenta, com grandes janelas sem vidro ou grades, e um portal sem

porta. Tinha certeza que não estava em Alberta. Subitamente,

notou que estava apoiada no braço esquerdo. E que ele não doía mais. Virou o

pescoço e observou o ombro. Esticou o braço, dobrou-o e moveu os dedos. Estava

perfeito. Levantou-se de supetão e observou seus ferimentos da noite anterior.

Todos curados. Tenko só podia se lembrar de uma vez em que havia passado por

uma situação parecida. No dia em que havia se tornado uma assassina.

 

 

Alguém

atravessou o portal. Era a amazona. Agora, no quarto bem iluminado, Tenko podia

observá-la melhor. Era muito alta, mais que qualquer mulher que Tenko já havia

conhecido e mais que grande parte dos homens também. Tinha um rosto muito belo,

com lábios rosados e bem desenhados, nariz delicado e sobrancelhas sinuosas.

Seus olhos eram cinzentos como o céu em dia de tempestade. Seus cabelos tinham

um incomum tom azul-celeste, e haviam sido cortados um pouco abaixo do queixo.

Ainda trajava armadura completa, com uma magnífica cota de malha. Tinha uma

espada longa pendurada na cintura, e sobre seus ombros havia um manto de penas

alvas. Carregava um grande elmo com chifres de carneiro debaixo de um dos

braços. A amazona se aproximou de Tenko, e sentou-se no chão ao seu lado.

 

 

-

Como está passando, Tenko Kitsune? Teve uma boa noite? Desculpe minha grosseria

na noite passada. Não tive tempo de me apresentar, e creio que lhe deva algumas

explicações.

 

 

-

Explicação nenhuma, nobre dama. Eu compreendo perfeitamente o que aconteceu. -,

disse Tenko, trêmula. – Só lamento ter deixado minha preciosa Nhyx para trás!

-, gemeu a assassina. Tentava manter a compostura, mas as lágrimas corriam

livremente por suas faces. Se soubesse que aquela era sua última noite, teria

dito como a amava. A amazona sorriu e apoiou gentilmente a manopla no ombro da

assassina.

 

 

-

Então reconhece meus traços, jovem guerreira do deserto? Creio que já deva ter

passado por situações difíceis. Mas não se preocupe, jovem guerreira. Sua hora

ainda não chegou. Este lugar não é o Valhalla, e eu não sou uma Valquíria,

embora já o tenha sido no passado, e por isso você identificou meus traços: por

já ter se encontrado com uma de minhas irmãs. Chamo-me Brynhildr, e estive em

sua busca por um longo tempo.

 

 

Tenko

despertou subitamente. Estava viva! Primus não a havia derrotado! Sem dúvida,

era um alívio para seu orgulho. Notou que estava praticamente nua. Usava apenas

suas roupas de baixo. Ainda tinha os seios enfaixados, e o Colar do Oblívio

ainda estava em seu pescoço. Dezenas de perguntas afloraram em sua mente ao

mesmo tempo. Tentou fazê-las todas de uma vez, mas acabou engasgando com a

própria saliva.

 

 

-

Uma de cada vez, jovem guerreira -, disse Brynhildr, sorrindo gentilmente. –

Paciência, e responderei a todas as suas dúvidas.

 

 

-

Onde está a Nhyx? Aquela maldita Freya deve ter contado para o Primus sobre

ela! Alguém tem que avisar que ela corre perigo! -, perguntou a assassina, com

um certo desespero na voz.

 

 

-

Nhyx está a salvo. Ela foi avisada, assim como Kuroi Yuri e Sethit Aintaurë. As

três estão seguras. Quanto à sacerdotisa de nome Freya Dellan, está neste exato

momento a caminho dos domínios de Hel, pois este é o destino dos traidores.

 

 

Tenko

suspirou aliviada, e finalmente conseguiu relaxar os músculos. Se Nhyx, Kuroi e

Sethit estavam a salvo, não havia com o que se preocupar. No entanto, ainda

tinha algumas perguntas a fazer.

 

 

-

Lady Brynhildr. Seu nome não me é estranho. Kuroi mencionou algo sobre

você uma vez. Bom, eu gostaria muito de saber onde eu estou. E mais, você disse

que é... Foi uma Valquíria? Desculpe a minha desconfiança, mas tenho más

experiências com membros da Cavalaria de Prontera.

 

 

-

Não peça desculpas, Tenko Kitsune. Sua desconfiança é perfeitamente

justificada. Você se encontra em um templo localizado em uma pequena ilha

próxima à costa de Amatsu. Quanto a mim, sou uma renegada. Já fui uma

Valquíria, uma das preferidas de Odin. Mas acabei desobedecendo a uma ordem

direta de Odin, e este me condenou a viver a vida de uma humana mortal. Mais

ainda, fui condenada a me apaixonar pelo primeiro homem que eu visse, mesmo que

fosse o pior dos criminosos. Mas um pouco depois, Odin se acalmou e resolveu

abrandar minha punição. Então Ele decidiu que eu seria colocada no topo de uma

altíssima montanha, no centro de um terrível círculo de fogo, e lá ficaria em

sono profundo até que alguém viesse me despertar. Essa medida garantiria que

apenas alguém corajoso o bastante para escalar a montanha e atravessar o

círculo de fogo me despertasse. E quem foi ele, senão meu bravo Siegfried! O

grande guerreiro que derrotou o monstro Fafnir!

 

 

Mas

houveram algumas adversidades entre nós. A maior culpada com certeza foi a

feiticeira Grimhild, que enfeitiçou meu Siegfried para esquecer de mim e se

apaixonar pela filha dela. Mas eu também tive minha parcela de culpa. Todo o

caso terminou com a morte de Sigfried, e em seu funeral meu desespero foi

tamanho que me joguei nas chamas de seu crematório. E então fui para as Terras

Baixas, para Niflheim, por ter tirado minha própria vida. E lá permaneci, na

Cidade dos Mortos, por muitos e muitos anos.

 

 

Recentemente

Odin mandou um mensageiro a mim. Dizia que o dia do Ragnarök se aproxima, e que

precisava recrutar novos Einheirjar. Então me fez uma proposta: eu seria

readmitida entre as Valquírias de Odin caso conseguisse levar para o Valhalla o

espírito de um verdadeiro herói.

 

 

-

Não deve ser uma tarefa difícil. Heróis existem aos montes por aí -, comentou a

assassina.

 

 

-

Preste atenção no que digo, Tenko Kitsune! -, retrucou a amazona, com um certo

desespero na voz. – Não procuro um guerreiro forte, ou um guerreiro de linhagem

nobre. Procuro um verdadeiro herói. Tem idéia de como isso é raro?

 

 

Tenko

refletiu por um momento, e compreendeu. Não era uma tarefa fácil. Era uma

tarefa praticamente impossível.

 

 

-

Odin ainda quis dificultar mais minha tarefa, e designou que eu fosse em busca

de uma alma heróica não como uma Valquíria, mas como uma humana mortal. E, ai

de mim, me pregou uma peça digna de Loki, o Forjador de Trapaças! Quando me

mandou de volta a Midgard, mandou também meu amado Siegfried, e fez que nós nos

encontrássemos novamente. Mas quis ele que nosso amor fosse impossível!

 

 

-

Nenhum amor é impossível, creio eu -, respondeu a assassina. Mas porque está me

contando tudo isso, Brynhildr?

 

 

-

Por que, jovem assassina, tenho boas relações com a mestra deste templo. E ela

vem lhe observando há tempos, Tenko Kitsune. Ela acredita que você possa ser a

alma heróica que procuro. Ela prevê grandes feitos em seu futuro, dignos de um

Einheirjar.

 

 

“O

mundo inteiro está me vigiando?”, pensou a assassina. Mas não pronunciou a

frase em voz alta. Sentia-se um tanto insegura dentro deste misterioso templo,

cuja mestra a vigiava às escondidas. Também se sentia intimidada na presença da

Valquíria. Mesmo com um corpo mortal, Brynhildr emanava poder. Não podia

duvidar de sua história. Tenko havia visto uma Valquíria uma vez, e a

semelhança entre as duas era inegável. Ao invés disso, fez uma pergunta que

estava começando a incomodá-la.

 

 

-

Onde estão minhas roupas? E principalmente, onde estão minhas jurs?

 

 

-

A mestra deste templo e seus discípulos cuidaram de suas feridas, e conseguiram

curar totalmente cada uma delas, exceto a ferida em sua face. Essa, por mais

que se usasse magia divina de cura, deixou uma cicatriz. Seus trajes estavam

irremediavelmente perdidos, então a mestra mandou uma mensagem à Guilda dos

Assassinos, explicando a situação e requisitando um novo traje. Suas armas

estão debaixo de seu travesseiro. Imaginei que gostaria de tê-las por perto

quando despertasse.

 

 

Tenko

levantou o travesseiro duro e encontrou seu par de jur, todas as suas facas de

arremesso e ainda sua bolsa de venenos. Desembainhou uma das jurs e observou o

reflexo de seu próprio rosto. O golpe da espada de Primus estava

permanentemente gravado em sua face. Uma diagonal torta, começando pouco abaixo

do olho esquerdo e se elevando acima de sua sobrancelha direita. Tenko passou

um longo tempo mirando a cicatriz. Tocou-a com as pontas dos dedos. Franziu a

testa e viu a linha se deformar. Seu corpo já era coberto de cicatrizes, e ela

não se importava em ter algumas a mais ou a menos, mas marcar o rosto de um

assassino é uma ofensa mortal. Ainda assim, Tenko admitiu que teve sorte. Se o

golpe houvesse se desviado para qualquer um dos lados, o preço seria metade de

sua visão.

 

 

Estava

neste estado contemplativo, quando uma garota entrou no aposento. A assassina e

a amazona voltaram-se para ela. Era uma garota bastante jovem. Tinha rosto

redondo e nariz levemente achatado. Seus olhos eram escuros e afilados, e seu

cabelo era negro e muito liso. Tinha estatura baixa, mesmo para sua aparente

pouca idade. Vestia-se com uma batina amarelo-claro, uniforme dos noviços da

Catedral de Prontera, e em sua cintura tinha pendurada uma maça simples.

Carregava uma bandeja em uma das mãos e uma trouxa de pano na outra.

Aproximou-se cautelosamente, olhando desconfiada para Tenko. Trocou algumas

palavras com Brynhildr em uma língua que Tenko desconhecia, mas a amazona

parecia dominar perfeitamente. Deixou a bandeja e a trouxa ao lado da

assassina, fez uma rápida reverência e se retirou com pressa, possivelmente

aliviada por se afastar da estrangeira de olhos cor-de-sangue.

 

 

-

É uma das discípulas deste templo. Ela disse que a mestra deseja vê-la. Trouxe

alimento e roupas limpas, para que coma e se vista antes de sua audiência.

 

 

Tenko farejou a bandeja.

Havia uma pequena tigela com arroz branco puro. Outra com uma espécie de sopa.

Um prato com uma porção de peixe, que alguém aparentemente havia esquecido de

cozinhar, e também um copo com chá, o que Tenko muito apreciou. Comeu

rapidamente, pois estava bastante faminta por causa da batalha do dia anterior.

Checou as roupas. Serviam bem, apesar de estarem um pouco largas. Pelo que pode

avaliar, era alguma espécie de traje típico da região. Era negro. “Pelo menos

quem escolheu isso aqui acertou minha cor”, pensou a assassina, enquanto

terminava de se vestir.

 

 

Saiu do quarto em

seguida, acompanhada por Brynhildr, que conhecia o caminho até os aposentos da

mestra do templo. Tenko notou que o lugar estava fervilhando de discípulos.

Todos com trajes de noviço, e todos com maças penduradas na cintura. Alguns

mais velhos, outros mais novos. A maioria de olhos afilados e cabelos escuros,

como os da garota que veio lhe entregar a mensagem. Mas havia alguns de cabelos

ruivos e loiros, e rostos cobertos de sardas, noviços de pele escura e cabelos

cacheados, e até um ou outro com cabelos verdes, azuis ou até cor de prata, de

olhos amarelados ou arroxeados. Havia até mesmo um jovem noviço de cabelos

muito negros, e olhos vermelho-carmim. Todos, sem exceção, paravam o que

estavam fazendo para olhar para a assassina que passava. Vestida nos trajes de

Amatsu, com as lâminas estrangeiras penduradas junto às coxas. Tenko estava

habituada a olhares temerosos dirigidos à sua pessoa. Mas os olhares desses

noviços tinham algo diferente. A maioria das pessoas parecia temê-la por medo

do que era diferente. Medo do desconhecido. Estes jovens discípulos pareciam

temê-la por ser semelhante a algo que conheciam muito bem. Isso podia ser visto

claramente nas expressões surpresas dos rostos jovens.

 

 

- Os aposentos da mestra

são estes. Ela deve estar lhe esperando, Tenko Kitsune. Entre. Eu esperarei

aqui fora, para o caso de precisarem de mim. -, disse Brynhildr. Tenko assentiu

com a cabeça e adentrou no aposento à sua frente, mãos firmes na empunhadura

das jurs, para o caso de algum ataque. Nunca se sabe...

 

 

Entrou. Sua visão treinada

de assassina automaticamente varreu a sala inteira em busca de armadilhas. Não

viu nada que considerasse potencialmente perigoso. Era uma sala pequena. Havia

uma coleção de maças penduradas na parede, e algumas soqueiras metálicas em

cima de uma mesa de madeira pintada de vermelho. Ao fundo da sala, havia uma

grande rocha cinzenta, com caracteres estranhos gravados. Tenko imaginou que

fosse algum tipo de runa antiga. Havia dois pedestais de pedra, e em cima de

cada um, uma estátua representando uma raposa, adornada com enfeites vermelhos

em volta do pescoço. E no meio da sala, entre os dois pedestais, sentada

tranqüilamente no chão de pedra, lábios repuxados, mostrando as presas em um

sorriso e abanando a cauda felpuda, estava uma raposa viva. Sua pelagem era

imaculadamente branca, e seus olhos eram de um púrpura profundo.

 

 

A mestra do templo. A

Raposa Branca. 

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Cara, deu vontade de esfolar a Freya com um fio dental (não a real é claro, falo da personagem).
Curiosidade: as passagens sobre a troca das Asas de Anjo e dos 30 Oridecons são baseadas em fatos reais. =_=
Outra coisa que queria sugerir é mudar o título da fic. E caramba, O Mundo Visto Através de Olhos Vermelhos... '-'
É tão ruim assim? [/hmm] 
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Nossaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa...Consegui ver perfeitamente a luta...Pensei que a Nhyx que ia ajudar Tenko na hora da batalha...E acabei tendo uma surpresa...História muito boa...Não tenho palavras pra descrever de como essa Fic está boa!Espero que você poste o proximo capitulo logo! :D*Esperando ansiosamente o proximo Capitulo* *o*  

 

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Olá Tenko e quem mais estiver lendo...

Simplesmente adorei a fic, (tirando a parte do beijo... CREDO!), o modo de você detalhar os fatos me deixou pasmo...

Só tenho algumas perguntas.

Quando sai o próximo epi?

Por que você não enfiou a adaga no **** do cavaleiro?

Por que Espadachin e evoluções são dados como bons ou maus em TODA fanfic?

Que tal colocar um Bardo maligno no meio da (desculpe a expressão) suruba?

Todas as perguntas anteriores fizeram algum sentido?

Eu não deveria apertar o botão "Confirmar" antes de apagar as coisas acima?

I am a... O RLY ??

Abraços. Ou não?? RÁ!!!

Obs.: Acho melhor parar de "cutucar a Tenko com vara curta"... Pensando bem... Melhor manter distância por enquanto...

*corre freneticamente por 10 m.* té + o/

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sim senhoras e senhores, aí está mais um pedaço de uma autentica obra de arte! *aplausos*

puts, esse cap ficou mto dez, eu nunca teria adivinhado que o cara tinha roubado a pot da tenko se n tivesse lido essa fic tempos atrás... gogogo mais capítulo! /fome

mais uma vez parabéns pela ótima fic e pelo ótima cap tenko !

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Quando sai o próximo epi?

Provavelmente vou postá-lo no domingo.

Por que você não enfiou a adaga no **** do cavaleiro?

A adaga estava no quarto. =3

Por que Espadachin e evoluções são dados como bons ou maus em TODA fanfic?

Se eles não são bons nem maus vão ser o que? Neutros e indiferentes aos fatos da narrativa? XD

Que tal colocar um Bardo maligno no meio da (desculpe a expressão) suruba?

Não tenho planos para bardos na fic, mas posso pensar no assunto.

Todas as perguntas anteriores fizeram algum sentido?

Se fazem sentido pra você, pra mim está ótimo.

Eu não deveria apertar o botão "Confirmar" antes de apagar as coisas acima?

Tarde demais. [/mal]

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sim, meus amigos! está próxima a hora em que, quem já leu( como eu) essa obra prima, finalmente saberá a continuação dessa heróica( ou quem sabe não?) saga! agora  é esperar mais um ou dois capítulos e depois, e ver( ou ler?) para crer. ótimo capítulo tenko! a luta com o primus foi mto real, eu visualizei tudo( sou bom nessas coisas,sempre fui assim) e puder ver claramente os dois quase se matando na floresta! gogoggo mais capítulos! [/fome]

ah e, o peco da brunhilde (ou brynhildr, sei lá) é o próprio siegfried?? já ouvi falar em coisas que não valem a pena mas essa foi a pior( nussa, depois dessa piada eu vou acbar morendo, pior que daqueles bardos de woe...)

então gogogo escrever mais e gogogo falar com a raposa, ótimo cap e ótima fc tenko!

flow!

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Promessa feita é promessa cumprida. NetRunner ganhou a eleição pra tutora da Guilda dos Artistas, e cá estou eu de volta com a minha velha fanfic! Cheguei a pensar em ilustrar a história, mas resolvi que não quero. Quero que cada um imagine os cenários e as personagens da maneira que achar melhor. Eu mesma muitas vezes me decepcionei com representações gráficas de personagens queridos de histórias escritas. Então, vocês tem as minhas descrições e a imaginação de vocês para visualizar as cenas da maneira que mais lhes apetecer!Pros que não conhecem, o que vou postar aqui é o meu trabalho

RO-related mais precioso. É praticamente o motivo que me fez amar tanto

esse jogo. O universo variado e meio nonsense de Ragnarok Online abre

possibilidades para inúmeras histórias. Essa é uma delas. Esta é a história de Tenko Kitsune: assassina e guerreira, menina e mulher, amante e selvagem, mestiça e única. Uma história que me é muito querida e na qual eu coloquei muito de mim mesma, e que torço para que apreciem ler tanto quanto quanto eu aprecio escrever.

Tenho cerca de duas dezenas de capítulos já prontos aqui, mas vou postar devagarinho para dar tempo de todo mundo ler, comentar e criticar se quiser. Aliás, críticas construtivas são extremamente bem vindas. Só tenham em mente que os primeiros capítulos foram escritos em meados de 2005, e eu escrevia mal pra caramba naquela época. Apesar de corrigir alguns erros ortográficos ou sintáticos e mudar alguns elementos de nomenclatura (o termo rogue, por exemplo, foi substituído por ladino), o conteúdo dos capítulos ainda é o mesmo, por respeito ao passado. Afinal, quando redigi esse texto pela primeira vez, tinha em mente uma

historinha despretensiosa, apenas um background para usar quando

fizesse role play no Ragnarok. Acabou ficando bem maior do que eu

esperava.E eu já falei demais. Aí vai o primeiro capítulo. Enjoy.------------------------------------------------------------------------------------------------------- ÍNDICE Capítulo 1 - O Cavaleiro e sua DamaCapítulo 2 - Desonra Para sua Família Capítulo 3 - Rebelde Capítulo 4 - Por Sorte, Talvez... Capítulo 5 - O Destino de uma Fugitiva Capítulo 6 - A Raposa Capítulo 7 - Um Sorriso Cordial Capítulo 8 - Kuroi Yuri Capítulo 9 - Reflexões Capítulo 10 - Reencontro Indesejado Capítulo 11 - Um Caminho para Tenko Capítulo 12 - O Templo Envolvido em Tempestades de Areia - Primeira Parte Capítulo 13 - O Templo Envolvido em Tempestades de Areia - Segunda Parte Capítulo 14 - Refúgio Capítulo 15 - PrimaveraCapítulo 16 - Sem Dor Capítulo 17 - Tenko, a Múltipla Capítulo 18 - Perdoar, Jamais Esquecer Capítulo 19 - Verde e Escarlate Capítulo 20 - Traição sob o LuarCapítulo 21 - O Legado do Demônio - Primeira Parte Capítulo 22 - O Legado do Demônio - Segunda ParteCapítulo 23 - O Início de Três Jornadas

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CAPÍTULO 1 - O CAVALEIRO E SUA DAMA 

 

 Lucius pisou triunfante para fora do centro de treinamento. Seu

pai o aguardava do lado de fora. O aprendiz se aproximou de seu

progenitor, e este lhe entregou uma lâmina simples, mas afiada e

cuidadosamente reforçada com fracon até quase seu limite, poções,

armadura, escudo e um gordo e tilintante saco de zeny. Depois disso, o

filho despediu-se do pai e correu para a pradaria verde ao sul de

Prontera, até sumir de vista.

 

O jovem Lucius

havia se tornado aprendiz havia menos de uma hora, mas já era forte.

Seu treinamento já havia começado há muito tempo. Ele era um jovem

forte, troncudo e cheio de vitalidade. Seus cabelos escuros e lisos

refletiam um tom azulado, e fiapos de barba começavam a despontar no

seu queixo. Seu rosto era anguloso, o nariz imponente e a boca fina.

Sobrancelhas grossas e negras emolduravam olhos castanho-escuro. Era

alto e musculoso, e sorria bravamente enquanto, sem dificuldades,

testava em Porings e Fabres as habilidades aprendidas no castelo de sua

família.

 

O pai de Lucius era um nobre cavaleiro de cabelos

grisalhos, e sua mãe era uma bela e delicada dama. Seus avós também

eram bravos cavaleiros e damas prendadas, assim como seus bisavós,

trisavôs e tataravôs. Lucius fora treinado para se tornar um cavaleiro

também. Seu treinamento começou no dia em que ele teve força para

segurar uma espada. Fora treinado tanto fisicamente quanto moralmente,

e havia aprendido a ser rígido, sério e honrado.

 

Poucos dias

depois de sair de casa, o jovem aprendiz se tornou um espadachim. O

teste não foi difícil, ele estava preparado. Sua família mandou para

ele, via Kafra, uma bela coleção de espadas e escudos. E outro saco

gordo de zeny. Lucius aprendeu a usar a espada de uma mão, a concentrar

sua força em um único golpe, a abaixar a defesa do inimigo, a relaxar

os músculos para se recuperar mais rápido de ferimentos e a suportar a

dor. Até que chegou o dia de se tornar um cavaleiro.

 

A família

inteira esperava Lucius na saída do teste. Quando ele terminou, seu pai

o presenteou com um belo e fogoso PecoPeco amarelado, tão cheio de

vitalidade e força quanto o próprio Lucius. E assim, o jovem aprendiz

se tornou Sir Lucius Renard, o mais jovem herdeiro de uma antiga

dinastia. E foi re-integrado à sua família, passando a residir outra

vez no castelo.

 

A música era boa, e a bebida e comida melhores

ainda. O baile estava maravilhoso. Sir Lucius Renard estava sentado à

mesa com seus amigos. Eram todos cavaleiros experientes e fortes.

Lucius

estava belo em seus trajes de gala. Os cabelos negros refletindo um

azul intenso à luz dos lustres de cristal, a barba bem cuidada

emoldurando um sorriso viril, a armadura polida e a capa lavada. A bela

espada pendendo de sua cintura era mais um enfeite que uma arma, já que

o cavaleiro praticamente só usava a lança em batalha. Lucius ria e

bebia.

 

Os bardos começaram a tocar uma música que convidava os

nobres cavaleiros à dança. Os bravos começaram quase imediatamente a se

levantar de suas mesas e cortejar belas damas em vestidos de festa, que

riam e cochichavam entre si cada vez que um cavaleiro estendia a mão a

uma delas.

 

Lucius sondou um pouco o ambiente, até seus olhos se

fixarem em uma dama no fundo da sala, sentada ao lado de uma corte de

servos. Lucius cutucou seu pai, pedindo informações sobre a bela

mulher, sem tirar os olhos dela. Seu pai respondeu que aquela era Lady

Irina, e isso era tudo que ele sabia. A nobre dama havia acabado de

chegar à cidade.

 

Era uma mulher peculiar. Seu rosto era delicado

e bem-feito, emoldurado por cabelos de um louro muito claro, quase

branco. Eram bem-tratados e caiam em cachos ondulados sobre seus

ombros. A pele era muito clara, contrastando com o vestido negro. Seus

lábios carnudos e vermelhos sorriam delicadamente para Lucius. Mas o

maior destaque eram seus olhos.

Eram olhos vermelho-sangue,

brilhantes, ferozes. Havia algo sobre-humano naqueles olhos. Eles

fixavam diretamente os olhos castanhos do cavaleiro, e o chamavam

insistentemente. Lucius prontamente atendeu ao chamado.Não muito tempo

depois, os sinos da catedral de prontera anunciavam o casamento de Sir

Lucius Renard com Lady Irina.

A família inteira do cavaleiro compareceu ao casamento. Mas a dama trouxe apenas um séquito de servos.

 

O

casamento era próspero e o casal era feliz. Os servos de Irina passaram

a trabalhar no castelo, e eram mais prestativos que qualquer outro

servo. A dama mantinha dois deles especialmente próximos. Um garoto

delicado, pálido, de aparência frágil. Seu nome era Reiko, e ele tinha

cabelos castanho-dourado muito claros que caiam sobre seu rosto, e

olhos azul-celeste. Reiko arrumava e limpava o quarto e as posses

pessoais da sua senhora. O outro servo, Byakko, tinha a mesma pele

clara e os mesmos olhos azuis de Reiko, mas era forte e musculoso. Seus

cabelos eram louros e caiam em um rabo de cavalo sobre suas costas.

Byakko cuidava do pequeno jardim de sua senhora, e entregava mensagens.

Os dois aceitavam ordens dela, e apenas dela.Muitos dos nobres do

palácio olhavam com desconfiança para Irina e seus dois servos, mas

Lucius a amava perdidamente, e era muito feliz ao lado de sua dama. E

assim se passaram alguns anos.

 

O esperado choro de criança

finalmente irrompeu no quarto de Lady Irina Renard. O ansioso Lucius

entrou no quarto assim que lhe foi permitido. Era uma linda menininha.

Sua pele era pouco mais escura que a da mãe, tinha as sobrancelhas

expressivas e o rosto anguloso do pai. Seus cabelos, mistura do

negro-azulado com o prateado, saíram de um tom prata-azulado, que

lembrava a cor do luar. Os olhos eram vermelho-sangue, ferozes,

perfurantes, idênticos aos da mãe. Era uma criança bonita e saudável.

Seu nome, disse Irina, seria Tenko.

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Cara, deu vontade de esfolar a Freya com um fio dental (não a real é claro, falo da personagem).
Curiosidade: as passagens sobre a troca das Asas de Anjo e dos 30 Oridecons são baseadas em fatos reais. =_=
Outra coisa que queria sugerir é mudar o título da fic. E caramba, O Mundo Visto Através de Olhos Vermelhos... '-'
É tão ruim assim? emotion-77.gif 
 Na minha levemente sonolenta opinião, o título pode ficar assim que tá ótimo. Eu, particularmente, não vejo problema algum, e até relembra aqueles que não puderam ver o final da primeira vez.Quanto à passagem das Asas de Anjo e dos 30 Oridecons, só digo uma coisa:hehecq3zw8-1.gif(Sério, assim que ela confirmou que foi real, eu fiquei quase nesse estado.) 
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Nem, eu encaro minhas pendências de perto aberto e cara a cara. Eu olho nos olhos da pessoa quando vou resolver um problema, e no caso da Tenko RENARD Kitsune não será diferente.P.S.: Mas como eu não sou nenhum suicida, vou olhar ela através de uma câmera, comigo dentro de um cofre de titânio anti-terrorista, com 60cm de espessura. Não tem Rondel e EDP no mundo que arrebente esse troço!!!

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Eu não esperava que você continuasse com essa fic, Tenko. Eu não esperava mesmo. Mesmo porque você, assim como eu e muitos outros, quitou do bRO depois da chegada dos ROPs. E me pareceu que você tinha renunciado, juntamente com a sua assassina, à sua fic e a tudo que dava origem à ela. Entretanto, cá está você, postando novamente no fórum os primeiros capítulos da sua obra, que eu me lembro tão bem, onde temos a nossa futura assassina fugindo de seu castelo e de seus confortos, para vivenciar uma realidade que não poderia ser compreendida por seu pai e pelas personalidades superficiais da nobreza. Ah, como eu tive bons momentos com esses primeiros capítulos!

Essa história significa muito para mim. Mudou o modo como vejo a classe dos assassinos, e por conseguinte, sendo eu um colega de profissão, o modo como vejo à mim mesmo.

Quero deixar claro que vou continuar acompanhando a sua fic como sempre fiz, lendo, elogiando, criticando, enfim, contribuindo com minhas opiniões para o progresso da grande escritora que você já demonstrou ser.

Ocasionalmente, vou estar debochando também. De forma carinhosamente construtiva, claro =3.

Espero ansiosamente os próximos capítulos.

Khelek

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Que diabo é esse "Normal

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st1\:*{behavior:url(#ieooui) etc." que aparece antes do meu post? Acho que meu browser encrencou com o fórum. Alguém sabe como é que tira?

 

 

---------------------------------------------------------------------  CAPÍTULO 22 - O LEGADO DO DÊMONIO –

SEGUNDA PARTE - O que preferes, Tenko

Kitsune?

 

 A pergunta da monja

ressoava em sua cabeça. Era esperta, aquela monja. E a conhecia muito bem. O

modo como ela havia feito a proposta soava como um desafio. A raposa bem sabia

que Tenko Kitsune, muito orgulhosa, o aceitaria sem hesitar.

 

 - Conte-me.

 

 A monja respirou fundo

e começou a falar.

 

 - Esta história, Tenko

Kitsune, começa há muito tempo. Este templo é muito antigo, e como todo templo

dedicado À Dama, é guardado por um myobu. Ele foi fundado pela nove-caudas

Myobu Okori. Veja bem, Tenko-san, nós raposas não temos a mesma força física

dos humanos. Nossos corpos são frágeis, mas nossos espíritos são fortes.

Okori-sama, em uma de suas viagens, conheceu os monges, guerreiros que treinam

para fortalecer seu corpo e seu espírito ao mesmo tempo. Okori-sama admirou

muito as técnicas dos monges, e partiu imediatamente para Prontera, para se

tornar uma noviça, e lá aprendeu a canalizar o poder da Senhora de Dez Caudas. Treinou

arduamente e fortaleceu seu corpo o bastante para que os monges da Abadia do

Leste a aceitassem como discípula. E lá ela fortaleceu seu espírito. Depois de

se tornar monja, Okori-sama voltou a Amatsu e fundou este templo para honrar

Inari-sama e para ensinar o que havia aprendido em Rune-Midgard a outros de

nosso povo. Com o tempo, a fama de Myobu Okori se espalhou de boca a boca, e

logo jovens humanos, elfos, anões, mestiços e até mesmo membros de outros povos

que hoje não existem mais, começaram a surgir na porta do templo, procurando se

tornar discípulos da grande monja myobu. Okori-sama acolheu a todos, sem

exceção, e ensinou suas técnicas até o fim de sua existência terrena. Quando

Okori-sama partiu para a morada d’A Dama, a raposa Hikari, sua discípula mais

dedicada, se tornou a mestra do templo. E assim é desde aqueles dias.

 

 O caso que eu vou

contar se passou na época em que meu mestre era apenas um discípulo, e o mestre

dele era o mestre deste templo. Nesta época, a nogitsune que hoje está

selada neste templo estava livre. Ela era jovem na época, e menos poderosa do

que é agora, mas sua pelagem já era prateada, da cor do luar. Seus olhos eram

estrelas rubras, e ela andava tranqüila por todo o Arquipélago Oriental,

seduzindo homens e mulheres e se banqueteando com suas almas. E foi o mestre de

meu mestre que selou a nogitsune demoníaca pela primeira vez. Myobu

Inori era seu nome. Tinha nove caudas e dominava magistralmente a técnica do

Punho Supremo de Asura. Foi com ela que Inori-sama derrotou a nogitsune,

depois de uma luta terrível que o obrigou a usar a técnica muitas vezes, sem

descanso. E tantas vezes a usou que quando terminou a batalha os ossos dos

dedos de sua mão direita estavam todos quebrados, assim como seu pulso. Quando

viu o estado de seu punho, Inori-sama soube que jamais poderia usa-lo

novamente. Então ele tomou emprestada a maça-espada de um de seus discípulos e

decepou o punho destruído. Com o próprio sangue, Mestre Myobu Inori consolidou

um selo que aprisionou a nogitsune por quase quinhentos anos.

 

 - E porque ele não

matou a nogitsune? -, indagou Tenko.

 

 - Ele não teve forças

para isso. O Punho Supremo de Asura é uma técnica poderosa. Quando um monge a

utiliza, ele não usa apenas suas mãos para atingir o inimigo. As mãos são apenas

um veículo. O monge, tomado de fúria, atinge seu alvo com seu próprio espírito.

E do que vale armadura de couro ou metal contra um espírito furioso? Mas

obrigar o espírito a tanto esforço é muito exaustivo, e usar o Punho Supremo de

Asura várias vezes seguidas deixou Myobu Inori quase morto, e ele não teve

forças para exorcizar a nogitsune. Pois a única maneira de destruir uma

raposa poderosa assim é exorcizar sua essência logo depois de exaurir seu corpo

físico. Se isso não for feito, ela fugirá em busca de alimento, e logo voltará

à sua antiga forma.

 

 - Sou obrigada a

perguntar outra vez: como diabos você espera que eu mate uma criatura que nem

mesmo um mestre do Punho Supremo de Asura conseguiu destruir? -, disse a

assassina, engolindo em

seco. Sabia que devia sua vida à Raposa Branca, e estava

disposta a retribuir o favor. Mas uma missão suicida não estava em seus planos.

 

 - Essa é a parte

relevante da história, Tenko-san. Ouça com cuidado. – respondeu serenamente a

monja.

 

 - Há algum tempo,

quando eu ainda era uma noviça, o selo se rompeu. O poder do sangue de Myobu

Inori havia expirado. A nogitsune-demônio se libertou e imediatamente

fugiu em direção ao oeste. Meu mestre, Myobu Mamori, na época era mestre deste

templo, e partiu em

perseguição. Por muito tempo Mamori-sensei vagou por

Rune-Midgard, seguindo o rastro da nogitsune. Mas ela sempre o

despistava.

 

 Até que um dia, há

menos de uma década, Mamori-sensei conseguiu pegar a nogitsune

desprevenida. E eles lutaram por dez dias e dez noites, pois Myobu Mamori

dominava a técnica de projetar seu espírito para fora de seu corpo, usando-o

como um escudo protetor. Chamam a técnica de “corpo fechado”, mas na verdade a

resistência vem toda do espírito. Assim, Mamori-sensei demorou muito para se

ressentir do dano que a terrível raposa selvagem lhe causava. No final, ele

conseguiu selar a nogitsune outra vez. Mas para isso usou toda a energia

que lhe restava, e não era muita após dez dias de luta. Myobu Mamori faleceu

naquele dia, e eu, que já havia me tornado monja, passei a ser a mestra do

templo e recebi a missão de guardar o selo.

 

 Por muito tempo estive

em luto pela morte de meu mestre. E neste tempo uma dúvida surgiu em minha

mente: o que a nogitsune havia feito em Midgard, se não houve notícia de

mortes misteriosas e pessoas que subitamente enlouquecem ou adoecem, como é

comum acontecer quando um desses demônios sai para se alimentar de almas.

Resolvi viajar para Midgard e investigar. E descobri.

 

 “Pessoas que

subitamente enlouquecem ou adoecem. Mortes misteriosas”. Tenko tomou alguns

momentos para ruminar aquelas palavras. Ela havia visto com os próprios olhos

um caso assim. Uma terrível suspeita havia pousado sobre suas costas. Com o

coração batendo rápido, a assassina esperou o resto da história.

 

 - Achei que a nogitsune

havia se alimentado da essência de plantas ou animais, por isso ninguém

havia notado sua presença. Mas ouvi notícia de um misterioso caso de doença em

certo castelo nos arredores da capital de Rune-Midgard. Fui até o local, ouvi

algumas conversas, conversei com alguns servos do castelo e soube da terrível

verdade.

 

 Saiba, Tenko-san, que

essa nogitsune odeia a raça humana com todas as suas forças. E saiba

também que além de ódio, ela tem inveja. Pois a raposa vive mil anos e é

poderosa, mas o humano de vida curta tem características que a raposa deseja

para si. O humano é a única criatura capaz de saber que algo é impossível e

ainda assim tentar fazê-lo. E é por causa dessa perseverança, ou talvez

teimosia, que esta raça prosperou. E é justamente por causa desta

característica que a nogitsune os odeia, pois o humano mais cedo ou mais

tarde acaba vencendo qualquer desafio.

 

 Agora, não sei se

sabes, Tenko Kitsune, mas uma raposa e um humano podem gerar um filho. A prole

da raposa e do humano é uma criança humana, com a perseverança cega e

intrínseca da raça. Mas esta criança mestiça sempre herda alguma característica

da raposa. Na maioria dos casos, a ligação com as essências do mundo. Filhos de

humano e raposa normalmente se tornam grandes bruxos. Mas a criança também pode

herdar outras características da raposa, como os sentidos apurados, a

agilidade, o modo furtivo de andar...

 

 - Ou um par de olhos

vermelhos, certo? -, rosnou a assassina. Suas suspeitas haviam se confirmado.

Um nó havia se desfeito, e uma boa quantidade de dúvidas que a haviam instigado

por toda sua vida haviam encontrado suas respostas. A doença no castelo dos

Renard, o desaparecimento misterioso de Irina, a caçada à “mestiça” de Reiko,

além de seus próprios atributos físicos peculiares. Tenko sempre havia se

sentido diferente, e agora entendia por que. Mesmo assim, sua natureza

desconfiada não lhe permitia acreditar imediatamente nas palavras da monja.

 

 - Como posso saber se

isso é verdade?

 

 - Tenko-san... você

sabe como se diz “raposa” na língua de Amatsu?

 

 - Não. Claro que não.

Não falo essa língua -, respondeu Tenko, franzindo a testa diante da pergunta

aparentemente absurda.

 

 - Para os nativos de

Amatsu, somos “kitsune”.

 

 - Mas o que importa

isso? -, grunhiu a assassina. – Recebi esse nome nas ruas de Morroc, quando

ainda era uma gatuna! Foram os ladinos da cidade que me chamaram de

Kitsune pela primeira vez!

 

 - Fui eu que a

chamei de Kitsune pela primeira vez. Estive te observando, Tenko-san, desde que

o rastro de Irina Renard me levou ao castelo de seu pai. Os ladinos de

Morroc apenas repetiram minhas palavras, pois sua astúcia e agilidade remetiam

às da raposa. E também seu primeiro nome, “Tenko”, não é por acaso. Nunca lhe

ocorreu perguntar o que ele significa?

 

 - Não...

 

 - Na língua de Amatsu,

“Tenko” significa literalmente “criança do paraíso”, ou “filho do paraíso”. Mas

entre nós, kitsune, Tenko é o termo que usamos para designar uma raposa de

muita idade, que se torna extremamente poderosa. Uma raposa como sua mãe é um

bom exemplo do que chamamos de Tenko. Sua mãe lhe deu o nome dela.

 

 - Senhorita Myobu, com

todo o respeito, sua história não faz o menor sentido -, disse a assassina, com

os lábios torcidos em um meio-sorriso levemente hostil. – Se a sua nogitsune

odeia os humanos, como ela poderia ser minha mãe, que se casou com um

cavaleiro humano e, até onde eu sei, o amava?

 

 A monja baixou os olhos

por um momento, pensativa.

 

 - Tenko Kitsune, eu

tenho certeza do que falo. Os rastros da nogitsune me levaram

diretamente ao castelo dos Renard. E neste castelo ela deixou as marcas de seu

banquete. É difícil a tarefa de entender a mente da nogitsune. É difícil

prever os atos de uma criatura tão ressentida, movida apenas por seu ódio.

Passei muito tempo tentando compreender o porquê da nogitsune ter se

casado com um humano e com ele gerado uma prole, apesar de seu desprezo pela

raça humana. E isto permaneceu um enigma para mim, até que o momento em que te

encontrei.

 

 Tenko franziu levemente

as sobrancelhas, como se fizesse esforço para compreender a história.

 

 - Fiquei impressionada

quando a vi pela primeira vez, jovem Renard-san. Soube imediatamente que você

era a filha da nogitsune. Esguia, ágil, orgulhosa. Mas ao mesmo tempo,

irredutível como uma humana. Você tem o melhor das duas raças. Tenko Kitsune, e

isso pode ser visto em seus olhos, tão determinados e tão ferozes. E então

compreendi o plano da nogitsune. Nossa raça está quase extinta. Nossas

florestas deram lugar às cidades humanas, e nossos prados às suas plantações.

Creio que a nogitsune pretendesse salvar nossa espécie pela mestiçagem.

 

 - Você não tinha dito

que filhos de raposas e humanos já existiam há tempos? -, grunhiu a assassina –

Essa história faz cada vez menos sentido!

 

 - Talvez você não

perceba o sentido dela, Tenko-san. Você ainda é muito jovem.

 

 - Não sou nenhuma

criança! -, urrou a mestiça, erguendo-se subitamente.

 

 - Ao contrário dos

humanos, - continuou Myobu, ignorando o rompante da assassina – os kitsune não

tem o costume de se unir por interesse ou conveniência. Nos unimos por amor, ou

preferimos ficar sozinhos. Sua mãe quebrou esse costume. Ela escolheu seu pai,

membro de uma família influente. Desse modo, sua linhagem poderia prosperar.

Ela poderia incitar guerras e arranjar casamentos, e assim seu sangue se

espalharia. E além disso, seu pai era um guerreiro forte e habilidoso, tinha

boas características para passar para seus filhos.

 

 - Essa é sua teoria? –

sibilou Tenko, de dentes cerrados. Seus olhos faiscavam, ameaçadores. – Então

eu não passo de uma arma? Um objeto sem vontade própria? Acho que não...

 

 Agarrou o rosto da

monja e o ergueu, obrigando-a a olhar diretamente para seus olhos. Aproximou-se

de Myobu até seus narizes se roçarem, e então sussurrou:

 

 - E você, raposa? O que

eu sou pra você? Uma arma também? Não vou ser seu brinquedinho! Se virem para

exorcizar seus demônios, que eu não tenho nada a ver com isso!

 

 Soltou a monja

bruscamente, deixando marcas de unha em seu rosto, e então se dirigiu à pedra

que bloqueava a saída. Tentou empurrá-la, mas o esforço foi inútil. Myobu então

estendeu sua mão e calmamente pronunciou algumas palavras que fizeram a pedra

se deslocar suavemente, abrindo a passagem. Tenko voltou-se para a raposa com

uma expressão furiosa no rosto. Bufou como uma fera enraivecida e desapareceu

pela fenda. Myobu não fechou a passagem. Tranqüilamente, encheu outra vez seu

copo de chá.

 

 Tenko atravessou o

templo em um passo orgulhoso, obrigando os noviços a se desviarem de seu

caminho, até chegar na entrada principal. Abriu violentamente o portão simples

de madeira, como se quisesse descontar a raiva por não ter conseguido arrastar

a pedra dos aposentos de Myobu Akari, e então o atravessou, apenas para

descobrir que o humilde Templo de Inari se localizava em um planalto de pedra,

muito perto do topo de uma das montanhas mais altas da ilha de Amatsu.

 

 Caminhou até a borda do

planalto e olhou ao seu redor. Podia ver a ilha inteira dali de cima, e também

as ilhas vizinhas de Louyang, Kunlun e Ayothaya. Caso se esforçasse, poderia

até enxergar o porto de Alberta e a Ilha das Tartarugas. Daquela altura, tudo

parecia minúsculo e distante. E Tenko percebeu que não seria capaz de deixar

aquele lugar sem pedir ajuda à Mestra do Templo, coisa que seu orgulho não lhe

permitia naquele momento. Sentou-se na borda do planalto, sentindo-se impotente

e desolada.

 

 Sem a proteção das

paredes grossas do templo, o traje típico de Amatsu era pouco para o vento

gelado da montanha. Abraçou os joelhos, puxando-os para junto de si. Mergulhou

uma das mãos na gola do traje negro e puxou o pequeno pingente que trazia junto

ao peito. O Colar do Oblívio. Pontos negros de oxidação já começavam a recobrir

a prata brilhante. Quanto tempo havia se passado desde que ela havia recebido

aquele pingente das mãos do líder da Guilda dos Assassinos do Deserto de

Sograt? Naquele momento, Tenko Kitsune pensava ter encontrado a si mesma.

Trilhando o caminho do Assassino ela tinha certeza absoluta de quem era. E

agora, tanto tempo depois, aquela monja de sorriso tranqüilo e olhos de

ametista havia negado todas as suas certezas. Ela a havia destruído de dentro

para fora, mudado sua história e arrebentado suas convicções.

 

 “Mas eu fui avisada”,

lembrou-se a assassina. “Eu que quis ouvir o que ela tinha para contar. Não

chore, sua fraca!”, ralhou consigo mesma, contendo as lágrimas. Revia seus atos

dos últimos minutos, o modo infantil e grosseiro com que havia tratado Myobu, e

se envergonhava. E para uma assassina, do mesmo modo que o toque de uma lâmina

deixa sua marca na pele, um ato vergonhoso deixa uma cicatriz na alma. Tenko

sabia que a atitude correta seria voltar para o templo e pedir perdão à monja.

Mas seu orgulho não lhe permitia. Não o orgulho do Assassino, mas o orgulho

próprio irracional, típico da raça dos kitsune e de boa parte dos

humanos também. Sentia que, naquele momento, uma justa reprimenda vinda de

Myobu Akari seria o golpe final em seu orgulho estilhaçado, e não queria

começar a chorar na frente da raposa e parecer ainda mais idiota. Queria ter

alguém em quem pudesse confiar, alguém em cujos braços pudesse se jogar, fechar

os olhos e confessar todos os seus medos e seus pecados, e ter certeza que essa

pessoa não a machucaria. Alguém para quem não precisasse ser Tenko Kitsune, a

irredutível assassina, mas simplesmente uma jovem confusa e amedrontada.

 

 - Nhyx...

 

 ----------------------------------------------------------------

 

 Kuroi

Yuri abriu os olhos e procurou qualquer sinal de movimento no quarto escuro. O

nevoeiro cinzento bloqueava a luz da Lua. “Ainda bem”, pensou a ferreira.

Cuidadosamente, Kuroi se libertou das cobertas e saiu da cama. Aproximou-se do

cuidado da cama de Nhyx e se certificou de que a ladina estivesse

dormindo. Estava. Se dirigiu à cama de Sethit e fez o mesmo, tomando cuidado

para não produzir nenhum som ou movimento que despertasse o falcão Horus de seu

sono leve. Lentamente e sem fazer barulho, Kuroi se vestiu. Saiu do quarto

pisando o mais leve que podia, levando as botas nas mãos. Fechou a porta e saiu

da pequena estalagem em Juno onde estava hospedada. Assim que passou a entrada,

calçou as botas rapidamente e disparou em direção à rua, entrando por vielas

estreitas até chegar em um beco escuro e vazio. Olhou ao redor, procurando

qualquer sinal de movimento.

 

 Não

demorou muito, a ferreira sentiu um toque suave em seu ombro. Virou-se para

olhar quem a tocava, e seu olhos encontraram os do jovem pálido, escondido nas

sombras e coberto por um manto. Kuroi sorriu e deu-lhe um beijo rápido nos

lábios. Em seguia o abraçou.

 

 -

Senti sua falta.

 

 -

Eu também. -, respondeu o jovem em um sussurro. – Vamos sair daqui antes que

alguém nos encontre. Ainda estamos perto demais da estalagem.

 

 Kuroi assentiu com a

cabeça. O jovem a cobriu com seu manto, e os dois rapidamente desapareceram na

cidade escura, olhando por cima dos ombros como se o próprio nevoeiro os

perseguisse.

 

 ----------------------------------------------------------------

 

 -

Você está bem, Kuroi? Está tão quieta...

 

 Kuroi

estava deitada de lado, fitando a parede do quarto. O rapaz a acariciava

delicadamente deslizando os dedos pelas pétalas negras do lírio tatuado em suas

costas.

 

 -

Estou bem sim, meu amor -, respondeu a ferreira, virando o corpo e abraçando

sua cintura. – Só estou um pouco cansada.

 

 -

Durma. Mais tarde eu te levo de volta para a estalagem -, ele respondeu,

envolvendo a garota em seus braços. Kuroi fechou os olhos e suspirou.

 

 Ainda

não havia assimilado totalmente aquele romance inesperado. Havia simplesmente

acontecido, na época em que ela ainda estava hospedada na casa dos Aintaurë.

Estava atravessando a floresta de Payon em direção à cidade, onde ela iria

montar sua loja, quando ouviu o que parecia ser um gemido de dor vindo do fundo

da floresta. Resolveu verificar e encontrou aquele rapaz. Incauto e pouco

acostumado a andar na floresta, ele havia pisado em uma armadilha lá esquecida

por algum caçador negligente, e parecia estar tendo dificuldades para se

soltar. Kuroi foi em seu socorro, pois havia aprendido a desativar armadilhas

observando Sethit. Abriu as mandíbulas de ferro da armadilha e ajudou o rapaz a

tratar o profundo ferimento em sua perna, e então seguiu seu caminho como fazia

todos os dias.

 

 No

dia seguinte fez o mesmo trajeto, carregando uma boa quantidade de armas

recém-forjadas. E no meio da estrada encontrou novamente o rapaz. Ele se

ofereceu para ajudá-la a carregar suas mercadorias. Kuroi disse que não seria

necessário, mas ele insistiu em demonstrar sua gratidão. E nas semanas

seguintes ela encontrou os todos os dias, no mesmo ponto da estrada, e ele a

ajudava a carregar suas mercadorias. A ferreira reparou na dificuldade que ele

tinha para isso. Era um rapaz delicado, até mesmo um pouco franzino. O peso das

longas claymores de aço era demais para seus braços finos, mas ele nunca

reclamava. E todo dia estava lá. Primeiro por gratidão, depois por amizade, pois

os dois começaram a conversar durante o trajeto. Até que, durante uma das

jornadas diárias, ele subitamente se declarou. Kuroi, que há tempos já se

sentia atraída por aquele misterioso jovem, não resistiu.

 

 Mas

era um amor proibido. Tenko jamais poderia saber. Ela não aceitaria. Nem mesmo

para Sethit ela poderia contar. E Nhyx provavelmente tentaria matá-la caso

soubesse. Não, esse segredo ela teria que guardar somente para si mesma. Havia

sido cuidadosa desde então, mas mesmo assim Sethit já começava a desconfiar.

Sabia que estava se arriscando, saindo à noite daquele jeito. Mais que isso, as

freqüentes mentiras e a própria natureza daquela paixão a fazia sentir como se

estivesse traindo suas companheiras. Mesmo assim não tinha a intenção de

terminar aquele romance.

 

 Acariciou

os cabelos macios do rapaz. Ele sorriu e a beijou. Observou o corpo nu de seu

amante. Ele era delicado e pequeno, de rosto imberbe e mãos macias de dedos

frágeis. Estranho para Kuroi, que sempre havia imaginado encontrar o amor em um

cavaleiro de músculos poderosos. No entanto, ela sabia que ele possuía forças

acima de sua compreensão. E acreditava que ele lutaria por Kuroi Yuri.

 

 Fechou

os olhos e resolveu dormir. Esquecer suas dúvidas e se deixar levar pelos

sonhos nos braços de seu amado. Pelo menos por aquela noite.

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ups, desculpa o double, cliquei o botão errado... *abaixa a cabeça e pede pra não ser eskatarseado*

quanto ao Siegrified ser um peco... deve ser um de primeira linha, como foi seu cavalo Greyfeel, filho direto do cavalo negro de oito patas  de Odim, sleipnir, talvez seja quase filho do maior peco de todos os tempos![/heh]  * bruno "super gogeta": sua fonte mais confiável de cultura inútil! **onde já ouvi isso antes?*** a, e se for uma valquíria que o monta... desculpe mas o nome não era brunhilde?? que eu saiba não existe valquíria com o nome de brynhiildir(é assim?)...

e ok, mais uma vez desculpe pelo double, acho que estou meio afobado            

flow!                   

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spoiler] De onde eu venho, o clima é tão frio que até o café congela e trinca!

 

 

omg, pq spoiler? e se for do jeito que vc disse, vc é de lutie ou moscovia( futura expansão do bro, imita moscou, na russia) se bem que eu acho que é moscovia mesmo... mas então, voltemos ao tópico, se não isso vira sal de bate-papo

ok,flow!

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